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Só o STF pode barrar o processo de impeachment de Dilma

Especialistas dizem que o STF é a instância apropriada para julgar impasse entre Câmara e Senado - Lula Marques/Agência PT
Especialistas dizem que o STF é a instância apropriada para julgar impasse entre Câmara e Senado Imagem: Lula Marques/Agência PT

Felipe Amorim*

Do UOL, em Brasília

09/05/2016 21h50

O processo de impeachment analisado pelo Senado só pode ser barrado por uma decisão do STF (Supremo Tribunal Federal). Especialistas em direito constitucional não veem irregularidades na postura do presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), ao ignorar a decisão da presidência da Câmara dos Deputados de anular os procedimentos aprovados na Casa anteriormente.

O presidente interino da Câmara dos Deputados, Waldir Maranhão (PP-MA), decidiu na manha desta segunda-feira (9) anular o processo que autorizou o Senado a analisar o impeachment da presidente Dilma Rousseff.  Renan não reconheceu a decisão e manteve o calendário original do processo contra a presidente.

Professores ouvidos pelo UOL afirmam que, se for o caso, a questão deve ser resolvida pelo STF a partir de recursos que podem ser protocolados por Maranhão e pelo governo Dilma. Como o Senado e a Câmara são independentes, apenas uma decisão judicial da corte poderia reverter o processo. 

Nesta quarta-feira (11), o Senado deve colocar em votação a abertura de processo contra Dilma, o que, se aprovado, leva ao afastamento temporário da presidente por 180 dias ou até o fim do julgamento no Senado.

O resultado de um possível julgamento dos recursos, no entanto, é incerto por dois motivos: a falta de um histórico conhecido de decisões sobre esse tipo de questão; e por não haver previsão legal clara sobre como arbitrar esse tipo de disputa, segundo avalia o professor de direito constitucional da FGV Direito SP Rubens Glezer, coordenador do projeto Supremo em Pauta, que acompanha a atuação do tribunal.

“A verdade é que é um espaço de vácuo jurídico muito grande. O direito diz pouco sobre como resolver isso. E nesses momentos em que o direito não tem voz mais forte, o que fala mais alto é a política”, diz Glezer. “O Supremo não tem jurisprudência clara de quando considera interna corporis [questão interna do Congresso] ou quando entende que pode interferir. [O STF] trata questões semelhantes de maneira não uniforme.”

Já o professor de direito constitucional da PUC-SP Marcelo Figueiredo afirma que é o STF quem decide, mas crê que dificilmente a corte reverterá a decisão tomada por Calheiros que, em seu entender, está correto em manter a tramitação do processo de impeachment no Senado Federal, pois a decisão do presidente interino da Câmara não tem valor legal. "O STF é a instância judiciária apropriada para julgar a questão. Mas se instado a julgar o caso, os ministros devem considerá-lo uma questão interna do Legislativo."

Figueiredo acrescenta que o recurso deveria ter sido pautado em abril pelo então afastado presidente da casa legislativa, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), para ser apreciado pelo plenário da Câmara, antes da votação da admissibilidade do processo de impeachment, que ocorreu em 17 de abril.

"Com Cunha não tomou esta decisão, era este o momento apropriado para a Advocacia-Geral da União recorrer ao Supremo. Agora esta decisão de Maranhão inexiste, pois ele não tem competência legal para tomá-la", afirma o constitucionalista.

Decisão de Fux

Em decisão tomada na sexta-feira (6), o ministro do STF Luiz Fux negou ação de deputado do PT que usava o mesmo argumento utilizado pelo presidente interino da Câmara para suspender o processo de impeachment. Ao negar a ação, Fux afirmou não ver nenhuma ilegalidade na sessão que aprovou o impeachment na Câmara e disse que a resolução desse tipo de contestação deve ser feita pela própria Câmara.  

Na ação, o deputado Paulo Teixeira (PT-SP) afirmava que os líderes dos partidos não poderiam ter orientado as bancadas antes da votação, pois isso contraria a determinação de que, no impeachment, o voto seja emitido com base na livre opinião de cada deputado.

Partidos favoráveis ao impeachment, com maioria na Câmara, também já se articulam para derrubar a decisão de Maranhão em votação no plenário da Câmara, o que poderia dificultar uma contestação jurídica à decisão do Senado de prosseguir com o processo.  

STF pode analisar de novo julgamento do Senado

O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Ricardo Lewandowski, afirmou nesta segunda-feira (9) que, após o julgamento do impeachment da presidente Dilma Rousseff pelo Senado, a Suprema Corte deverá decidir se pode ou não reanalisar o caso e entrar juridicamente no debate, que tem natureza política.

O ministro se reuniu com os presidentes da Organização dos Estados Americanos (OEA), Luis Almargo Lemes, e da Corte Interamericana de Direitos, Roberto Caldas, que estiveram no STF para manifestar preocupação da comunidade internacional com o trâmite do processo contra Dilma no Congresso. Ambos indicaram dúvidas de que a denúncia contra a petista poderá de fato ensejar condenação por crime de responsabilidade e questionaram a imparcialidade dos julgadores.

"Ainda não há uma decisão política sobre o mérito do impeachment. Por enquanto, o Brasil está aguardando uma decisão do Senado. Pode ser que o Supremo venha ou não a ser instado a se pronunciar sobre essa questão, que terá de decidir inicialmente se a decisão é exclusivamente política ou se conforta algum tipo de abordagem de ponto de vista jurídico passível de ser examinada pelo Supremo Tribunal Federal", explicou Lewandowski.

Por sua vez, o ministro Gilmar Mendes criticou a decisão de Maranhão, afirmando que ela "não faz nenhum sentido". Mas, até as 20h desta segunda-feira, nenhum deputado, senador ou partido político havia acionado o STF.

Mais cedo, a ministra Rosa Weber barrou duas ações movidas por cidadãos comuns, com o argumento de que decisões do Congresso Nacional não poderiam ser questionadas por particulares por meio daquele tipo de ação, um mandado de segurança.

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*Colaborou Flávio Costa (com Estadão Conteúdo)