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Por 6 a 5, STF decide que afastamento de parlamentar precisa de aval do Congresso

Ser ou não ser Supremo? Caso Aécio desafia supremacia do STF

UOL Notícias

Gustavo Maia e Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

11/10/2017 15h19Atualizada em 12/10/2017 07h49

Por 6 votos a 5, os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) consideraram necessário o aval do Congresso para o afastamento de deputados e senadores de seus mandatos por ordem da Corte. A presidente do Supremo, Cármen Lúcia, deu o voto decisivo após empate por 5 a 5.

Acompanharam o relator Edson Fachin os ministros Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux e o decano Celso de Mello. Discordaram de Fachin os ministros Alexandre de Moraes, Marco Aurélio Mello, Gilmar Mendes, Ricardo Lewandowski, Dias Toffoli e a presidente da Corte Cármen Lúcia.

Após o voto de Cármen Lúcia, os ministros passaram a discutir a extensão das medidas cautelares impostas pelo Supremo que deveriam ser submetidas ao Legislativo.

De acordo com a decisão final, o Judiciário tem o poder de aplicar qualquer medida cautelar contra um parlamentar. Quando essa medida, porém, interferir "direta ou indiretamente" no exercício do mandato parlamentar, como no caso do afastamento, precisará do aval do Legislativo.

Na prática, a maioria do plenário decidiu que uma ordem do Supremo possa ser contestada e reformada pela maioria do Senado ou da Câmara. Agora, o Senado terá aval para reverter em votação prevista para terça-feira (17) a decisão que afastou Aécio Neves do mandato e o impediu de sair à noite.

Em sessão que durou mais de 12 horas, seis ministros votaram para que medidas cautelares como o afastamento do mandato de um parlamentar tivesse que passar pelo crivo da respectiva Casa legislativa ou fossem consideradas inaplicáveis. O relator, ministro Edson Fachin, foi acompanhado por quatro colegas no entendimento de que essas decisões judiciais não devem ser submetidas ao aval da Câmara e do Senado.

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A Adin (Ação Direta de Inconstitucionalidade) que está sendo julgada nesta quarta (11) pelo STF foi protocolada em maio do ano passado por três partidos e pede que o eventual afastamento de parlamentares por decisão judicial seja submetido em até 24 horas ao Congresso Nacional, que teria o poder de confirmar ou revogar a medida, como já ocorre nos casos de prisão em flagrante de membros do Legislativo.

A ação foi apresentada dias depois de o Supremo afastar o ex-deputado federal Eduardo Cunha (PMDB-RJ) do mandato e, consequentemente, da Presidência da Câmara, por PP, PSC e Solidariedade, que apoiavam o peemedebista.

Colocar a análise da Adin na pauta foi a solução encontrada para diminuir a temperatura da crise aberta entre o STF e o Senado depois que a 1ª Turma do Supremo afastou o senador Aécio Neves (PSDB-MG) do exercício do mandato e determinou o seu recolhimento noturno, há duas semanas. 

Os argumentos contra o relator

Segundo a votar, o ministro Alexandre de Moraes abriu a divergência com relação ao voto de Fachin. Moraes afirmou ainda que, nos processos de diversas delações premiadas, "restrição noturnas e em feriados, além do regime domiciliar, foram definidas como sanções". Na avaliação do ministro, no entanto, não é porque a "nova roupagem" as chamou de medidas cautelares que não podem ser consideradas formas de prisões.

A decisão de Moraes acolhe parcialmente o pedido dos partidos. O ministro afirmou que, se sua tese for vencida, o seu voto deve ser considerado a favor de que medidas cautelares tenham aval do Congresso em 24 horas, como pede a Adin. Moraes defendeu que a imunidade parlamentar é de "vital importância" porque busca proteger os parlamentares contra o abuso dos demais Poderes.

