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Moro suspende benefícios a ex-diretor da Petrobras após críticas da Lava Jato

Duque já foi condenado por Moro em cinco processos na Operação Lava Jato - 19.mar.2015 - Sergio Lima/Folhapress
Duque já foi condenado por Moro em cinco processos na Operação Lava Jato Imagem: 19.mar.2015 - Sergio Lima/Folhapress

Nathan Lopes

Do UOL, em São Paulo

13/07/2017 10h07

O juiz Sergio Moro, responsável pela Operação Lava Jato em primeira instância, suspendeu os benefícios que concedeu ao ex-diretor da Petrobras Renato Duque até que o TRF (Tribunal Regional Federal) da 4ª Região, a segunda instância, analise a questão. O MPF (Ministério Público Federal) foi contra a medida do magistrado, classificada como “equívoco”, e disse que a sentença carregou vícios de “omissão e contradição”.

O despacho de Moro foi publicado no fim da tarde de quarta-feira (12), cerca de quatro horas após o juiz ter proferido a sentença em que condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) a nove anos e seis meses de prisão.

No último dia 26 de junho, Duque foi condenado por Moro a cinco anos e quatro meses de reclusão em regime fechado pelo crime de corrupção passiva. No processo sobre corrupção em contratos entre a empreiteira Odebrecht e a Petrobras também foi sentenciado à prisão o ex-ministro Antonio Palocci.

Mas o juiz considerou que o ex-diretor “prestou algumas informações relevantes sobre o esquema criminoso por parte de terceiros” e lembrou que Duque abriu mão de “qualquer direito” sobre contas secretas no exterior com saldo de mais de 20 milhões de euros.

“Nessas condições e na incerteza que haverá viabilidade de um acordo [de colaboração], é o caso de algum reconhecimento do valor da colaboração do condenado e da concessão de algum benefício”, disse Moro na sentença, que pontuou que a colaboração foi tardia.

O magistrado, então, avaliou que era “o caso de não impor ao condenado a completa devolução do produto do crime, mas apenas daqueles valores em sua posse, como os mantidos em contas no exterior ou convertidos em bens no Brasil, e admitir a progressão de regime de cumprimento de pena depois do cumprimento de cinco anos no regime fechado”. “Isso independentemente do total de pena somada, o que exigiria mais tempo de cumprimento de pena”.

Duque, que está preso desde março de 2015, foi condenado em outros quatro processos na Lava Jato. Somadas, as penas dessas condenações chegam a mais de 57 anos de prisão.

Moro havia sugerido que o benefício que concedeu na última sentença deveria “ser estendido às penas unificadas nos demais processos”. Ele também ficaria “condicionado à continuidade da colaboração, apenas com a verdade dos fatos, e a renúncia pelo condenado a todos os bens provenientes do crime”.

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Contradições

O MPF disse que a sentença de Moro, “de um lado, aponta a ausência dos requisitos legais para a celebração de acordo e concessão dos respectivos benefícios”. “Embora de outro, termine por conceder, de ofício, os efeitos daquele benefício”.

A crítica da força-tarefa da Lava Jato explica-se pelo fato de que os acordos de colaboração precisam ser firmados com o MPF, que avalia os benefícios que devem ser concedidos. Moro, porém, ofereceu uma pena mais branda em função de uma incerteza de que houvesse “viabilidade de um acordo”.

A procuradoria diz que não firmou acordo de colaboração com o ex-diretor da Petrobras por não ter “vislumbrado presença de interesse público em firmar tal compromisso”. “A conduta do embargado [Duque] nunca se mostrou colaborativa. Ao contrário, sempre buscou, legitimamente, contestar as acusações formuladas, utilizando-se, para tanto, dos meios processuais existentes”, disseram os procuradores em embargos de declaração a Moro, documento em que fazem avaliações sobre a sentença de Moro.

O juiz, porém, diz que não existiu “contradição na concessão do benefício”. “Houve colaboração, mas foi ela limitada. Daí o benefício também limitado, com a exigência de que o condenado cumpra pelo menos cinco anos de prisão em regime fechado, antes da progressão”, disse Moro ao acolher os embargos de declaração do MPF.

Para o MPF, “as informações apresentadas por Renato Duque nada acrescentam, de modo que sequer poderiam configurar confissão tardia, quanto muito para fins de incidência da atenuante, e muito menos poderiam atrair benefícios do instituto da colaboração premiada”. “Sua pretensa colaboração não foi tempestiva, não se prestou a reparação do dano, não revelou fatos que sabia e que ainda não eram do conhecimento do Ministério Público Federal”.

Os procuradores ainda lembram que os saldos de contas ligadas a Duque estão “bloqueados por determinação judicial há bastante tempo” e que os benefícios jamais poderiam atingir as penas determinadas nos outros processos. “Ao juízo é vedado inovar no feito, sob pena de subversão do sistema processual, dado que a prestação jurisdicional há de ser certa, determinada, não sujeita a modificações, senão pela via dos instrumentos legalmente previstos, no caso, do recurso de apelação”.

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Moro rebate

O magistrado, porém, afirma que “de nada adianta conceder o benefício isolado, reduzindo ou mesmo perdoando a pena neste feito, quanto ele já está condenado a penas elevadas em outros processos”. “Questões novas demandam soluções novas e é muito mais apropriado que o Juízo das ações penais resolva essas questões do que o Juízo da Execução, a quem caberia a unificação das penas, visto que ele, apesar de sua qualidade profissional, não acompanhou os casos penais e não conhece com profundidade a culpabilidade ou a relevância da colaboração para os casos julgados.

Moro diz que, “apesar da irresignação do MPF”, o benefício dado a Duque é “bem mais limitado do que tem sido corrente em acordos de colaboração por ele celebrados com outros criminosos colaboradores”. “Observo ainda que a existência ou não de um acordo de colaboração não é absolutamente necessária para a concessão de benefícios”.

O juiz ainda apontou que os procuradores concederam “benefícios de colaboração” ao ex-presidente da OAS Léo Pinheiro e ao ex-executivo da empreiteira Agenor Franklin de Magalhães, condenados na quarta-feira junto com o ex-presidente Lula, “sem que houvesse um acordo de colaboração, a ilustrar que ele não é absolutamente necessário”.

“Questões novas demandam soluções novas e é muito mais apropriado que o juízo das ações penais resolva essas questões do que o juízo da execução, a quem caberia a unificação das penas, visto que ele, apesar de sua qualidade profissional, não acompanhou os casos penais e não conhece com profundidade a culpabilidade ou a relevância da colaboração para os casos julgados”, avalia Moro.

O UOL ainda não conseguiu contato com a defesa de Renato Duque a respeito da suspensão do benefício. Nas alegações finais da ação penal, os advogados de Duque disseram que seu cliente deu contribuição "fundamental" e "deve ser considerada como um verdadeiro divisor de águas para as investigações".

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