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MPs "compradas" pela Odebrecht tiveram 4,5 vezes mais emendas que média

Sérgio Lima/Folhapress
Imagem: Sérgio Lima/Folhapress

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

27/04/2017 04h00

As MPs (Medidas Provisórias) citadas por delatores da Odebrecht receberam um número de emendas no Congresso 4,5 vezes maior que a média das demais que transitaram nas duas casas legislativas --Câmara e Senado.

O UOL levantou os dados de 15 das MPs que foram citadas em delações, votadas por parlamentares. Treze delas foram convertidas em leis. Segundo os delatores, elas começaram a ser "compradas" a partir de 2005, como a "MP do Bem" , e seguiram até 2015, mesmo após o início da Lava Jato. As medidas tiveram nada menos que 3.194 emendas --o que dá uma média de 212,9 para cada uma das medidas.

De acordo com levantamento do pesquisador do tema, doutor em direito econômico e autor do blog "Leis e Números" Bruno Carazza, as 666 medidas editadas entre setembro de 2001 e dezembro de 2014 tiveram uma média bem menor: 46 emendas por MP.

As emendas são alterações de parlamentares que modificam termos e artigos ou adicionam pontos às medidas. Após essas emendas, a MP é votada e, mesmo se aprovada, pode ser vetada pela Presidência da República.

No caso das MPs citadas pelos delatores, o grupo teria pago a parlamentares para garantir o trâmite e aprovação de medidas ou pela inclusão de pontos que beneficiassem a empresa --justamente com emendas que ampliavam benefícios.

"As MPs são canais fantásticos para grupos econômicos conseguirem regimes tributários especiais (isenções, anistias, subsídios, etc.). Sua tramitação é rápida e menos sujeita ao escrutínio público. Como o governo tem interesse na sua rápida aprovação, ela aumenta o poder dos caciques no Parlamento, como líderes partidários ou relatores", afirma Carazza.

Ao contrário dos projetos de lei, que passam por longos trâmite nas duas casas antes de entrarem em vigor, as MPs têm efeito imediato após publicadas pelo Executivo. Ao serem editadas, as MPs são analisadas por comissões criadas na Câmara e Senado. Elas têm validade de 60 dias, com prazo prorrogável por mais 60 --nesse período elas têm de ser votadas nas duas casas. Se aprovada, vira lei; se rejeita, perde o efeito.

Em depoimento, Marcelo Odebrecht explicou que negociava com o governo uma MP e, ao ser editada, era procurada por parlamentares, que pediriam vantagens para aprovar ou criar emendas.

"Você aprovava uma coisa no Ministério da Fazenda e aí ia pro Congresso. Quando o pessoal no Congresso percebia que tinha interesse das empresas por trás, você sempre tinha que assumir um compromisso", disse.

O mais citado

Entre os delatores da Odebrecht, o nome mais citado como negociante de MPs e propositor de emendas --com cobrança de pagamento irregular por isso-- é o senador e presidente do PMDB, Romero Jucá (RR).

Um dos exemplos que chama a atenção é a MP 627, de 2013, que alterou tributação sobre lucro de empresas brasileiras no exterior e foi convertida na lei 12.973, de 13 de maio de 2014. Ela teve 516 emendas de parlamentares --12 delas do senador Jucá. Na MP 651 --o chamado "pacote de bondades", com alterações no mercado financeiro-- foram 21 emendas apresentadas pelo senador: quatro delas supostamente a pedido da Odebrecht.

"O setor privado organizado se aproveita de eventuais impasses nessa negociação entre Executivo e Legislativo e faz lobby pela inclusão de emendas favoráveis a si. O fato de Romero Jucá ser disparado o parlamentar com o maior número de relatorias de MPs e ser chamado de 'Resolvedor Geral da República' pelo lobista Cláudio Melo Filho da Odebrecht diz muito sobre isso", afirma Carazza.

O senador nega as acusações e, em entrevista a uma rádio, disse que "quem fala em compra de MPs não conhece como funciona o governo e o Congresso". "A acusação sobre a compra de MPs é ridícula, tenho maior respeito pela classe empresarial, jamais faria um absurdo desses", afirmou.

Em nota enviada ao UOL por meio de sua assessoria de imprensa, Jucá afirma que, "como líder do governo ou relator de Medidas Provisórias, recebe as demandas dos deputados e senadores, de áreas governamentais, do Ministério da Fazenda, da Receita Federal, das confederações, dos setores da economia e das centrais sindicais".

"A partir daí, se discute o teor de Medidas Provisórias com todos os órgãos. Somente se leva adiante, em forma de emendas, o que é aprovado pela equipe econômica, pois, se não há aprovação das áreas econômicas dos governos, as mesmas são vetadas, uma vez que o presidente da República é quem sanciona qualquer alteração em leis."