No entendimento do ministro, as imunidades parlamentares "não podem ser reduzidas, ignoradas, desprezadas ou interpretadas a partir de meras normas ordinárias, invertendo o que é uma garantia do Estado democrático de direito: a interpretação das leis a partir da Constituição e não a interpretação da Constituição".

"Nesse exato momento, [cito] mais ainda a importância dessa Casa do Supremo de se preocupar com o continente, não com o conteúdo, com a importância que existe no Poder Legislativo, em um Congresso Nacional forte numa democracia, e não com o conteúdo", discursou.

O ministro Marco Aurélio Mello disse entender que não cabe aplicar qualquer medida cautelar prevista no CPP (Código de Processo Penal) a parlamentares.

Antes dele, Gilmar Mendes divergiu parcialmente do voto do relator Edson Fachin e entendeu que não cabe a aplicação de medidas cautelares aos parlamentares. Isso porque a ação pode abrir a possibilidade de se aplicar a prisão provisória aos congressistas, o que não é previsto pela Constituição.

Ricardo Lewandowski entendeu que um parlamentar deve se sujeitar a afastamentos desde que haja fatos concretos que apontem gravidade em investigações de crimes comuns para a continuidade dos trabalhos judiciais. No entanto, a sanção deve ser submetida ao Legislativo para análise em até 24 horas, avaliou.

Por outro lado, Lewandovski acredita que medidas que não impliquem cerceamento da função parlamentar não precisam ser submetidas à respectiva Casa legislativa, como proibição de viagem ao exterior, retenção de passaporte ou comparecimento periódico ao juízo.

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O ministro Dias Toffoli também divergiu parcialmente do relator, ministro Edson Fachin, e afirmou que, considerando que a Constituição proíbe a prisão preventiva de parlamentares, veta também as medidas cautelares que possam interferir no exercício do mandato.

Toffoli ponderou, entretanto, que devem ser ressalvadas as situações de "superlativa excepcionalidade". Ele admite a aplicação de algumas medidas cautelares como quebra de sigilo telefônico e bancário, por exemplo.

Não dá para encaixar a realidade em três ou quatro linhas [da Constituição]. Pode surgir uma situação de superlativa excepcionalidade em que eventualmente tenha que se tomar medida cautelar mesmo que não a flagrância

Ministro Dias Toffoli

Para Toffoli, determinar afastamento dos parlamentares, no entanto, estaria fora do alcance do Supremo.

Toffoli afirma que, mesmo em casos excepcionais, a aplicação de medidas cautelares deve ser submetida à respectiva Casa legislativa. O ministro votou contra a aplicação de medidas cautelares que criem interfiram no exercício do mandato, salvo em casos de "superlativa excepcionalidade". Apesar de não ter explicado os critérios que tornariam um caso excepcionalíssimo; Toffoli citou o afastamento do ex-presidente da Câmara, Eduardo Cunha, determinado por unanimidade pelo plenário do Supremo em maio do ano passado. 

Junto ao relator, outros 3 ministros defenderam que essas decisões judiciais --como o afastamento do mandato—não devem ser submetidas ao aval da Câmara e do Senado. O ministro Alexandre de Moraes foi o segundo a votar e divergiu do relator, defendendo que não cabe à Corte sequer determinar essas sanções a parlamentares.

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Como votaram os ministros pró-relator

Em comum, Fachin, Barroso, Weber, Fux e Celso de Mello entenderam que é preciso estabelecer uma maior igualdade de tratamento a parlamentares perante a sociedade, sem estender a eles privilégios não previstos na Constituição. Para os ministros, a Constituição permite que os deputados e senadores sejam afastados do mandato sem o aval do Congresso e possam sofrer medidas restritivas de direitos, como aconteceu com Aécio Neves.

Uma das argumentações mais ressaltadas nos discursos dos magistrados foi, inclusive, a diferenciação dessas medidas – também chamadas de cautelares – de uma prisão. Eles destacaram que a imunidade parlamentar não os protege de penas como afastamento do mandato e recolhimento domiciliar.

