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Investigação sobre Cunha não terá desfecho rápido, diz analista político

Carolina Gonçalves

Da Agência Brasil

22/08/2015 13h00

No Congresso ou no STF (Supremo Tribunal Federal), o desfecho de uma possível investigação sobre o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), não deve ser rápido. Diante da denúncia apresentada pelo procurador-geral da República, Rodrigo Janot, que acusa o parlamentar de lavagem de dinheiro e corrupção ativa, com base nas investigações da Operação Lava Jato, os dois órgãos precisam seguir um passo a passo previsto em ritos específicos que podem arrastar o processo por anos.

Analista político, Antônio Augusto de Queiroz, diretor de Diap (Documentação do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar), duvida que o processo seja concluído antes do fim do mandato de Cunha na presidência – de dois anos, segundo o Regimento Interno."

Segundo Queiroz, um eventual pedido de afastamento por decisão do STF ou do Conselho de Ética da Câmara teria de passar pelo plenário da Casa. “A Constituição não autoriza destituir certo poder sem autorização da casa que ele preside”, disse o analista.

Para Queiroz, o caminho mais curto seria a renúncia de Cunha. Queiroz disse acreditar que o parlamentar “não vai aguentar a pressão”. Reconhecido como um dos pesquisadores com maior quantidade de dados sobre opiniões de parlamentares brasileiros, o analista político afirma que, dos 513 deputados, um terço defende a permanência de Cunha, um terço quer sua saída e o outro terço não manifesta posição.

Eduardo Cunha segue irredutível sobre a eventual renúncia. Desde que a denúncia foi oficializada, ele tem declarado ser inocente e estar sereno diante das acusações. Na sexta-feira (21), o deputado deixou claro: “não há a menor possibilidade de não continuar à frente da Câmara até o fim do mandato para o qual fui eleito”. Cunha garantiu que ninguém vai “constrangê-lo” e desafiou qualquer advogado a encontrar provas na denúncia de Janot. “Não há uma única prova contra mim em todas as páginas”, afirmou.

Partidos divididos

Antônio Queiroz lembra que “o simples fato de ter dado entrada na denúncia já é elemento suficiente para que algum partido adote ações políticas ou correcionais no âmbito da Casa”. Isso significa que os partidos podem pedir abertura de um processo de cassação no Conselho de Ética, mesmo antes de uma decisão do Supremo. Deputados do PSOL, PSB, PT, PPS, PDT, PMDB, PR, PSC, Pros e PTB já pediram o afastamento de Cunha, classificando sua situação como “insustentável”.

Se houver apresentação de um pedido de cassação, o Conselho de Ética define um relator, cujo parecer vai influir na aceitação ou não do pedido. O acusado tem dez dias para encaminhar seus argumentos de defesa. Se o processo for iniciado, o colegiado tem 40 dias úteis para diligências, nos casos de perda de mandato, ou 30 dias se o pedido for para suspensão de mandato.

A partir daí, os integrantes do Conselho têm mais dez dias para decidir se há procedência no pedido e se ela é parcial ou total. Caso haja sinalização para perda ou suspensão do mandato, o acusado tem mais cinco dias para recorrer à CCJ (Comissão de Constituição e Justiça), que tem mais cinco dias para se manifestar.

Se a CCJ não acatar o recurso, o parecer do Conselho de Ética é lido no plenário da Câmara e fica pronto para ser votado. A Mesa da Casa tem prazo de 90 dias para incluir o pedido de cassação na ordem do dia do plenário. A partir do momento em que entra em pauta, tranca-se a votação de qualquer outra proposição. Qualquer cidadão também pode entrar com representação contra Cunha e o processo passará pelo mesmo rito do Conselho de Ética, mas, antes, terá de ser analisado pela Corregedoria da Câmara.

Supremo

A denúncia apresentada por Janot apenas oficializa a acusação contra Eduardo Cunha. A investigação sobre a participação do deputado em crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro envolvendo irregularidades na Petrobras ainda precisa cumprir uma série de exigências.

O relator dos processos da Operação Lava Jato no STF, ministro Teori Zavascki, terá de notificar a defesa de Cunha e esperar a resposta, que pode ser enviada em 15 dias.

Depois disso, o MPF (Ministério Público Federal) ainda pode rebater a defesa. Apenas a partir daí, o plenário do STF se reúne para decidir se aceita ou não a denúncia. Caso aceite, o parlamentar vira réu e é aberta a ação penal em que começam a ser tomados depoimentos, apresentadas provas e contestadas as informações. Somente após esse trâmite, ocorre o julgamento final.

Na hipótese de o STF condenar Eduardo Cunha, a Câmara terá de avaliar a cassação do parlamentar. De acordo com a Secretaria-Geral da Mesa da Casa, a decisão da Corte precisa passar pela sindicância da Corregedoria, que tem 30 dias para análise, prorrogáveis por mais 30. Depois disso, o Conselho de Ética ainda terá de se manifestar antes de o processo chegar finalmente ao plenário, onde a votação é aberta.

Presidentes acusados

Na história da Câmara, Cunha é o terceiro deputado a enfrentar uma situação de denúncia como presidente da Casa. O atual deputado estadual Ibsen Pinheiro (PMDB-RS), que ocupou a mesma cadeira entre 1991 e 1993, acabou sendo cassado em maio de 1994, acusado de envolvimento em esquema de emendas parlamentares. Ele foi investigado pela CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) dos Anões do Orçamento.

A acusação que associou seu nome ao escândalo, baseada em suposta movimentação de US$ 1 milhão, acabou sendo desmentida. O desmentido ocorreu mais de dez anos depois e Ibsen acabou inelegível por oito anos, como determina a Lei da Ficha Limpa. O peemedebista gaúcho comandou a Câmara durante o processo de impeachment do então presidente Fernando Collor, hoje senador e também incluído na lista de Janot.

Em setembro de 2005, o então deputado Severino Cavalcanti (PP-PE) renunciou à presidência da Câmara, após 218 dias no cargo. Cavalcanti foi acusado de cobrar propinas mensais de R$ 10 mil do dono de um restaurante que funcionava na Casa. A propina garantia a renovação do contrato de concessão do serviço, acertada durante o período em que ele ocupou a Primeira-Secretaria, entre 2001 e 2002.

No comando da Câmara, o ex-parlamentar também foi alvo de procuradores da República do Distrito Federal, que pediram abertura de investigação contra ele ao TCU (Tribunal de Contas da União) por prática de nepotismo.