Com medo de "Fla x Flu político", alguns evitam vestir vermelho na Paulista
Por cerca de seis horas, das 9h às 15h desta sexta-feira (18), a avenida Paulista, em São Paulo, ficou inteiramente aberta para carros pela primeira vez desde a noite de quarta (16), quando começou a manifestação contra a presidente Dilma Rousseff e o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Nas calçadas do parque Trianon, a população que passa diariamente pelo local observava a concentração dos grupos a favor do governo antes do ato que defende Dilma e Lula.
No meio de um ambiente tranquilo -- quebrado apenas por provocações de pessoas que passavam de carro e moto e hostilizavam os manifestantes, que rebatiam --, muitos sentiam receio de serem agredidos como bodes expiatórios em conflitos alheios.
"Eu não tenho nada com isso, mas, às vezes, fico apreensivo. Pode vir um radical e me confundir [como manifestante], então é preciso prestar atenção", diz o analista de sistema Ricardo Moraes, 29, que faz um curso na região.
Por esse motivo, e após ouvir relatos de pessoas agredidas por usar a cor vermelha, Moraes resolveu evitar o vermelho, mas também o verde e amarelo, marca dos protestos contra o PT. "É por isso que estou de azul. Não quero me comprometer com nenhuma das duas partes. Parece clima de Palmeiras x Corinthians, que não dá para usar camisa de futebol em dia de jogo. Política não é isso. A violência é ignorância."
O estudante de tecnologia Victor Blanco, 19, foi outro que pensou em evitar o vermelho nesta sexta. "Vai que alguém me pega na saída do metrô e acontece alguma coisa. E agora mesmo, vi um pessoal apoiando partido [em frente ao Masp] e pensei 'será que é legal ficar aqui?' Aí, atravessei a rua", conta.
Blanco diz que até participou "um pouquinho" do protesto contra Dilma e Lula na quinta, mas afirma que é complicado opinar sobre o cenário político atual. "Muitos estão confusos, vendo que houve corrupção e pensando que foram usados pelo governo", analisa. Depois resume: "eu não gosto de me meter em política."
Luto com o governo
Já a artesã Fátima Costa, 51, não hesita em falar suas visões sobre política. Ao ser abordada pela reportagem, ela logo pergunta: "Você não vai me perguntar de novo por que não tem negro na manifestação contra o governo, né? Não aguento responder mais essa pergunta", diz Fátima, que é negra e participou do protesto contra Dilma e Lula no último domingo (13).
"Mas eu respondo: os negros não vêm, muitas vezes, porque não têm recurso para condução mesmo. O negro continua pobre, vem da senzala", afirma ela, que trabalha comercializando artesanato na avenida.
Fátima, migrante do sertão da Paraíba, acusa o PT de permanecer no poder por comprar votos. "Compram voto com prato de comida. Nasci no sertão, passei fome e lá continua a mesma coisa, igual quando eu tinha oito anos e compravam votos dando prótese dentária", conta. Ela relata que eventualmente discute com parentes que vivem no Nordeste e "idolatram" Lula. "Dizem que ele deu comida para quem não tinha. É verdade, e isso foi bom. Mas essa era sua obrigação como presidente."
"E não é só o Lula, são todos. Todos estão, em algum momento, envolvidos em algum escândalo. E a renovação na política é um círculo vicioso: o novo político é o neto daquele que já foi vereador, e assim vai", diz. "É triste, dá até vontade de chorar."
Fátima disse não sentir receio de ser agredida nos dias de manifestações. "Sempre trabalho nesses atos, e nunca aconteceu nada comigo, seja passeata do PT ou de grupos anti-Dilma. Só tenho receio, às vezes, do Choque", ressalta, sobre a tropa da Polícia Militar que por vezes entra em conflito com manifestantes.
Ela também não se preocupou em evitar qualquer tipo de cor nesta sexta. "Eu escolhi o preto porque estou de luto com o governo."
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