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Odebrecht diz que Dilma sabia de contrato ilícito na Petrobras; veja delação premiada

Paula Moura

Do UOL, em São Paulo

12/04/2017 19h01

Em delação premiada à Procuradoria Geral da República, Marcelo Odebrecht afirma que a ex-presidente Dilma Rousseff sabia de pagamento ilícito em contrato da Petrobras relacionado ao PAC SMS  (Plano de Ação de Certificação em Segurança, Meio Ambiente e Saúde). 

Ele narra que estava em Angola e recebeu ligação de Graça Foster, então presidente da Petrobras, questionando sobre pagamento ao PMDB em 2010.

Odebrecht afirma que antes disso nunca tinha falado sobre propina nem com Graça nem com a presidente Dilma Rousseff. Depois disso, ele relatou que brigou por e-mail com Graça e que soube que ela falou sobre o caso com Dilma. Posteriormente, teve uma reunião com a presidente da República para contar sua versão.

Segundo Odebrecht, ele argumentou que o pagamento tinha feito também ao PT com conhecimento de João Vaccari Neto, ex-tesoureiro do partido.

“Ela queria saber quem estaria recebendo o dinheiro pelo PMDB”, disse sobre Dilma. “O que ela estava preocupada era com esse pagamento para a eleição de 2010 para o grupo do PMDB.” E Dilma teria dito: “Você e Graça têm que se entender de volta”. Naquele momento já havia uma comissão interna de apuração na Petrobras e um executivo da Odebrecht estava sendo investigado pelo Ministério Público.

Dilma teria pedido para Guido Mantega e José Eduardo Cardozo intermediarem a questão e eles teriam conseguido que Graça escrevesse uma carta para o MP para aliviar a situação do executivo, segundo Marcelo Odebrecht.

O empresário afirma que no final nada se resolveu, o contrato foi renegociado e teve prejuízo. O valor da propina seria entre 10 e 20 milhões de reais. 

Ele também relatou como foram feitos pagamentos para partidos da coalizão da candidatura de Dilma Rousseff à presidência em 2014. Além disso, explicou como funcionava a 'planilha pós-Itália', com dinheiro entregue ao então ministro da Fazenda Guido Mantega. Também classificou a construção do estádio do Corinthians, o Itaquerão, como "pepino".

Michel Temer


Marcelo Odebrecht falou sobre jantar em 2014 para acertar a doação de R$ 10 milhões para grupo político do presidente Michel Temer, que na época era candidato à vice-presidência.

Ele afirma que Temer não falou de valores em nenhum momento e que saiu do jantar na hora em que o acerto seria feito. “O Temer nunca mencionou para mim os 10 milhões, mas obviamente que [o jantar] ele sabia, mas nunca mencionou valor”, disse Odebrecht.

“Acho que Temer não falaria de dinheiro nem comigo, nem com a esposa, com ninguém. No jantar tem aquele negócio, fala-se de política, apoio, agradeço o apoio que vocês estão dando sem mencionar valor…”, diz. Mas depois Temer saiu, e a negociação foi feita entre Odebrecht, o ex-diretor de Relações Institucionais da empresa, Cláudio Melo Filho e Eliseu Padilha.

Segundo o empresário, no começo de 2014, Padilha pediu a contribuição e cita a lógica de que apesar de que ambos não serem candidatos, havia a questão do “cacique”. “Isso era comum em toda eleição, os caciques dos partidos pediam recursos para seu grupo de apoio”, disse.

O jantar foi marcado para garantir que Paulo Skaf recebesse R$ 6 milhões desse valor.

Repasses ao PMDB

De acordo com Marcelo, a negociação com o PMDB no Congresso, conduzida por Cláudio Melo, ex-diretor de relações institucionais do grupo, se dava no Senado com Romero Jucá e na Câmara com Eliseu Padilha. “O que Cláudio falava para gente sempre era que todos os interesses financeiros de campanha do Renan [Calheiros], do Eunício [Oliveira] e de todo o resto do PMDB eram coordenados pelo Jucá. E facilitava muito no nosso modo de ver”, disse.

Ele relatou ainda que o contato com o ex-presidente da Câmara Eduardo Cunha era feito por vários empresários que o conheciam, e não especificamente por Cláudio.

Odebrecht cita como era feita a negociação e a expectativa dos políticos na contrapartida com doações para campanhas eleitorais. Um dos exemplos dados é o de Geddel Vieira Lima, ex-ministro-chefe da Secretaria de Governo de Michel Temer.

“Uma pessoa que Cláudio sempre usou como referência era o Geddel. Era um cara da relação antiga dele, de meu pai [em referência a Emílio Odebrecht]. Conheço Geddel de maneira protocolar. Mas eles sempre diziam: Geddel é um cara que briga pela gente.

Qualquer coisa que você pede, Geddel vai, se desgasta, faz e acontece. Agora, se prepare porque ele vai criar uma expectativa na época de eleição além do que a gente daria para qualquer outro deputado ou senador. Muito além”, afirma Marcelo.

