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Em ato pró-Lula, manifestantes e políticos discursam contra Temer e Moro

Bernardo Barbosa

Do UOL, em São Paulo

20/07/2017 18h59Atualizada em 20/07/2017 21h52

Milhares de manifestantes --a Polícia Militar não divulgou estimativa de público-- se reuniram na noite desta quinta-feira (20) na avenida Paulista, região central de São Paulo, para participar de ato em defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). O petista foi o último a discursar no evento, o seu primeiro nas ruas desde sua condenação a 9 anos e meio de prisão pelo juiz Sergio Moro em processo da Operação Lava Jato.

A manifestação foi convocada pelo PT e por sindicatos e movimentos sociais. O ato tem a presença de militantes de partidos como o PCdoB e o PCO. Também compareceram representantes de centrais sindicais como CUT, CTB e UGT, assim como de movimentos sociais como o MST e o MTST. Devido ao ato, os dois sentidos da avenida Paulista estão interditados por agentes da CET.

O reencontro de Lula com a militância nas ruas teve forte tom de campanha. Políticos, sindicalistas, representantes de movimentos sociais e artistas defenderam que o petista possa se candidatar nas próximas eleições presidenciais e chegar a seu terceiro mandato.

Lula chegou à Paulista por volta das 19h30 e iniciou seu discurso cerca de uma hora depois. O ex-presidente foi recebido com gritos de "Lula guerreiro do povo brasileiro".

"O problema deste país não é o Lula, é o golpe", bradou o ex-presidente no início de sua fala. E pediu para que seus apoiadores não se preocupem com ele. "A gente tem que se preocupar nesse momento é com o que está acontecendo com o país e o povo brasileiro".

Em grande parte de seu discurso, Lula atacou as reformas propostas pelo governo Temer: tanto a trabalhista, já sancionada, quando a da Previdência.

"Esse país só vai ser consertado quando a gente tiver um governo que não pense só para meia dúzia de ricos. Quando o pobre é incluído no mercado de trabalho e no orçamento da União, não tem jeito, a economia vai crescer", disse o petista. "Talvez o que mate eles de ódio é saber que uma empregada doméstica tem direito a um salário mínimo e férias, que o cara que trabalha como jardineiro pode comprar um carro. O que incomoda algumas pessoas nesse país é saber que os de baixo podem subir um degrau na escada social desse país. O que incomoda é vocês terem aprendido a conquistar direitos".

Do alto do trio elétrico montado para os discursos, estacionado na altura do Masp (Museu de Arte de São Paulo), militantes e políticos discursaram em defesa de Lula e contra o governo de Michel Temer (PMDB) e as reformas trabalhista e da Presidência. Os manifestantes também protestam pela imediata realização de eleições diretas e fazem duras críticas ao juiz Sergio Moro e à imprensa, especialmente a Rede Globo.

Entre outros políticos, estiveram presentes os senadores Lindbergh Farias (PT-RJ) e Gleisi Hoffman (PT-PR), presidente do partido, o ex-prefeito de São Paulo Fernando Haddad e o ex-presidente do PT, Rui Falcão.

Um dos primeiros a falar ao microfone, Lindbergh Farias chamou Moro de "fantoche da Globo".

"Sergio Moro, você é um covarde. Ser juiz não é isso. Juiz é imparcial. Sergio Moro, você é um fantoche da rede Globo. Quero ver você ter coragem de bloquear o dinheiro do Aécio", bradou o senador, que ainda discursou contra o presidente Temer e o prefeito de São Paulo, João Doria (PSDB-SP), apontado como possível candidato à Presidência e ferrenho crítico de Lula.

"O Temer é um poste. Quem está no comando é o grande capital, a burguesia brasileira, a turma do pato amarelo", discursou. "Vocês estão vendo em todo o país o aumento do número de pessoas dormindo nas ruas. E aqui em São Paulo, ainda tem esse fascista do Doria jogando água em cima de morador de rua", disse Lindbergh, referindo-se a matéria da Rádio CBN que denunciava que agentes da Prefeitura teriam acordado moradores de rua na quarta-feira com jatos d'água.

Gleisi Hoffmann também criticou Moro e o poder judiciário. "O Moro ganhou em um ano o que o presidente Lula economizou em toda a vida. Aí a gente entende o ódio de classes nesse país", afirmou. "Condenam Lula e tiram da prisão o Geddel [Vieira Lima, ex-ministro]. Tiram da prisão Rodrigo Rocha Loures [ex-assessor de Michel Temer]".

Ex-ministro do Esporte no governo Lula, Orlando Silva (PCdoB) fez uma defesa enfática das eleições diretas e da presença de Lula na corrida presidencial de 2018.

