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Procuradoria rejeita delação premiada do marqueteiro Duda Mendonça

O publicitário Duda Mendonça, que tenta negociar delação premiada - Victor Moriyama/Folhapress
O publicitário Duda Mendonça, que tenta negociar delação premiada Imagem: Victor Moriyama/Folhapress

Eduardo Militão

Colaboração para o UOL, em Brasília*

14/09/2017 13h06Atualizada em 14/09/2017 15h33

A Procuradoria-Geral da República (PGR) emitiu parecer contrário à delação premiada do marqueteiro Duda Mendonça, negociada com delegados da Polícia Federal. Duda tentou, sem sucesso, um acordo com o Ministério Público no ano passado e, desde o início deste ano, tenta outro com a PF. Para que esta delação seja aceita, ela precisa da homologação do STF. Apesar de a Procuradoria ter rejeitado a proposta, o Supremo pode aceitá-la.

A opinião do Ministério Público foi enviada ao ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Edson Fachin entre junho e julho, segundo a reportagem apurou, mas está sob sigilo. Cabe ao ministro decidir se a delação será ou não homologada.

Na delação, o marqueteiro narrou pagamentos de caixa 2 da Odebrecht para a campanha do candidato Paulo Skaf (PMDB), valores que chegaram a uma produtora da família do deputado Baleia Rossi (SP), líder do PMDB na Câmara.

Na argumentação contrária à colaboração, o Ministério Público Federal diz que a celebração de acordos com a PF tira a "pressão psicológica" do investigado no chamado "dilema do prisioneiro", que é a situação em que um suspeito se sente forçado a colaborar com a Justiça pelo medo de que outro participante de um crime faça isso antes dele e, assim, não consiga obter benefícios como a redução de pena.

Interlocutores do ministro Fachin disseram ao UOL que ele pretende decidir se homologa ou não a delação de Duda só depois que o STF julgar uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin) proposta pela própria PGR no ano passado contra os acordos fechados pela polícia --época em que a PF obteve a colaboração premiada da empresária Vanessa Daniella, da agência Pepper, na Operação Acrônimo. Essa ação está sob a relatoria do ministro Marco Aurélio de Mello e aguarda para ser analisada no plenário.

Marco Aurélio confirmou que a intenção é esperar o julgamento da Adin para definir o que se fará com a colaboração de Duda e também do publicitário Marcos Valério Fernandes de Souza, que também fechou delação com a PF --o caso é relatado pelo ministro Celso de Mello.

Marcos Valério - Divulgação - Divulgação
Marcos Valério presta depoimento à Justiça
Imagem: Divulgação

"De início, a tendência que eu notei é aguardar-se a definição, porque os outros casos são concretos, envolvem o Duda Mendonça e o Marcos Valério", afirmou. "Eles devem estar esperando o julgamento dessa Adin. Temos de aguardar."

Fachin não deve levar a homologação da delação de Duda ao plenário, mas deve fazer uma questão de ordem com a Adin de Marco Aurélio. Isso, no entanto, depende de um acerto entre os ministros do Supremo.

Depoimento de Duda tratou de caixa 2 em campanhas

Um dos depoimentos de Duda à Polícia Federal durou cerca de oito horas.

Em sua delação, o marqueteiro disse que uma produtora da família de Baleia Rossi, a Ilha Produção, recebeu R$ 4 milhões em caixa 2 da empreiteira Odebrecht durante a campanha em que Paulo Skaf, o presidente da Fiesp (Federação das Indústrias do Estado de São Paulo), tentou eleger-se governador de São Paulo pelo PMDB.

Fontes com acesso à delação disseram que ele ainda teria indicado irregularidades na campanha eleitoral de 2010 e em eleições no exterior, como a Colômbia.

Também teria dado informações sobre suposto caixa 2 para os senadores Lindbergh Farias (PT-RJ) e Marta Suplicy (PMDB-SP) e para a ex-governadora Roseana Sarney (PMDB-MA). Todos os políticos têm negado quaisquer acusações de ilegalidade.

Duda tentou fechar acordo com a PGR em agosto de 2016, mas os procuradores não tiveram interesse. Com o acordo com a PF, o marqueteiro espera conseguir uma redução de suas eventuais penas ou mesmo a extinção delas, caso seja condenado. O marqueteiro é investigado por caixa 2.

