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Tiririca nega encontro com Lula e diz que voto anti-Dilma "veio do coração"

17.abr.2016 - O deputado Tiririca anuncia ao microfone seu voto a favor do impeachment - Nilson Bastian/Câmara dos Deputados
17.abr.2016 - O deputado Tiririca anuncia ao microfone seu voto a favor do impeachment Imagem: Nilson Bastian/Câmara dos Deputados

Guilherme Azevedo

Do UOL, em São Paulo

19/04/2016 21h06

O deputado Tiririca (PR-SP) negou, em mensagem publicada na sua página no Facebook, ter se encontrado com o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva pouco antes da votação do processo de impeachment de Dilma Rousseff (PT) na Câmara dos Deputados, no domingo (17), ocasião em que teria prometido voto a favor da presidente. Tiririca não seguiu a orientação do seu partido, base do governo, e foi um dos 367 deputados que votaram sim, recomendando o avanço do afastamento de Dilma.

"Quem me conhece sabe que não participo de nenhum tipo de reunião que envolva minhas convicções e crenças. O meu voto veio do coração e de acordo com o que acredito. Vim do povo, sou do povo e trabalho para o povo", escreveu o deputado.

Ao acompanhar pela TV a votação do domingo ao lado de Dilma e de outros integrantes do governo, Lula teria reagido com indignação à suposta mudança de voto de Tiririca: "Esse cara esteve comigo hoje. Como ele faz isso? Ele ia votar com a gente".

Mensagem de Tiririca negando encontro com Lula:

Às 8h42 do dia da votação do domingo, contudo, Tiririca fizera a postagem de uma piada que já indicava em que lado do impeachment estava. Ele narra o caso da infidelidade da mulher, alertado por um amigo, que gravara inclusive um vídeo provando o mau comportamento dela. A história evolui com Tiririca dizendo que não poderia aceitar "uma filmagem ilegal" e decidira se afastar do amigo, com o apoio da mulher. "Não vai ter golpe no meu casamento!", finaliza, com ironia. O brado de luta "Não vai ter golpe!" é o mais repetido por manifestantes a favor de Dilma, e a piada alude também ao episódio das escutas telefônicas de Lula feitas pela Polícia Federal, uma delas envolvendo a presidente.

Piada postada no dia da votação, em que Tiririca indica ser a favor do impeachment:

 

O voto de Tiririca pela abertura do processo de afastamento de Dilma foi um dos mais breves e objetivos entre todos os 511 deputados presentes, proferida com o punho direito cerrado erguido, assim inscrita nos registros taquigráficos da Câmara dos Deputados: "Sr. Presidente, pelo meu país, meu voto é ‘sim’!".

Foi a primeira vez que ele assumiu o microfone da Casa em mais de seis anos como deputado federal. Mas se Tiririca fala pouco na tribuna, comparece muito ao plenário: nas suas duas legislaturas (a 54ª e a 55ª), o parlamentar não acumula nenhuma ausência, conforme o relatório de presença em plenário da Câmara. Portanto, nunca faltou às sessões.

Reações

O voto de Tiririca pró-impeachment gerou, entretanto, em sua página no Facebook, muita polêmica e discussão entre leitores e eleitores. A postagem do dia da votação, com a foto do momento de seu voto, gerou mais de 2.800 comentários até a noite desta terça-feira (19). A postagem em que nega encontro com Lula tinha mais de 1.500 comentários. Eram manifestações a favor e contra o voto, mostrando mais uma vez o alto grau de polarização hoje vigente no país.

Joanns Forte, por exemplo, criticou Tiririca: "Sou cidadão brasileiro, sociólogo e professor universitário, e sempre argumentei em defesa das positividades do seu mandato diante das chacotas que sempre lhe fazem por você ser um palhaço, um analfabeto, que seguiu para a Câmara dos Deputados em razão da banalização do voto. Infelizmente, em 17/04/2016, você traiu flagrantemente a democracia brasileira juntando-se àqueles que querem tomar o Brasil para si, para as suas famílias, para os seus interesses próprios. Saiba, Tiririca, que você fez uma palhaçada no pior sentido do termo. E, por isso, você jamais será esquecido como o palhaço que, como deputado, fez o Brasil sangrar".

Mas Ernesto Montes, como outros, o defendeu: "Foi o melhor voto Deputado!! Não deixe que esses petistas burgueses, falsos moralistas lhe iludam, representou os anseios da maioria e representou bem o Brasil e os nordestinos assim como eu!!! Nós não somos tão abestados né?! kkkkkkkkkkk melhor voto!! parabéns!! (Burgueses sim, pq já foi o tempo que o PT trabalhava só pros pobres como dizem)".

Segundo deputado federal mais bem votado do país, com 1,016 milhão de votos em 2014 (na primeira eleição, em 2010, marcara 1,3 milhão de votos, recorde de apoio popular até hoje), Tiririca voltou ao tema do impeachment, de forma bem-humorada, em vídeo que circulou nesta terça pelas redes sociais. Diz Tiririca, imitando o voto de boa parte dos deputados: "Pela Florentina de Jesus, pelo meu cachorro Lulu, pela minha irmã Ducolina, pela minha esposa, minha amante e minha namorada, pelo meu filho que vai nascer em 2020... eu voto sim!", diz na gravação. "Mas num momento daquele não dá para brincar", se justifica, ao fim do vídeo.

 

Voto decoroso

Para Roberto Romano, professor de filosofia e ética da Unicamp (Universidade Estadual de Campinas), a manifestação de Tiririca ao microfone da Câmara correspondeu ao decoro que o cargo e o momento agudo exigiam. "O voto de Tiririca é digno de todos os elogios e respeito. Não é preciso concordar com o voto dele, mas foi totalmente de acordo com a condição desempenhada pelo deputado", analisou.

Romano explicou que a questão do decoro é substantiva no caso de legisladores e governantes, uma vez que é ela que garante o apoio e o respeito da população, mas que grande parte dos parlamentares, ao externar meras questões pessoais na hora de votar, reduziu um assunto de Estado a uma simples e indevida questão privada.

Analisando a breve fala de Tiririca, o professor elogiou: "Entre o ‘Em nome do meu país’ (fala de Tiririca) e o ‘Bolinho de arroz da minha mãe’, há uma diferença abissal. Ele não mais que reafirmou sua condição de representante do país no plano federal, de representante do povo em sua totalidade".

Romano ainda lembrou antiga lição de Plutarco a todos os políticos, no clássico "De garrulitate" ("O palavrório", na tradução livre do professor): "O palavrório é o grande inimigo da prudência política".

O professor de ciência política Francisco Fonseca, da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), contudo, avaliou o voto de Tiririca como resultado da "operação de abafa comandada pelo vice-presidente Michel Temer (PMDB)". Segundo o estudioso, Temer "está se mostrando um golpista profissional", e "Tiririca foi abatido por uma operação político-empresarial cujo objetivo é o golpe".