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Quem é o "braço direito" de Geddel preso pela Polícia Federal?

Geddel Vieira Lima e Gustavo Ferraz, durante festa de Iemanjá em Salvador, em 2014 - Reprodução/Facebook
Geddel Vieira Lima e Gustavo Ferraz, durante festa de Iemanjá em Salvador, em 2014 Imagem: Reprodução/Facebook

Flávio Costa

Do UOL, em São Paulo

09/09/2017 04h00

"Eu costumo dizer que na vida nós não escolhemos nossos pais. Mas nós escolhemos a comida, os amigos, a mulher, a religião e a cidade para viver e para morrer", afirmou, certa vez, o advogado Gustavo Pedreira do Couto Ferraz, 47, preso pela PF (Polícia Federal) nesta sexta-feira (8) durante a 4ª fase da Operação Cui Bono.

Há quase uma década, a escolha pela amizade do ex-ministro Geddel Vieira Lima e de seu irmão, o deputado federal Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), levou Ferraz a assumir cargos públicos na Bahia e a se tornar uma espécie de "braço direito" da dupla.

"O nível de confiança que Geddel tem com Gustavo, ele só tem com o irmão Lúcio", afirmou ao UOL uma fonte próxima aos dois, sob a condição de sigilo.

Casado, pai de uma filha, torcedor do Vitória, formado pela UFBA (Universidade Federal da Bahia), Gustavo Ferraz é um advogado de discreta atuação jurídica --trabalhou em apenas três processos nos anos 1990, de acordo com pesquisa feita pela reportagem no sistema do TJ-BA (Tribunal de Justiça da Bahia).

Ferraz foi filiado ao PT, na época de estudante no final dos anos 1980, quando foi presidente de diretório acadêmico da Faculdade de Direito da UFBA. Depois, militou pelo PSB. Em 2009, filiou-se ao PMDB.

"Geddel se preparou durante a vida e a política foi sua universidade", afirmou Ferraz, sobre o aliado. "A visão que eu tenho de mundo, eu agradeço muito à convivência com a família Vieira Lima".

O advogado Gustavo Ferraz - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
Gustavo Ferraz (centro) e o deputado Lúcio Vieira Lima (direita) em foto de 2016
Imagem: Reprodução/Facebook

De maior relevo é a passagem dele por cargos públicos, muitas vezes a preencher a cota de indicação do PMDB baiano. Ele foi diretor de Habitação da cidade de Salvador, entre os anos de 2015 e 2016, na primeira gestão do prefeito ACM Neto (DEM).

Quando Geddel ainda era aliado do então governador Jaques Wagner (PT), Ferraz foi superintendente de Desenvolvimento Industrial e Comercial da Bahia, em 2009. Antes, ele havia dirigido a Agência do Desenvolvimento Econômico de Salvador nos anos de 2007 e 2008, durante a gestão do então prefeito João Henrique.

"Gustavo acompanhava Geddel nas viagens pela Bahia. Ele cuidava das articulações políticas, agenda e logística no interior do Estado, inclusive na campanha eleitoral de 2012", afirma a advogada e consultora política Daniele Barreto, que coordenou a assessoria de comunicação do PMDB baiano.

O último cargo público que Gustavo Ferraz ocupou, do qual foi exonerado quase imediatamente após se tornar pública sua prisão, foi o de diretor-geral da Codesal (Defesa Civil de Salvador), onde comandava um dos mais importantes projetos da gestão de ACM Neto: a "Operação Chuva", que prevê ações de prevenção e enfrentamento dos efeitos das chuvas em uma cidade que registra mais de 600 áreas de risco de desabamento ou deslizamento.

A Operação Chuva conta com investimentos de R$ 71 milhões, apenas R$ 20 milhões a mais do que a soma do dinheiro em espécie encontrada em um apartamento de um bairro de classe média alta da capital baiana e atribuído ao ex-ministro Geddel Vieira Lima. Peritos detectaram fragmentos de impressões digitais de Ferraz e Geddel nas notas descobertas no "bunker".

Preso hoje, Gustavo Ferraz (à dir.) foi indicado por ACM Neto (à esq.) - Divulgação - Divulgação
Preso nesta sexta-feira, Gustavo Ferraz (à dir.) foi nomeado por ACM Neto (à esq.)
Imagem: Divulgação

“Considerando que existem indícios de que Gustavo Ferraz também cometeu o crime atual de lavagem de capitais, relacionado a priori com os fatos antecedentes ligados a fraudes de empréstimos em que seria também auxiliar de Geddel (operação “Cui Bono”), sobretudo pela prova técnica de suas impressões digitais encontradas no material que acondicionou as notas recentemente apreendidas, também se impõe a prisão preventiva de Gustavo Ferraz, para conveniência da instrução criminal, por garantia da ordem pública e para preservar a ordem pública”, escreveu o juiz Vallisney de Souza Oliveira, titular da 10ª Vara Federal de Brasília.