MPF diz que é único responsável por fechar delações

A Lei das Organizações Criminosas (12.850/2013) permite que os acordos de colaboração premiada dos investigados sejam feitos pelo delegado de polícia, com manifestação do Ministério Público, ou apenas com a participação da Procuradoria. Mas a PGR entende que só a segunda hipótese é constitucional.

Além de "pressão psicológica" e "dilema do prisioneiro", o parecer da PGR ao ministro Edson Fachin, reitera parte dos argumentos expostos em outras ações.

Fachin - ABr - ABr
O ministro Edson Fachin é o responsável pelas decisões da Lava Jato no Supremo
Imagem: ABr

A Procuradoria diz que toda colaboração fechada pela polícia é inconstitucional porque o Ministério Público seria o titular único da "persecução penal", o ato de investigar e processar alguém.

Afirma ainda que, se a polícia fechar acordos, haveria uma "revisão" dos trabalhos e decisões dos procuradores quando eles rejeitam uma delação.

A Procuradoria não menciona na argumentação o conteúdo da colaboração premiada de Duda nem a relevância do que ele diz para eventual descoberta e punição de crimes cometidos por políticos.

Diferenças entre os acordos da PF e do MPF

A disputa entre PF e Procuradoria sobre os acordos de delação mostra duas formas de fechar o acordo.

No caso das delações lidadas com policiais, estes prometem apenas que, se a colaboração for efetiva, vão pedir ao juiz que conceda os benefícios ao investigado, da redução da pena à extinção. Isso demora para acontecer e depende do Judiciário. Em compensação, os temas abordados costumam ser específicos. 

Já no Ministério Público, os procuradores fazem um acordo em que já acertam os benefícios ao investigado, que pode começar a recebê-los antes mesmo da sentença do processo que vai descobrir se a colaboração foi efetiva ou não. Em compensação, a PGR costuma exigir muitos temas para serem abordados, a fim de ampliar o escopo e o potencial de futuras investigações.

Outro lado

Entre a assinatura do acordo e a homologação, a Procuradoria e o Supremo gastaram cerca de 20 dias no caso da JBS e 40 dias no caso da Odebrecht. Quem acompanha o caso de Duda destaca que são cinco meses sem solução para a colaboração do marqueteiro. Só na Procuradoria, foram três meses aproximadamente. 

A PGR foi questionada se usa o prazo de manifestação como estratégia processual para impedir das delações feitas com a polícia. Em resposta, afirmou que "existem diversos processos para manifestação". "Só em agosto deste ano, foram 622 manifestações, sendo 212 do grupo de trabalhão da Lava Jato, 189 da Assessoria Criminal, 88 da Assessoria Constitucional, 61 da Assessoria Cível, 36 dos processos trabalhistas, 25 da Tutela Coletiva e 11 da Assessoria Administrativa", informou a assessoria da PGR à reportagem.

Procurada pelo UOL, a defesa de Duda não quis se manifestar, assim como a Polícia Federal. A PGR disse que o processo é sigiloso e não comentaria o conteúdo além dos prazos para manifestações.

A assessoria de Baleia afirmou ao UOL que "os termos de declaração de Duda Mendonça divergem frontalmente dos depoimentos de 77 executivos da Odebrecht já homologados pelo STF". "Nesses depoimentos, não há citações sobre Baleia Rossi ou a empresa Ilha, o que, por si, já justificaria a rejeição do pedido de Duda", completou.

A Ilha Produção afirmou, em nota, que foi um dos fornecedores "que prestou serviços a campanha [de Skaf], e consequentemente, ao marqueteiro" Duda, mas que as afirmações sobre caixa dois são "absolutamente absurdas e mentirosas" e que "todos os recebimentos referentes aos serviços prestados foram devidamente registrados na prestação de contas ao Tribunal Superior Eleitoral".

A empresa também negou que o deputado ou "qualquer representante do partido" tenham "pressionado" Skaf para que contratasse a Ilha.

Em nota, o presidente da Fiesp, Paulo Skaf, disse que "todas as doações recebidas pela campanha" estão "devidamente registradas na Justiça Eleitoral, que aprovou sua prestação de contas sem fazer qualquer reparo".

* Com informações da "Folha de S.Paulo"