[Restrição noturna] Não interfere na rotina funcional da vida e do trabalho da pessoa. Prisão é prisão. Quem já visitou uma, sabe o que é que é. Medida restritiva de direito é outra coisa

Ministro Barroso

Penúltimo a votar, o ministro decano Celso de Mello sustentou que o eventual controle parlamentar posterior de determinações do STF seriam "uma clara subversão da ordem constitucional".

"As decisões do STF não estão sujeitas à revisão e nem dependem, para a sua eficácia, de ratificação ou de confirmação por qualquer das Casas do Congresso Nacional [...], sob pena da subversão da ordem constitucional mediante desrespeito frontal ao postulado da separação de Poderes", declarou.

Para justificar o voto e mostrar as penas às quais estão sujeitos, Barroso chegou a exemplificar que um congressista suspeito de agredir uma mulher, pela Lei Maria da Penha, teria obrigatoriamente de manter uma distância mínima da vítima. Ou seja, não se pode conceder benefícios aos parlamentares que não seriam concedidos a cidadãos comuns.

Ao citar o processo de Aécio, Barroso argumentou que o recolhimento noturno impede a pessoa de ir para "baladas, restaurantes, recepções e eventos festivos [...] como se absolutamente nada tivesse acontecido”. Ele ainda aproveitou a oportunidade para rebater a hipótese de uma crise entre os Poderes e disse ter recebido diversos senadores em seu gabinete nos últimos dias.

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Quanto à prisão, a maioria dos ministros pró-relator concordou que a única medida possível a ser sofrida por um parlamentar é a detenção em caso de flagrante de crime inafiançável. A ministra Rosa Weber lembrou que o fato de haver requisitos suficientes para medidas cautelares – caso em discussão – não significa que a prisão será autorizada.

Barroso, Fux e Rosa foram dois dos três ministros da 1ª Turma que votaram, no fim de setembro, para impor as medidas cautelares contra Aécio. Marco Aurélio Mello e Alexandre de Moraes foram vencidos no julgamento. 

Fux disse entender que "a Constituição não diferencia o parlamentar para privilegiá-lo" e defendeu que o fato do político não poder ser preso preventivamente não significa que o Judiciário deve estar submetido a "um estado de inércia". O ministro lembrou que o STF decretou, no ano passado, a prisão do ex-senador Delcídio do Amaral, para rebater argumentos de que um afastamento interfere na representação do Estado.

Relator negou pedido

Fachin, por sua vez, defendeu que eventuais medidas cautelares previstas no CPP (Código de Processo Penal) podem ser aplicadas a parlamentares e não devem ser submetidas ao aval da Câmara e do Senado.

Para o relator, elas são diferentes dos casos de prisão em flagrante, quando a Constituição determina que a Casa legislativa do parlamentar precisa ser consultada. Fachin destacou que há uma diferença "marcante" entre a decretação da perda definitiva do mandato, que só pode ser feita pelo Legislativo, e a suspensão temporária do parlamentar.

O ministro disse considerar a hipótese de o Congresso revisar uma decisão do STF “uma ofensa ao postulado republicano e uma ofensa à independência do Poder Judiciário”.

Aécio acusa Barroso de não ser imparcial

O advogado do senador Aécio Neves, Alberto Toron, divulgou nota nesta quarta-feira após o voto do ministro Barroso. No texto, ele afirma que o ministro prejulgou caso de Aécio e reafirmou sua culpa, “sem dar a ele a oportunidade sequer de se manifestar e de apresentar provas, ferindo gravemente, assim, o direito de todo cidadão de ser julgado por um juiz imparcial”.

“O voto representa verdadeira temeridade, pois desconsidera o contexto obscuro e ilegal no qual as delações envolvendo os executivos da J&F se deram”, afirmou Toron no texto.