Candidatura apoiada por ACM Neto e Geddel

Em 2016, Gustavo Ferraz tentou uma candidatura à Prefeitura de Lauro de Freitas, cidade da região metropolitana de Salvador e com população estimada em 197 mil habitantes, de acordo com o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística). Ele é presidente do PMDB no município. 

"Sei que não sairemos vencedores, mas Ferraz está plantando uma semente para o futuro", disse o deputado federal Lúcio Viera Lima, em fins de julho daquele ano.

Gustavo Ferraz - Reprodução/Facebook - Reprodução/Facebook
O ministro Antonio Imbassahy (à esq.) e ACM Neto (centro) participaram de atos da campanha em Lauro de Freitas, em favor da chapa de Mateus Reis e Gustavo Ferraz
Imagem: Reprodução/Facebook
Sem conseguir viabilizar seu nome, Gustavo Ferraz acabou por compor a chapa como vice do candidato Mateus Reis (PSDB).

"A decisão de escolha do vice não foi uma opção definida por mim, e sim resultado de uma aliança entre os partidos de oposição", disse Reis, em um texto publicado em uma rede social, após a notícia da prisão do ex-companheiro de chapa. "Durante a definição da chapa majoritária, houve uma busca por consenso entre a maioria da oposição que resultou na escolha de Gustavo como vice."

Como mostram fotografias publicadas em redes sociais na época da campanha, o prefeito de Salvador, ACM Neto, apoiou a chapa formada por Reis e Ferraz, em detrimento à candidatura de seu colega de partido, Chico Franco, que ficou em terceiro lugar na disputa eleitoral. "ACM Neto participou de diversos atos de campanha aqui na cidade, a exemplo de carreatas", afirma a prefeita Moema Gramacho (PT), eleita com 52,39% dos votos válidos.

Ao anunciar a exoneração de Gustavo Ferraz, a Prefeitura de Salvador afirmou, em nota, que "não compactua com nenhum ato ilícito e qualquer servidor municipal envolvido em questões dessa natureza terá que responder na Justiça".

Homem da mala em 2012

Entre 2011 e 2013, Geddel era vice-presidente de Pessoa Jurídica da Caixa Econômica Federal. A PF e o MPF (Ministério Público Federal) suspeitam que ele recebia propinas pagas por empresários em troca de facilitação ou liberação de créditos do banco público. O esquema de corrupção, que também envolveria o ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ), é objeto de investigação da Operação Cui Bono.

Durante a campanha eleitoral de 2012, o UOL apurou que Gustavo Ferraz era a pessoa encarregada por Geddel de definir quais candidatos a prefeito e vereador seriam apoiados com recursos do PMDB baiano. 

Malas de dinheiro em endereço atribuído a Geddel Vieira Lima em Salvador - Divulgação - Divulgação
Malas de dinheiro em endereço atribuído a Geddel Vieira Lima em Salvador
Imagem: Divulgação

De acordo com a PF, Ferraz seria uma pessoa ligada a Geddel que, naquele mesmo ano de 2012, teria sido indicada pelo ex-ministro para receber recursos ilícitos repassados por Altair Alves, apontado pela Operação Lava Jato como um dos operadores de Cunha.

O encontro marcado entre Ferraz e Altair teria acontecido no Hotel Clarion Faria Lima, em São Paulo. “Na ocasião desse encontro (e, ao que tudo indica, em outros), firmam o compromisso de enviar pessoas para representá-los. A pessoa indicada por Eduardo Cunha seria Altair, enquanto Geddel indicaria Gustavo. Ao constatar o registro no Hotel Clarion, percebe-se que Altair Alves Pinto ficou lá hospedado, no quarto 1302, entre os dias 5 e 6 de setembro de 2012", afirma o MPF.

"Isso sugere que o encontro entre Altair e Gustavo pode ter realmente ocorrido e pode ter havido a retirada de dinheiro em espécie por este, a mando de Geddel Vieira Lima. Assim sendo, percebe-se a real possibilidade de Gustavo ter participado e continuar a participar das atividades ilícitas atreladas a Geddel Vieira Lima.”

Outro lado

Até o momento da publicação desta reportagem, ainda não havia sido anunciado o nome do defensor que representará judicialmente Gustavo Ferraz.

Em nota, a defesa de Geddel Vieira Lima disse que ainda não teve acesso às provas colhidas pela PF nas últimas apreensões e que por isso não poderia se manifestar. “A defesa técnica de Geddel Vieira Lima informa que somente se manifestará quando, finalmente, lhe for franqueado acesso aos autos, especialmente aos documentos que são mencionados no decreto prisional.” 

O ex-ministro Geddel Vieira Lima (PMDB) foi levado para o Complexo Penitenciário da Papuda, em Brasília.

A reportagem do UOL telefonou para o deputado Lúcio Vieira Lima, para obter um posicionamento sobre o assunto, mas ele não atendeu as ligações. A reportagem também enviou mensagens de texto para o deputado, mas elas ainda não foram respondidas.