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Ex-presidente do Peru recebeu Dirceu como "homem de confiança de Lula"

Alan García tenta ser novamente presidente do Peru, mas está em 5º lugar nas pesquisas - Cris Bouroncle/AFP Photo
Alan García tenta ser novamente presidente do Peru, mas está em 5º lugar nas pesquisas Imagem: Cris Bouroncle/AFP Photo

Flávio Costa

Do UOL, em São Paulo

10/04/2016 06h00

Após deixar a Casa Civil, acusado de comandar o mensalão, o ex-ministro José Dirceu foi recebido em audiência oficial pelo então presidente do Peru, Alan García, "como homem de confiança do presidente Lula".

A informação consta no depoimento prestado a autoridades locais em janeiro pelo ex-presidente peruano, que concorre neste domingo novamente à Presidência do seu país. Documentos da operação mostram indícios da ligação do ex-ministro com supostas propinas pagas no Peru em conexão com o esquema de corrupção brasileiro.

Preso em Curitiba desde agosto, Dirceu é acusado de receber R$ 11,8 milhões em propina de empresas com contratos com a Petrobras. Na quinta-feira (7), o Ministério Público Federal pediu a condenação do ex-ministro e de outras 14 pessoas em uma ação penal da Operação Lava Jato.

Nas alegações finais, os procuradores afirmam que Dirceu possibilitou que grande parte do esquema na Petrobras se desenvolvesse ao ser o responsável pela indicação de Renato Duque à Diretoria de Serviços da Petrobras. Ele responde pelos crimes de corrupção passiva qualificada, organização criminosa e lavagem de dinheiro.

Fortalecer relação com Lula

"Meu propósito era fortalecer a relação com o presidente Lula e seu regime para benefício do Peru", explicou o ex-presidente peruano sobre o encontro com Dirceu. Ele se lembra de ter recebido o ex-ministro da Casa Civil, em 2008, em uma única visita protocolar no Palácio Governo, em Lima, que durou "breves minutos". Dirceu deixou o governo em 2005. Nesse mesmo ano, teve seu mandato de deputado federal cassado pela Câmara.

Os temas da conversa, segundo o ex-presidente peruano, foram a relação entre os dois países, e a insistência do "presidente Lula em fortalecer programas sociais no Peru. Programas sociais que se aplicavam no Brasil para serem aplicados no Peru". García afirma que se encontrou com Dirceu, sem que este estivesse acompanhado de qualquer empresário. 

Procurado, o ex-presidente Lula afirmou, por meio do instituto que leva seu nome, que não se manifestará sobre o assunto.

García negou que Dirceu tivesse feito propostas de vantagens indevidas durante o encontro: "Se ele estivesse feito eu o teria expulsado do Palácio do Governo".

Dirceu no Peru - Reprodução/Internet - Reprodução/Internet
Em janeiro de 2007, o ex-ministro José Dirceu esteve acompanhado do ex-presidente da OAS, Léo Pinheiro, quando visitou o então presidente do Peru, Alan Garcia
Imagem: Reprodução/Internet

Em pelo menos dois pontos, o depoimento de García entra em contradição com o que foi informado por jornais peruanos, "La Republica" e "El Comercio". Os relatos informam que García recebeu Dirceu em 23 de janeiro de 2007, e não em 2008, como disse o ex-presidente. Fotografia divulgada à época mostra que Dirceu estava acompanhado pelo ex-presidente da OAS, Léo Pinheiro, condenado em um dos processos da Lava Jato, e por Zaida Sisson, suspeita de receber propinas de empresas brasileiras atuar no Peru.

Sobre a presença de Zaida no encontro, García afirmou o seguinte: "Que a senhora é mulher de funcionário do governo peruano e em várias ocasiões, como brasileira residente no Peru, participou de grandes delegações que assistia o presidente Lula, e que, na breve reunião com senhor Dirceu, esteve presente na condição de tradutora". O ex-presidente foi arrolado como testemunha pela defesa de José Dirceu.

Para os procuradores da República no Paraná, há evidências de que de não foram realizados os serviços contratados pelas empreiteiras da JD, a empresa de consultoria de Dirceu. "Há elementos de prova de que Zaida tenha recebido recursos de propina dessas empreiteiras para atuar em favor das empresas no Peru", diz petição do Ministério Público Federal, apresentada, em agosto de 2015, ao juiz Sergio Moro, titular da 13ª Vara Federal de Curitiba.

García é novamente candidato

Presidente do Peru por duas vezes (1985-1990 e 2006-2011), Alan García é candidato a mais um novo mandato na próxima eleição presidencial, cujo primeiro turno se realizará no país neste domingo (10). De acordo com pesquisas recentemente divulgadas, García ocupa o quinto lugar, com menos de 4% das intenções de voto. A líder é a filha do ex-ditador Alberto Fujimori, Keiko Fujimori.

O UOL pediu entrevista a um dos procuradores da República no Paraná que integram a Força Tarefa da Lava Jato. A assessoria de imprensa respondeu que "qualquer manifestação será feita nos autos do processo". A reportagem entrou em contato por telefone e e-mail com o advogado criminal Roberto Podval, que defende José Dirceu, mas ele não retornou os telefonemas. 

Outra conexão das investigações da Lava Jato com obras realizadas por empreiteiras brasileiras no Peru é uma planilha da construtora Odebrecht que faz possível referência ao atual presidente Ollanta Humala. O documento apreendido durante a Operação Acarajé, a 23ª fase da Laca Jato, cita um certo "Projeto OH" relacionada ao valor de R$ 4,8 milhões, que de acordo a Polícia Federal pode ser uma referência a Humala, Ele negou a acusação.

Moro define data para alegações finais

Dirceu também desejava que o magnata mexicano Carlos Slim e outros executivos residentes no México e nos Estados, a quem diz ter prestado consultorias, também prestassem testemunho em seu favor. Porém, como os interrogatórios ainda não foram realizados, o juiz federal Sergio Moro já definiu no último dia 17 de março, os prazos para alegações finais para a acusação e defesa na ação penal. O Ministério Público Federal entregou suas alegações finalis na quinta e as defesas dos réus têm até o primeiro dia útil após o feriado de Tiradentes (21) para fazê-lo.

"Observo, aliás, que a prova pretendida através desses dois pedidos de cooperação, oitiva de testemunhas nos Estados Unidos e no México, apesar de deferida, sequer tem relação direta com o objeto do contrato, propinas em contratos da Engevix com a Petrobras e lavagem por intermédio de Milton Pascowitch, com o que são de duvidosa relevância. O pedido de cooperação internacional que tinha essa pertinência, do Peru, já foi integralmente cumprido e devolvido", escreveu Moro.

 

Dirceu presta depoimento ao juiz Sergio Moro

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