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Amigos e militantes lembram histórias de Marisa: 'Ela vai fazer muita falta'

Juan Esteves/Folhapress
Imagem: Juan Esteves/Folhapress

Aiuri Rebello

Do UOL, em São Paulo

04/02/2017 05h17Atualizada em 04/02/2017 14h27

Foi em clima de recordação das histórias do casal Luiz Inácio e Marisa Letícia Lula da Silva que os antigos companheiros do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC, em São Bernardo do Campo, na Grande SP, e militantes do PT passaram a noite de sexta-feira (3), depois que foi confirmada a morte cerebral da ex-primeira-dama, aos 66 anos. Ela estava internada no Hospital Sírio-Libanês desde o dia 24, quando sofreu um AVC (Acidente Vascular Cerebral).

O ponto de encontro foi o Bar da Dona Rosa, junto a uma das esquinas do edifício histórico de onde Lula, na condição de presidente da entidade, comandou as greves de metalúrgicos do ABC que acabariam por projetá-lo como personalidade política brasileira. O local era ponto certo para encontrar Lula depois do expediente, entre cachaças e cervejas, conversando e articulando com os colegas. Era o final dos anos 1970. 

Ex-primeira-dama Marisa Letícia Lula da Silva morre aos 66

Band Terra Viva

“Teve aquele dia, quando o Lula já era presidente, que ele veio aqui no sindicato e entrou no meu Fiat 147 branco com a Marisa e saiu dirigindo, lembra?”, questiona um senhor idoso. “Virou notícia no mundo todo, queriam saber que carro era aquele, por que eles fizeram isso…”, completa. E quando "ela me chamava de Ni, e eu chamava ela de Má…”, fala uma senhora na mesa ao lado.

Teve ainda "aquela outra vez que fui buscar ele em casa para vir para o trabalho e a dona Marisa estava louca da vida por que o homem tinha chegado tarde…”, confidencia um companheiro. “Ela vai fazer muita falta, inacreditável, que saudade”, sentencia alguém.

“Eles tiveram muitos momentos felizes aqui com a gente, dá uma saudade danada”, diz dona Rosa, que sorri quando perguntam sua idade, que está na casa dos 70 anos. “A última vez que vi a Marisa foi em dezembro. Ela veio aqui, tinha um compromisso aqui do lado, e ficamos conversando um tempão. Fazia oito anos que ela não aparecia… Será que a alma dela já estava inconscientemente se despedindo?”, questiona a dona do bar.

Marisa Letícia - Leonardo Soares/ Xinhua/ Agência Estado - Leonardo Soares/ Xinhua/ Agência Estado
Imagem: Leonardo Soares/ Xinhua/ Agência Estado

Durante toda noite de ontem, o bar ficou cheio de novos e velhos militantes petistas e trabalhadores ligados ao sindicato. “Sem Marisa, não teria havido Lula”, resume Damasceno, que está para completar 68 anos. Fundador do PT e diretor no sindicato, ele desiludiu-se com o partido que ajudou a criar e se afastou da agremiação há cerca de 15 anos, pouco antes de Lula chegar à Presidência da República, em 2003. Nunca desfiliou-se, mas também não vota mais legenda.

Do casal Lula e Marisa, nunca se separou. “A gente vai ficando chateado com algumas coisas, mas nunca com as pessoas que a gente ama de verdade. Eu perdi hoje uma pessoa que era como uma irmã”, diz ele entre um brinde em homenagem a ela e outro. “Foram meus padrinhos de casamento”, conta. Damasceno ficou viúvo há sete anos, e desde então havia falado pouco com Marisa. “Elas eram muito amigas, e mantinham as famílias em contato”.

Ele hoje em dia é figura rara no bar de dona Rosa, mas nesta quinta-feira fez questão de ir ao local: “Tive que vir. Hoje era dia de lembrar essas histórias e beber com os amigos em homenagem a ela”. Damasceno diz que ainda tem o Fiat 147 branco que, há quase 40 anos atrás, havia sido de Marisa Letícia e Lula, nessa ordem. “Está novinho, não vendo por dinheiro nenhum nesse mundo”.

A trajetória de uma ex-primeira-dama

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Velório e homenagens

Ao longo da noite, pessoas, histórias e memórias cruzaram-se naquela esquina de São Bernardo do Campo para lembrar e homenagear a ex-primeira-dama. No saguão do sindicato, poucos metros ladeira abaixo, militantes chegavam de todo o Brasil para acompanhar o velório. “Eu vim de Santos”, diz o aposentado Elias do Carmo da Silva, 41. “Fiz questão de prestar condolências para a família e mostrar para o Lula que ele não está sozinho”, afirma. “Hoje estou indignado com o meu Brasil. Quando pessoas torcem pelo mal dos outros dessa forma, que nem andou acontecendo nesse caso, é ainda mais importante vir mostrar solidariedade.”

No início desta madrugada, os militantes ainda eram esparsos, mas chegavam pouco a pouco de vários lugares. “Eu vim do interior do Paraná, vou dormir aqui para mostrar que sentimos muito a morte da dona Marisa, uma grande mulher brasileira”, afirmou uma militante que chegou ao sindicato pela tarde e só iria embora depois do velório.

As ruas em volta do Sindicato dos Metalúrgicos do ABC começaram a ser fechadas no final da noite pela Polícia Militar e o departamento de trânsito de São Bernardo do Campo. O velório de Marisa Letícia Lula da Silva está previsto para começar às 9h deste sábado (4) e ser encerrado às 15h. O local será aberto ao público após o final de uma cerimônia reservada para a família e amigos. A cremação será realizada no Cemitério Jardim da Colina.

25.jan.2016 - O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, acompanhado de sua esposa, Marisa Letícia, no dia da posse da presidente Dilma Rousseff, no Palácio do Planalto, em Brasília, dia 1º de janeiro de 2011 - Wilton Júnior/ Estadão Conteúdo  - Wilton Júnior/ Estadão Conteúdo
Imagem: Wilton Júnior/ Estadão Conteúdo

Vítima de um AVC

Marisa Letícia foi internada em estado grave no hospital Sírio-Libanês no dia 24 de janeiro, após sofrer um AVC (Acidente Vascular Cerebral) hemorrágico. Ela chegou a apresentar uma ligeira melhora na terça-feira (31), e a sedação começou a ser reduzida. Como ela não reagiu bem, voltou a ser sedada, mas piorou na quarta-feira.

Na quinta-feira, um doppler transcraniano já havia mostrado que dona Marisa não tinha mais fluxo cerebral. A partir de então, a família Lula da Silva autorizou o início dos procedimentos para a doação de órgãos. A ex-primeira-dama teve a morte confirmada na noite desta sexta-feira (03), após a realização de exames protocolares. 

Marisa acompanhou Lula desde o início de sua vida política, durante as greves de operários no ABC paulista no fim dos anos 1970 – ele tornou-se presidente do sindicato um ano depois do casamento deles, em 1975. Ela foi a responsável por costurar a primeira bandeira do Partido dos Trabalhadores. Além do filho de seu primeiro casamento, Marcos, adotado por Lula, Marisa deixa os filhos Fábio, Sandro, Luís Cláudio, e a enteada, Lurian (filha do ex-presidente com uma ex-namorada).