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Cabral admite conta em NY com US$ 2 mi e se diz perseguido: 'Não matei Odete Roitman'

FÁBIO MOTTA/ESTADÃO CONTEÚDO
Imagem: FÁBIO MOTTA/ESTADÃO CONTEÚDO

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

12/07/2017 18h33Atualizada em 12/07/2017 21h22

O ex-governador do Rio de Janeiro, Sérgio Cabral (PMDB), admitiu nesta quarta-feira (12), em depoimento à 7ª Vara Criminal da Justiça Federal, que manteve entre 1995 e 2003 uma conta nos Estados Unidos batizada de "Eficiência" com cerca US$ 2 milhões --os recursos, segundo ele, seriam fruto de caixa dois durante campanhas eleitorais.

Ele classificou como "absurda" acusação de que os doleiros Marcelo e Renato Chebar movimentaram US$ 120 milhões em seu nome no exterior.

Diferentemente dos primeiros depoimentos, em que respondeu somente a perguntas formuladas pela sua defesa, nesta quarta Cabral fez questão de falar e passou cerca de duas horas respondendo as questões do juiz Marcelo Bretas e do Ministério Público.
 
Leon, pai dos irmãos Chebar, já falecido, foi apresentado a Cabral por sua mulher, que era secretária dele. "Após algum nível de relação, no final dos anos 90 ele [Leon] já prestava serviço de caixa dois de campanha eleitoral", disse. Foi o doleiro que sugeriu que ele abrisse uma conta no exterior, no Israel Discount Bank em Nova York.

"Foram cerca de US$ 2 milhões que arrecadei para campanhas, sobras de campanha."

Ele contou que, em 2003, procurou Renato Chebar após o escândalo do Propinoduto (recebimento de propinas por fiscais de impostos do Estado, que tinham contas ilegais no exterior). "Quando ocorreu esse caso, era senador da República. Procurei Renato. Disse que estava incomodado com a conta no exterior".

O ex-governador disse que nunca mais teve conta no exterior a partir de 2003.

Questionado sobre as operações em dólar cabo e os US$ 120 milhões que os irmãos Chebar disseram que movimentaram em seu nome no exterior, o ex-governador disse que as afirmações são um "absurdo".

Cabral comentou que viu os depoimentos dos irmãos Chebar pela televisão no presídio e ficou surpreso. "Uso o princípio da razoabilidade. Imagine se eu ia deixar US$ 120 milhões na mão de alguém, sem um documento, sem meu nome?"

Bretas lembrou que o "dinheiro apareceu", ao que Cabral rebateu que eles mentiram. "Fico feliz que o dinheiro tenha sido repatriado, mas não sei que dinheiro é esse." Cabral disse nunca ter visto Marcelo e ter encontrado Renato poucas vezes.

"Não tenho nada a ver com esses recursos [no exterior]. Pior do que a mentira é a verossimilhança. O desespero da prisão tem levado às pessoas a contarem mentiras. O que os irmãos Chebar contaram é verossímil", afirmou.

Frente à resposta do ex-governador, o juiz reiterou o fato de que várias empresas e pessoas diferentes citam Cabral em situações diversas: "Todo mundo se juntou para perseguir Sérgio Cabral?". Ao que o governador afirmou que várias pessoas estão usando-no como culpado.
 
"Eu não matei Odete Rotteiman", disse em referência à vilã interpretada pela atriz Beatriz Segal na novela "Vale Tudo". "Não há dúvidas de que há malfeitos sendo colocados nas minhas costas", acrescentou.

"Não vivi do meu salário"

Ele confirmou ter comprado joias no exterior uma vez, mas disse que sua esposa nunca soube e que foi um presente. "Ninguém lava dinheiro comprando joias, carros. Isso perde o valor assim que sai da loja." Como no depoimento da segunda passada, ele reiterou ter feito uso de caixa dois. "Cometi um erro."

Ainda sobre o uso de caixa dois, o ex-governador comentou que essa é uma prática comum na política: "Eu não vivi do meu salário".

Segundo ele, há "cinismo" na forma como é feita a arrecadação de campanha eleitoral. Cabral citou os EUA como exemplo. "Nunca fui parcial com nenhum empresário por me ajudar em nenhuma campanha."

Cabral refutou acusações de que teria favorecido a Fetranspor, sindicato que reúne empresas de transporte, e de que teria recebido pagamentos ao reajustar tarifas de ônibus intermunicipal. Ele elencou fatos, como a lei da gratuidade para idosos e estudantes nos ônibus e barcas, de sua autoria, a ampliação da malha de metrô, entre outras obras, como momentos em que contrariou as empresas de ônibus.

"Que houve ajuda de campanha, houve. Mas essa história de tarifas não é verdade", afirmou. "São fatos."

Bretas o questionou ainda sobre os valores citados por seu assessor, Luiz Carlos Bezerra, que relatou em depoimento um elaborado sistema de pagamento de propinas para o ex-governador. "Esses valores [relatados por Bezerra] não procedem", afirmou. "A contabilidade de Bezerra é digna de psiquiatria."

O juiz começou a audiência de Cabral alertando sobre a importância de "manter um bom nível de relacionamento" ao se referir a afirmação do ex-governador na última segunda-feira (10), quando ele chamou de "maluquice" acusação de que recebia 5% de propina sobre contratos com o governo. Cabral disse que era apenas uma forma de se opor a uma colocação que via como mentirosa e pediu se poderia tomar um café, já que estava há cinco horas esperando para depor.

Adriana diz desconhecer contas no exterior

Em prisão domiciliar desde o fim de março, a ex-primeira-dama do Rio Adriana Ancelmo também prestou depoimento nesta quarta. Ela disse desconhecer que Cabral tivesse contas no exterior. "Nunca soube", afirmou ao ser questionado pelo juiz.

Ela também afirmou que era responsável por todas as despesas de sua casa e que sempre foi responsável pelo pagamento de suas contas pessoais.

Antes de Adriana, a Justiça ouviu seu sócio, Thiago de Aragão, preso desde janeiro por supostamente ter recebido dinheiro em espécie proveniente de propinas do esquema de Cabral entregues a ele pelo operador Carlos Bezerra.