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"Juiz não tem tempo para perder", diz Moro em novo embate com defesa de Lula

Mirthyani Bezerra

Do UOL, em São Paulo

14/06/2017 11h54

O juiz federal Sergio Moro, o advogado de defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, Cristiano Zanin Martins, e a representante do MPF (Ministério Público Federal) Isabel Groba bateram boca durante depoimento de testemunhas da defesa no processo que diz respeito à compra de um terreno, pela Odebrecht, que seria destinado à construção de uma nova sede para o Instituto Lula. Os procuradores também incluem nessa denúncia a compra de um apartamento vizinho ao local onde o petista mora, em São Bernardo do Campo (SP).

Moro interrompeu uma pergunta que estava sendo feita por Zanin ao ex-diretor da Polícia Federal Luiz Fernando Corrêa, afirmando que todos os questionamentos já haviam sido feitos em depoimento anterior.

Corrêa já havia prestado depoimento ao juiz federal responsável pelos processos da Operação Lava Jato na 13ª Vara Federal de Curitiba, na ação penal sobre o tríplex do Guarujá. Como o conteúdo também é usado na ação do terreno, ele foi arrolado novamente pela defesa para prestar esclarecimentos complementares.

“Vou interromper um minutinho porque essas perguntas foram feitas no depoimento anterior. Não estamos aproveitando na prática”, disse Moro.

No momento, Zanin questionava Corrêa sobre o aprimoramento nos mecanismos de combate à corrupção no tempo em que ele foi diretor da Polícia Federal, no segundo mandato do governo Lula.

O advogado disse que já estava concluindo e afirmou que o Ministério Público Federal também havia arrolado testemunhas comuns dos dois processos e que, segundo ele, “teve a oportunidade de reforçar alguns pontos”. “O Ministério Público também, notadamente em relação aos delatores, reforçou e repetiu as mesmas perguntas”, disse.

A representante do MPF presente na oitiva repreendeu Zanin ao dizer que a afirmação era “inverídica”. “O senhor está fazendo referência ao Ministério Público inverídica. O Ministério Público fez perguntas efetivamente complementares. Então, por favor, o senhor faça referências ao Ministério Público que correspondam com a realidade dos fatos”, afirmou.

Moro perguntou se Zanin tinha novas perguntas para a testemunha ou se eles estavam ali “perdendo tempo”. Zanin respondeu: “Vossa excelência acha sempre que tudo o que a defesa fala é uma perda de tempo.”

“O juiz não tem tempo para ficar perdendo”, concluiu Moro.

Zanin fez sua última pergunta ao ex-diretor geral da PF, questionando se ele conhecia Nestor Cerveró, Paulo Roberto Costa e Renato Duque, e também concluiu a oitiva.

Ao final, o juiz federal se desculpou com a testemunha. “Peço desculpas por esse debate aqui, mas realmente são perguntas que já foram perguntadas. Nós convencionamos que iriamos aproveitar e não faz sentido ficar indagando essas coisas novamente”, disse.

Correa foi a última testemunha a ser ouvida na manhã desta quarta (14). Antes dele, foram ouvidos dois ex-procuradores-gerais da República, Claudio Fonteles e Antonio de Sousa. O deputado federal Henrique Fontana (PT-PR) também tinha depoimento marcado, mas informou à Vara que não havia recebido a confirmação da oitiva. O depoimento foi remarcado para a próxima terça-feira (20), às 9h30.

Todas as testemunhas fazem parte das mais de 80 indicadas pela defesa para serem ouvidas no processo sobre a compra do terreno.

Em nota, Zanin afirmou que “o cerceamento ao direito de defesa e o desrespeito à atuação dos advogados mais uma vez se fez presente”. “A realidade é que o juízo impediu a defesa de reforçar aspectos relevantes, que desmentem o cenário de ‘corrupção sistêmica’ afirmado pelo MPF”.

Concluiu afirmando ser “lamentável que o juízo recorra a tais expedientes e, junto com a representante do MPF manifeste comportamento tão desrespeitoso à defesa”. “Mais uma vez se atenta contra as prerrogativas profissionais, à participação do advogado na administração da Justiça, e as regras internacionais da magistratura, dos procuradores e dos advogados. Tal conduta fere igualmente as garantias fundamentais do ex-presidente Lula”, diz a nota.

Entenda o caso

A denúncia do MPF acusa Lula pelos crimes de corrupção passiva e lavagem de dinheiro em contratos firmados entre a Petrobras e a Odebrecht. Segundo os procuradores, o ex-presidente teria recebido propina da empreiteira por intermédio do ex-ministro da Fazenda Antonio Palocci --também réu na ação, junto a Marcelo Odebrecht e a outras cinco pessoas.

O MPF afirma que parte do dinheiro foi usada para comprar um terreno, que seria usado para a construção de uma sede do Instituto Lula (R$ 12,4 milhões).

A denúncia diz ainda que o dinheiro de propina também foi usado para comprar um apartamento vizinho à cobertura onde mora o ex-presidente, em São Bernardo do Campo (SP), que é alugado pela família de Lula. Na avaliação dos investigadores, a operação foi realizada para ocultar o verdadeiro dono do apartamento, que seria Lula.

No total, R$ 75 milhões teriam sido desviados da Petrobras por meio de oito contratos da Odebrecht com a estatal, de acordo com a força-tarefa. Parte do valor teria sido repassada a partidos e agentes políticos que apoiavam o governo Lula, principalmente PP, PT e PMDB. O ex-presidente foi apontado como o "responsável por comandar uma sofisticada estrutura ilícita para captação de apoio parlamentar, assentada na distribuição de cargos públicos na administração federal".

A defesa de Lula afirma que ele aluga o apartamento vizinho ao seu. Além disso, acrescentou que o Instituto Lula funciona no mesmo local há anos e que o petista nunca foi proprietário do terreno em questão. A transação seria um "delírio acusatório", complementam os advogados.