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Fundadora do PSOL, Heloísa Helena entra na Rede e já encara divergências

Em 2013, Heloísa Helena estava ao lado de Marina Silva no evento de lançamento do partido Rede - Roberto Jayme/UOL
Em 2013, Heloísa Helena estava ao lado de Marina Silva no evento de lançamento do partido Rede Imagem: Roberto Jayme/UOL

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, de Maceió

30/09/2015 06h00

Segunda filiada ao Rede Sustentabilidade --assinou a ficha logo após a ex-senadora Marina Silva--, a vereadora de Maceió Heloísa Helena deve ser uma das lideranças da nova sigla. Ela afirma que estava afastada havia seis anos do PSOL –partido que foi uma das fundadoras e primeira presidente-- por causa de divergências programáticas. A questão principal: a defesa institucional do aborto decidida em 2009. “Entendi que tinha havido rompimento do pacto fundacional”, disse.

Apesar de apostar na entrada na Rede para ter novos ares políticos, ela sabe que vai encarar divergências no novo partido, a começar pela doação privada às campanhas (que ela é contra) e as ideias de política econômica. “Mas todos nós nos reivindicamos humanistas”, declarou.

Reeleita em Maceió como vereadora em 2012, Heloísa Helena antecipa que não será candidata em 2016, mas deixa a porta aberta para 2018 –muitos já a cogitam como possível vice em uma chapa encabeçada por Marina Silva. “Acho quase que repugnante trabalhar a militância sempre em torno do calendário eleitoral”, alfineta, bem ao seu estilo.

Sobre a atuação conjuntura política nacional, a vereadora ataca aqueles que classificam como "golpistas" os que defendem o impeachment. “Eu nunca fui golpista quando defendi abertura de processo e palavras de ordem da saída do Collor, do Sarney e do Fernando Henrique. Nunca fiz isso pelo oportunismo vulgar”, disparou.

Confira os principais trechos da entrevista:

Filiação à Rede

Eu estava havia seis anos afastada de todas as instâncias do PSOL --com todo respeito, carinho e profundo amor a muitos dos militantes. Não me arrependo dos passos que dei para construção do PSOL. Há seis anos, um problema em que entendi que tinha havido rompimento do pacto fundacional, onde questões de consciência, como era o aborto, não seriam motivo de aprovação de resolução ou de imposição, e que as pessoas pudessem ter opiniões públicas. Em função disso, foi criado um grande problema. Mesmo discordando, porque entendi que rompia o pacto fundacional, sabia que a maioria do PSOL não era de fundadores. Como tinha questões de consciência, e nem pendurada num pau de arara cederia, resolvi me afastar das instâncias do PSOL. E depois veio o imbróglio da primeira candidatura de Marina [Heloísa defendeu a coligação com o PV à época]. Mas isso é passado.

Divergências

Não é a primeira nem a última vez que um partido se predispõe a trabalhar uma maneira nova de perspectiva social nesse mundo tão complexo, de tantas pessoas com coração de pedra e insaciáveis do banditismo politico. Então a gente não tem nenhuma concepção mística sobre a Rede, mas é um espaço plural e necessário programaticamente para a vida nacional, sem nenhum personalismo. Mas [ele surgiu] também porque Marina merece muito ter a oportunidade de ser candidata [à Presidência]. Ela não gosta muito que diga, mas ela tem direito de representar esse projeto nacional, fazer parte dessa experiência de construção de uma frente que acolhe concepções aparentemente tão distintas. Do mesmo jeito que tem concepções mais vinculadas ao campo progressista, ecológico, tem pessoas que não abrem mão das convicções de esquerda, como eu e muitos outros; mas todos nós nos reivindicamos humanistas e queremos um espaço para todas as posições, mesmo que profundamente divergentes do ponto de vista econômico --que temos grandes divergências-- a concepções da inserção brasileira na globalização capitalista.

Doações de empresas

No PSOL também tinha gente que aceitava doações de grandes corporações e de indústrias, eu que nunca aceitei. Toda generalização é perversa e desonesta intelectualmente. Independente de qualquer financiamento, jamais me comprariam. Então, não que a [consciência] do PSOL e da Rede vão ser compradas, mas nunca achei [a doação empresarial] educativa. Acho que todos os setores que têm um relação direta com o aparelho do Estado não poderiam financiar campanha. Em função disso prefiro não ter de ninguém. Na Rede já defendi essa posição, e a posição que foi aprovada é a que estabelece o limite de financiamento. Eu não aceitarei, mas entendo. Na Rede você não poderá ter um financiamento de mais de R$ 150 mil. Pode ser a maior empresa amiga, ela não pode fazer. Eu respeito as inovações positivas que Rede estabeleceu. Apesar de que esse problema foi aparentemente superado com a decisão do Supremo Tribunal Federal

Sem reeleição

Já não ia ser candidata [em 2016], essa decisão já estava tomada. A minha militância não orbita em torno do calendário eleitoral, não é apenas pela participação no processo eleitoral que se analisa os lutadores do povo, pessoas que fazem as pequenas revoluções cotidianas. De 2018 ainda não disse que não seria. Não sei nem se estou viva amanhã! Acho quase que repugnante trabalhar a militância sempre em torno do calendário eleitoral. A minha militância e todas as pequenas revoluções construindo rupturas e alternativas maiores e pagando um preço caríssimo como pago --especialmente em Alagoas-- é uma outra coisa. Não estou muito preocupada com isso. Não vou dizer que não vou participar de 2018 para que a canalhada política alagoana não comemore tão cedo.

Impeachment de Dilma

Para mim, crimes contra a administração pública --portanto tráfico de influência, intermediação de interesse privado, exploração de prestígio, corrupção ativa e passiva, tudo o que no popular é conhecido como banditismo político-- legalmente deveriam ser abertos crime de responsabilidade, com todo o direito a defesa, que poderia significar permanência no cargo ou afastamento. Nunca me considerei uma golpista porque, do ponto de vista da legislação vigente, defendia o “Fora, Collor”, “Xô, Sarney”, o “Fora, FHC”, ou qualquer outro. Não fazia o discurso da conveniência política de atacar o outro ou desvendar os mistério do outro por substituição de poder. Então a concepção defendida por Hélio Bicudo, que não é um politiqueiro vulgar, para mim é uma questão de análise jurídica. Você pode até classificar como oportunismo vulgar defender a Dilma ou querer o impeachment por conveniência política, mas há argumentos legais apresentados por vários juristas, em especial Hélio Bicudo. Golpismo pode ser defender o mandato sabendo a podridão dele, ou pedir o lugar dela para roubar também.

Congresso e a sociedade

O Congresso Nacional e as instâncias de decisão política no Brasil, seja nos Executivos, seja nos Legislativos, refletem a maioria do povo brasileiro. Nem sempre por ignorância, mas por ir por um caminho de omissão ou cumplicidade. Têm personalidades políticas que são objetivamente insaciáveis. Quando a gente imagina que já roubaram tanto, que não teriam outras formas e modos de conjugar o verbo roubar, de repente estão lá novamente, envolvidas em todos os crimes contra a administração pública. Tem eleitor que deve se envergonhar disso, tem outros que não, que preferem usufruir do banquete farto que ele possibilita.