“Eu dizia: Cláudio, se tem uma medida provisória, se tem qualquer processo no Congresso que você precisa do apoio de um senador ou um deputado, seja assumido um compromisso [(em referência a valores] explícito ou não, sempre deixe claro com o negócio que tem interesse na medida que vai haver, por conta disso, um compromisso. Mesmo que você não tenha fechado o compromisso na hora, você tem um compromisso moral e o cara criou a expectativa”, explica Marcelo.

Aécio Neves

Odebrecht relatou sobre suas ligações com Aécio Neves e os negócios da empreiteira em Furnas. "Quem cuidava da relação de contribuições, qualquer pedido naquela época, estou falando de 2000, era o Henrique, responsável pelo nosso negócio de energia. Tinha interesse e, principalmente, lidava com Dimas (Toledo, ex-presidente da estatal de energia e antigo aliado de Aécio). Dimas, na época, era um operador informal do PSDB."

"Eu me lembro de ter tido várias reuniões com Aécio", declarou. O empreiteiro abordou a campanha de 2014, quando Aécio disputou a Presidência com Dilma. "Começamos a definir valores."

Segundo ele, a "primeira conversa" com o tucano foi ainda na pré-campanha do PSDB. "Precisavam ter gastos de pré-campanha aí acertei com ele valor de gastos para a pré-campanha. Aparentemente, pode até ter sido com doação oficial para o PSDB. Bancou durante dez meses valores, era 500 mil por mês, durante dez meses."

"Eram valores relevantes na pré-campanha para 2014, esse foi o valor que eu acertei com Aécio um momento, depois fizemos doação oficial a Aécio, mais ou menos o mesmo montante de Dilma", relatou o delator. "Do ponto de vista oficial a gente equilibrou o valor de Aécio com o valor de Dilma", ele prosseguiu no depoimento gravado em vídeo pela força-tarefa da Lava Jato.

O empresário disse que, na véspera do primeiro turno da eleição 2014, ganhou força a possibilidade de a petista levar já no primeiro turno. Segundo ele, o tucano "precisava de um fôlego" e o procurou. "Pediu um encontro comigo. Eu falei 'Aécio, é complicado, eu não posso aparecer doando mais pra você do que pra Dilma'. 

Odebrecht contou ter combinado com o diretor da empreiteira em Minas, Sérgio Neves. "Olha Sérgio, procura o Osvaldo e acerta o valor de 15 (milhões)."

Relação com políticos

Marcelo Odebrecht, em outro vídeo, explicou que a relação de uma empresa com um agente público se baseia em um tripé:

1) a capacidade da empresa de entregar aquilo que é legítimo, lícito; 2) a relação pessoal de confiança e 3) dinheiro para atender a interesses políticos ou particulares.

“Esse tipo de coisa vai sempre existir”, diz o ex-presidente da Odebrecht. 

Ele ainda fala que se um funcionário tem uma relação mais baseada no dinheiro, ele pode ser trocado. Por isso, era costume "vender" aos líderes, como ele, que havia uma relação mais pessoal com determinados políticos.

Guido Mantega

Odebrecht também explicou como era a influência de Guido Mantega sobre o setor de etanol e como foi a distribuição de dinheiro ao PT e a parlamentares para transformar a MP 613/13 em lei para incentivos ao setor de etanol.

Marcelo falou ainda sobre a atuação do ex-ministro da Fazenda Guido Mantega para destravar a liberação de um negócio pela Previ (fundo de previdência dos funcionários do Banco do Brasil ) com a Odebrecht Realizações Imobiliárias.

Segundo o empresário, Mantega "azeitou" a liberação do negócio --Marcelo levou o caso ao ex-ministro e, depois disso, lançou um crédito de R$ 27 milhões em favor do PT na conta corrente usada para fazer repasses de interesse ao governo.

"Negociações dessas travam mesmo. Fica difícil dizer (se negócio teria sido feito sem a atuação de Guido Mantega). Teria destravado em mais tempo se eu não tivesse falado? Eu não posso dizer (...) Com certeza ajudou. Atrapalhar não atrapalhou", disse Marcelo.

A aprovação de MP para beneficiar a Braskem e a situação da chamada Guerra dos Portos também foi relatada. Assim como "valor por fora" para viabilizar compra da Quattor pela Braskem.

Marcelo afirmou que o "custo Congresso" aumentava com as "pontas soltas" deixadas pelo governo na edição de medidas provisórias (MPs). "(Em) várias MPs, não era incomum o governo deixar pontas soltas. E a gente ter que ajustar via relator no Congresso". Ele cita Guido Mantega como seu interlocutor nas negociações.

O primeiro "crédito" entregue a Palocci também foi tema da delação. Feito em 2009, era referente à aprovação da MP 409 de 2009, referente aos dos Refis da Crise.

Foi requisitado que o empresário também descrevesse sua formação profissional e sua carreira no grupo Odebrecht.

(Colaborou Talita Marchao)