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Análise: argumentos do MP para prisão de Lula são "frágeis" e "genéricos"

Os promotores Fernando Henrique Araújo, Cassio Conserino e José Carlos Blat pediram a prisão preventiva do ex-presidente Lula - Marcelo D. Sants/Framephoto
Os promotores Fernando Henrique Araújo, Cassio Conserino e José Carlos Blat pediram a prisão preventiva do ex-presidente Lula Imagem: Marcelo D. Sants/Framephoto

Bernardo Barbosa, Flávio Costa, Felipe Amorim e Gustavo Maia

Do UOL, em São Paulo, Brasília e Rio

10/03/2016 22h07

São "frágeis", "genéricos" e "sem fundamentos e fatos concretos" os argumentos utilizados pelos promotores para pedir à Justiça a prisão preventiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, de acordo com a avaliação de juristas ouvidos pelo UOL

Entre outros argumentos, os promotores Cassio Conserino, José Carlos Blat e Fernando Henrique Araújo afirmam que o ex-presidente "se vale de sua força político partidária para movimentar grupos de pessoas que promovem tumultos e confusões generalizadas, com agressões a outras pessoas, com evidente cunho de tentar blindá-lo do alvo de investigações e de eventuais processos criminais, trazendo verdadeiro caos para o tão sofrido povo brasileiro."

O advogado e ex-ministro do STJ (Superior Tribunal de Justiça) Gilson Dipp afirma que somente a capacidade de mobilização política do ex-presidente Lula não é um argumento que, isoladamente, possa justificar um pedido de prisão preventiva. Segundo Dipp, é preciso que sejam apresentadas provas de que o ex-presidente tenha de fato tentado interferir no processo. “Tem que haver no pedido de prisão preventiva elementos concretos que digam que houve ameaça de testemunhas, que se está destruindo provas”, diz o ex-ministro.

O caso, que se refere a um apartamento tríplex no Guarujá que seria do ex-presidente, será analisado pela juíza Maria Priscilla Ernandes Veiga Oliveira, da 4ª Vara Criminal de São Paulo, que não tem prazo para tomar a decisão. 

Gilson Dipp - Alan Marques/Folhapress - Alan Marques/Folhapress
Gilson Dipp afirma estar preocupado com a banalização da prisão preventiva
Imagem: Alan Marques/Folhapress

Davi Tangerino, professor da FGV-SP e pós-doutor em Direito Penal, concorda que "não tem nenhum fundamento concreto para o pedido de prisão". E acrescenta: "dizer que ele está usando fazendo um discurso político é uma trivialidade, já que ele é político. Essa não é uma hipótese legal. O MP não narra a tentativa de ninguém de ilicitamente obstar a investigação."

O MP-SP requisitou que a juíza determine que o ex-presidente entregue o passaporte à Justiça, o que inviabilizaria uma eventual tentativa de fuga para o exterior. "Por definição, ele é um sujeito que não conseguiria fugir ou se esconder em lugar nenhum, já que ele é conhecido no Brasil e no mundo inteiro, além de ter endereço fixo", diz Tangerino.

Genérico

O jurista paulista Luiz Flávio Gomes acompanha a opinião dos colegas. Para ele, o pedido do Ministério Público é "genérico". "Não há um fato que demonstre cabalmente que o ex-presidente está obstruindo a Justiça, ou destruiu provas", afirma Gomes.

Em outro trecho, o trio de promotores afirma que a prisão preventiva do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva é "imprescindível", pois concluem que ele movimentará "toda a sua rede violenta de apoio para evitar que o processo crime que se inicia com a presente denúncia não tenha seu curso natural, com probabilidade evidente de ameaças a vítimas e testemunhas e prejuízo na produção das demais provas do caso, impedindo mesmo o acesso no ambiente forense, intimidando-as a tanto".

“O pedido é completamente absurdo”, afirma Thiago Bottino, professor de Direito Penal e Processo Penal da FGV Direito Rio. “Dizem que ele poderia ameaçar testemunhas. Quem é a testemunha ameaçada? De que forma o ex-presidente poderia ameaçar alguém? Você tem que demonstrar concretamente o que a pessoa está fazendo.”

O constitucionalista e professor da USP, Rubens Beçak, critica o pedido e lembra que ele se baseia em argumentos questionáveis, como em alguns casos de investigados da Operação Lava Jato. “Quando você pede qualquer tipo de prisão, é preciso ter uma justificativa. Antigamente, se apresentavam motivos mais tradicionais, como perigo causado pelo denunciado ou a chance de ele se evadir. Hoje em dia, a possível influência causada por ele no processo tem sido usada mais comumente, justificando, por exemplo, muitas das prisões da Lava Jato."

O STF já revogou 15 prisões preventivas determinadas pelo juiz federal Sérgio Moro, no âmbito da Operação Lava Jato. "O que significa que os ministros não concordam com o argumento utilizado por Moro para prender investigados na Lava Jato e isso certamente será um dado a ser avaliado pela juíza no caso do ex-presidente", analisa Luiz Flávio Gomes.

Não há prazo para decisão

O caso será analisado pela juíza da 4ª Vara Criminal de São Paulo, mas não há prazo para a decisão.

De acordo o glossário jurídico do STF (Supremo Tribunal Federal), a prisão preventiva "é um instrumento processual que pode ser utilizado pelo juiz durante um inquérito policial ou já na ação penal, devendo, em ambos os casos, estarem preenchidos os requisitos legais para sua decretação. O artigo 312 do Código de Processo Penal aponta os requisitos que podem fundamentar a prisão preventiva, sendo eles: a) garantia da ordem pública e da ordem econômica (impedir que o réu continue praticando crimes); b) conveniência da instrução criminal (evitar que o réu atrapalhe o andamento do processo, ameaçando testemunhas ou destruindo provas); c) assegurar a aplicação da lei penal (impossibilitar a fuga do réu, garantindo que a pena imposta pela sentença seja cumprida)." 

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