"As elites brasileiras não aceitaram a vontade do povo nas urnas em 2014", disse. "A defesa da democracia tem um nome. E o nome da democracia no Brasil é Luiz Inácio Lula da Silva. O crime de Lula foi tirar milhões de brasileiros da pobreza."

Guilherme Boulos, coordenador do MTST (Movimento dos Trabalhadores Sem-Teto), atacou a reforma trabalhista, sancionada por Michel Temer na semana passada. "Viemos aqui repudiar a reforma trabalhista infame aprovada pelo Senado. Nem sequer a ditadura militar, em 21 anos, botou as garras na CLT", disse ele.

"Mexeu com ele, mexeu comigo"

O ato em São Paulo reúne manifestantes de várias idades, todos em apoio ao ex-presidente e com direito a cânticos como "O Lula é meu amigo, mexeu com ele, mexeu comigo".

"Confio no Lula e acho que ele é inocente", afirmou à Folha o padeiro Valdimar Gregorio, 38, vestido de verde e amarelo, justificando que hoje tem casa e carro graças ao ex-presidente. Já a professora Mariana Prates, 29, ressaltou que se formou pelo Prouni, criado nos governos petistas, e disse que Lula e a ex-presidente Dilma Rousseff foram os que mais olharam para as causas sociais.

Participantes do ato estenderam uma enorme faixa com a frase "Eleição sem Lula é fraude" -- se condenado em segunda instância, o petista ficaria inelegível segundo a Lei da Ficha Limpa, mas poderia recorrer da decisão.

O presidente da NCST (Nova Central Sindical dos Trabalhadores) em São Paulo, Luiz Gonçalves, defendeu a formação de uma nova aliança política "melhor" do que as feitas nos governos Lula e Dilma. "Temos que fazer uma aliança sem golpista", disse Gonçalves.

O PT e seus aliados classificam o impeachment da ex-presidente Dilma Rousseff como "golpe". Após a saída da petista, parte dos partidos que formavam a base dos governos Lula e Dilma aderiu ao governo Temer, principalmente os do chamado "centrão".

O presidente da CUT, Vagner Freitas, aproveitou a oportunidade para convocar a militância a ir para Curitiba, no dia 13 de setembro, para quando está marcado o segundo depoimento de Lula a Sergio Moro, esse referente à ação que investiga se a Odebrecht teria participado da compra de uma nova sede para o Instituto Lula.

"Cada vez que eles violentam o Lula, é porque ele tem a cara de cada um de vocês", disse Freitas para os manifestantes. "É a cara de quem acha que o Brasil é para todos, e não para alguns. Nós vamos eleger o Lula para retomar os direitos dos trabalhadores. Sem Lula, não é eleição. Sem Lula, é fraude".

Lula condenado

Lula foi condenado a uma pena de nove anos e meio de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro por ter recebido um tríplex no Guarujá (SP) da construtora OAS como parte do esquema de corrupção na Petrobras. A decisão foi do juiz Sergio Moro, responsável pelos processos da Operação Lava Jato na Justiça Federal do Paraná.

Depois, Moro também ordenou o bloqueio de contas de Lula e o sequestro de seus bens como forma de ressarcir a Petrobras. Nesta quinta-feira (20), foram bloqueados ainda pouco mais de R$ 9 milhões que estavam em planos de previdência privada no nome do ex-presidente e no da empresa que administra os pagamentos de suas palestras.

A defesa de Lula nega que haja provas de crimes do ex-presidente. O petista recorre às decisões de Moro em liberdade.

Mais Lava Jato

A ação penal conhecida como o "processo do tríplex", em que Lula foi condenado, chegou ao fim na primeira instância, mas Lula e Moro deverão se encontrar em uma nova oportunidade ainda este ano.

O ex-presidente é réu em um segundo processo na Justiça Federal no Paraná. Ele é acusado de participar de um esquema de corrupção envolvendo oito contratos entre a empreiteira Odebrecht e a Petrobras. Ele será interrogado por Moro em 13 de setembro.

Lula pode se tornar réu ainda em um terceiro processo com Moro na Lava Jato. O MPF ofereceu, em 22 de maio, uma nova denúncia contra Lula, acusando-o, mais uma vez, de corrupção passiva e lavagem de dinheiro.

Desta vez, os crimes envolvem um sítio em Atibaia (SP). Segundo os procuradores, o imóvel passou por reformas custeadas pelas empresas Odebrecht, OAS e Schahin em benefício do petista e de sua família. Em troca, os três grupos teriam sido favorecidos em contratos com a Petrobras.

Moro ainda não decidiu se acolhe ou não os novos argumentos da força-tarefa da Lava Jato.