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Após anistia de R$ 8,6 bilhões, 2/3 da bancada ruralista votam a favor de Temer

Temer concedeu anistia que pode chegar a R$ 8,6 bilhões a produtores rurais  - Marcelo Camargo/Agência Brasil
Temer concedeu anistia que pode chegar a R$ 8,6 bilhões a produtores rurais Imagem: Marcelo Camargo/Agência Brasil

Leandro Prazeres e Aiuri Rebello

Do UOL, em Brasília

03/08/2017 19h36Atualizada em 03/08/2017 20h16

Um dia depois de conceder uma anistia que pode chegar a R$ 8,6 bilhões em três anos a produtores rurais, dois terços da bancada ruralista na Câmara dos Deputados votaram pela suspensão da denúncia feita pela PGR (Procuradoria-Geral da República) contra o presidente Michel Temer (PMDB). Dos 195 deputados em exercício que integram a bancada, 130 votaram pela suspensão da denúncia. O número é quase a metade dos 263 votos que Temer conseguiu na votação. Temer foi denunciado por corrupção passiva pela PGR em junho deste ano. 

A procuradoria sustenta que Temer se beneficiou do pagamento de propina feito por executivos da J&F, controladora da JBS, em troca de benefícios em contratos com a Petrobras. O presidente nega as acusações. Na última quarta-feira (2), a Câmara dos Deputados aprovou, por 263 votos a 225 a suspensão da denúncia. Dessa forma, Temer só deverá responder pela denúncia quando deixar a Presidência. 

A bancada ruralista é uma das mais fortes do Congresso Nacional e vinha se mantendo firme no apoio ao governo desde que Temer assumiu a Presidência em maio de 2016, quando a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) foi afastada temporariamente, durante o processo de impeachment.

No dia anterior à votação da denúncia, 1º de agosto, Temer foi recebido em um almoço promovido pela FPA (Frente Parlamentar da Agropecuária), que congrega os integrantes da chamada bancada ruralista.

No mesmo dia, foi publicada uma MP (Medida Provisória), enviada pelo governo ao Congresso Nacional, que reduz a alíquota de arrecadação paga por produtores rurais ao Funrural (Fundo de Assistência ao Trabalhador Rural), usado para ajudar no pagamento das aposentadorias de trabalhadores rurais.

Além da redução da alíquota de contribuição, a MP prevê ainda o perdão do pagamento de juros de dívidas atrasadas.

Apenas com o perdão de encargos, multas e juros, o governo deverá perder uma arrecadação de R$ 7,6 bilhões. A Receita Federal estima que, além desse valor, o governo deva abrir mão de aproximadamente R$ 1,07 bilhão em arrecadação por conta da redução da alíquota que deveria ser paga pelos produtores rurais de 2018, quando a nova porcentagem entra em vigor, até 2020.

A MP parece ter atendido a parte das expectativas da bancada. Dos 195 deputados em exercício que pertencem ao grupo, 130 votaram pela suspensão da denúncia. Do restante, 53 deputados votaram contra Temer. Onze parlamentares deixaram de comparecer à votação e um se absteve.

A MP enviada pelo governo era um pleito da bancada ruralista e foi vista por setores da oposição como mais uma manobra de Temer para impedir o prosseguimento da denúncia ao STF (Supremo Tribunal Federal).

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Produtores rurais terão anistia de parte de suas dívidas com a Previdência
Imagem: Fernando Bizerra Jr./EFE

Além da MP do Funrural, a oposição apontou a liberação de emendas parlamentares como uma espécie de moeda de troca para que o governo obtivesse os votos necessários para barrar a denúncia. O governo negou a relação entre a liberação das emendas e a votação da última terça-feira. 

Curiosamente, deputados da bancada ruralistas mencionaram os supostos benefícios dados pelo governo Temer ao setor como justificativa para votar pela suspensão da denúncia contra o presidente.

Foi o caso de Dilceu Sperafico (PP-PR), que, ao declarar seu voto, não citou a denúncia em si. “Pelo bem do Brasil, pelo bem da agricultura e pelas reformas, voto ‘sim’”, disse Sperafico.

Outro que também mencionou a agricultura em seu voto foi o deputado Valdir Colatto (PMDB-SC), um dos diretores nacionais da FPA.

“Em homenagem a quem trabalha, produz e gera emprego; em homenagem àqueles que respeitam a agricultura brasileira, que segura este Brasil em pé: sim”, declarou Colatto.

Outro lado

Em nota, a FPA afirma que é uma entidade associativa que defende interesses comuns, suprapartidária e que não influencia em votações no Congresso Nacional.

“A MP do Funrural está em debate há mais de dez anos”, afirma a FPA. “Vale ressaltar que existe um histórico de 15 mil ações em tramitação no Judiciário brasileiro que questionam o pagamento do fundo e receberam, em 2011, como resposta do Supremo Tribunal Federal, uma liminar favorável à suspensão da contribuição. Portanto, muitas cooperativas, do Paraná e de Santa Catarina, por exemplo, não recolhem a contribuição desde então”, diz um trecho da nota. 

A FPA diz também que a MP do Funrural não atendeu aos pleitos do setor. “A única pauta da FPA atendida pela MP do Funrural, de fato, foi a diminuição da alíquota de contribuição de 2,3% para 1,5% sobre a produção, a partir de janeiro de 2018. (…) A FPA não acredita em renúncia de uma receita que estava suspensa por liminar e que, portanto, não era devida. A pergunta que o setor sempre fez à Justiça é sobre o por que de não poder arrecadar para a Previdência a partir do número de funcionários como todas as outras áreas fazem", diz outro trecho da resposta. 

“A partir do advento das novas tecnologias agrícolas, houve aumento significativo da produtividade e diminuição da necessidade de mão de obra. A alíquota de 2,3% sobre a produção bruta tornou-se absurdamente alta em relação ao trabalhador urbano”, afirma a resposta enviada ao UOL. Por fim, a entidade posiciona-se contra o afastamento do presidente Michel Temer, por entender que isto traria mais turbulência econômica e política ao país.

Procurado, o Palácio do Planalto disse que as alterações previstas pela MP "não afetam a meta de resultado primária para o ano de 2017 e obedecem ao Plano Plurianual para o período de 2016 a 2019" e que "não foi identificado risco de natureza jurídica capaz de interferir na efetivação dos objetivos da proposta". Questionado sobre se a edição da MP teria tido influência na votação da última terça-feira, o Palácio do Planalto não se manifestou.