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Por que a Anistia Internacional acha que o Brasil vai mal?

Do UOL, no Rio

23/02/2016 21h01

A Anistia Internacional divulgou na noite desta terça-feira (23) o relatório anual “O Estado dos Direitos Humanos no Mundo”, que compila um panorama da situação dos direitos humanos em 160 países, incluindo o Brasil. O relatório cita “graves violações direitos humanos” no país e demonstra preocupação com a série de emendas constitucionais que estão em curso no legislativo, como a lei que propõe a revogação do estatuto do desarmamento, descrita como um retrocesso.

O texto, que será entregue a presidente Dilma Rousseff, também condena a grave crise na segurança pública no país, em especial o alto número de homicídios e a violência policial, e os conflitos por terras e recursos, que provocaram a morte de dezenas de pessoas no último ano, entre outros temas.

A assessora de direitos humanos da entidade, Renata Neder, lembra que boa parte dos aspectos denunciados pelo relatório já foram listados em anos anteriores e que houve pouco ou nenhum avanço em resolver questões como o grande número de homicídios no país, considerado o maior do mundo, e a violência policial. “O foco da política de segurança pública deveria ser a preservação da vida, especialmente em um país com o mais alto número de homicídios do mundo. O combate ao crime organizado não é incompatível com a preservação da vida e a polícia tem que agir dentro da lei e ser pautada pela preservação da vida de todos”, afirma.

Confira abaixo quatro pontos em que o país vai mal e um em que pode comemorar, segundo a Anistia:

Retrocessos no Legislativo

Redução da maioridade  - Thinkstock - Thinkstock
Imagem: Thinkstock
Casos como a emeda constitucional que propõe a redução da maioridade penal de 18 para 16 anos e as restrições aos direitos sexuais e reprodutivos das mulheres que tramitam no Congresso, o Estatuto do Nascituro, que propõe criminalizar o aborto em todas as circunstâncias, e a PEC 215, que pretende rever a forma como são demarcadas as terras indígenas no país, são vistos pela Anistia como riscos a conquistas já realizadas em termos de direitos humanos no país. “O que vimos no Congresso Nacional esse ano foi o avanço de várias emendas constitucionais em diversas áreas que se forem aprovados significarão um grande retrocesso na área de direitos humanos”, afirma Renata.

Segurança pública

violência policial - Fernando Quevedo / Agência O Globo - Fernando Quevedo / Agência O Globo
Imagem: Fernando Quevedo / Agência O Globo
O Brasil é o país com o maior número de homicídios no mundo. Em 2014, segundo o Fórum Brasileiro de Segurança Pública, foram 58.000. Destes, 3.000 foram cometidos pela polícia. A Anistia cita, como exemplo, o caso dos cinco jovens mortos a tiros pela polícia em Costa Barros, na zona norte do Rio de Janeiro, em novembro, e do menino Eduardo de Jesus Ferreira, 10, morto em frente à sua casa durante uma operação policial no Complexo do Alemão, em abril. “Há uma seletividade dessa violência letal que atinge em especial os jovens negros do sexo masculino. Ao longo de 2015 o governo federal disse que ia anunciar um pacto nacional de redução de homicídios, mas não isso não foi feito”, diz Renata.

Condições das prisões

Penitenciária de Pedrinhas - Beto Macário/UOL - Beto Macário/UOL
Imagem: Beto Macário/UOL
A Anistia Internacional cita “superlotação extrema, condições degradantes, tortura e violência” como “problemas endêmicos das prisões brasileiras”. Segundo a entidade, nenhuma medida foi tomada pelas autoridades para resolver o problema da Penitenciária de Pedrinhas, no Maranhão. Em outubro, foi revelado que um detento foi morto e parcialmente canibalizado por outros presos no local. A organização também lembra as rebeliões no Paraná em presídios em Minas Gerais, em que ao menos cinco detentos foram mortos.

Repressão a manifestações

manifestante ensanguentado  - Ale Vianna/Eleven/Estadão Conteúdo - Ale Vianna/Eleven/Estadão Conteúdo
Imagem: Ale Vianna/Eleven/Estadão Conteúdo
A violenta repressão a manifestações no país é outro ponto apontado pela Anistia, que lembra o “uso desnecessário e excessivo da força pela Polícia Militar” contra uma manifestação de professores no Paraná, em abril. À época, mais de 200 pessoas ficaram feridas e o Ministério Público entrou com uma ação contra o governo do Estado. A instituição também vê com reservas o projeto de lei aprovado pelo Senado em outubro que tipifica o terrorismo como crime específico no Código Penal.

Mobilização da sociedade civil

mulheres protesto - Fábio Motta/Estadão Conteúdo - Fábio Motta/Estadão Conteúdo
Imagem: Fábio Motta/Estadão Conteúdo
Da mesma forma que há um movimento conservador em curso no Congresso, a resposta da sociedade civil a essas medidas, em especial das mulheres e dos estudantes, que saíram às ruas em prol de seus direitos, é vista pela Anistia como um ponto a comemorar. “A mobilização que veio da sociedade diante desses retrocessos foi um aspecto muito positivo em 2015, embora as manifestações não tenham tido a escala que em 2013, foram fundamentais para impedir os retrocessos legislativos nesse ano”, afirma Renata.