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Moro manda que hospital confirme se há registro do advogado de Lula no local

Lula durante depoimento ao juiz Sergio Moro em Curitiba - Reprodução
Lula durante depoimento ao juiz Sergio Moro em Curitiba Imagem: Reprodução

Do UOL, em São Paulo

17/10/2017 16h07Atualizada em 17/10/2017 23h43

O juiz federal Sergio Moro mandou nesta terça-feira (17) que o Hospital Sírio-Libanês, em São Paulo, apresente eventuais registros de internação ou tratamento do advogado Roberto Teixeira, amigo e defensor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). A apuração se refere ao processo no qual Lula é acusado de receber propinas por meio do uso de apartamento vizinho ao do petista em São Bernardo do Campo (SP).

Em ofício ao diretor do hospital, Moro deu o prazo de cinco dias para que a instituição informe eventuais registros de ingresso de Roberto Teixeira no segundo semestre de 2015, seja por internação ou tratamento. Na semana passada, o Sírio-Libanês afirmou não ter registrado a entrada do advogado no local como visitante. 

O juiz tem o objetivo de averiguar a declaração do engenheiro Glaucos Costamarques, que diz ter recebido uma visita de Roberto Teixeira, também réu no processo, durante sua internação no hospital -- entre novembro e dezembro de 2015. O advogado teria informado, segundo Costamarques, que o aluguel do apartamento vizinho ao em que vive Lula, de propriedade do engenheiro, seria pago.

Interrogado por Moro em 19 de setembro, Teixeira negou que tenha se encontrado com o empresário no Sírio-Libanês em 2015 e disse que houve um encontro casual entre os dois no hospital em 2016, mas sem tratarem sobre os aluguéis.

Costamarques também afirma que, durante sua internação, recebeu o contador João Muniz Leite, que atuaria com Teixeira. Nesse encontro, ele diz ter assinado, de uma única vez, todos os recibos da locação do apartamento entre fevereiro de 2011 e novembro de 2015. Segundo ele, após visita de Roberto Teixeira, o contador João Leite teria ido ao hospital recolher sua assinatura.

O engenheiro diz que nunca recebeu os valores sobre o aluguel referentes a esse período, apenas de 2015 em diante. O contrato de locação estava no nome da ex-primeira-dama Marisa Letícia, que faleceu em fevereiro deste ano.

Costamarques seria um "laranja" usado pela Odebrecht para a aquisição do apartamento, segundo o MPF (Ministério Público Federal). Ele é primo do pecuarista José Carlos Bumlai, amigo do ex-presidente, condenado a nove e dez meses de prisão por Moro.

Teixeira nega o encontro de 2015

Em depoimento a Moro, quando questionado sobre o suposto encontro no final de 2015, Teixeira negou que tenha conversado com Costamarques no hospital naquele ano. Disse também que não discutiu sobre os aluguéis com o empresário.

Roberto Teixeira afirmou ao juiz que se encontrou com Costamarques no Sírio Libanês uma vez, mas "ano passado", ou seja, 2016, conforme ele disse no interrogatório do dia 19 de setembro. O advogado afirmou que estava no hospital para fazer um curativo. No encontro, segundo Teixeira, Costamarques apenas "mostrou interesse apenas em saber como é que estaria regularizada a titulação desse imóvel", mas eles não teriam tratado sobre os aluguéis.

No interrogatório, o advogado, que é réu no mesmo processo, negou também ter falado sobre aluguéis com Lula. "A minha atuação enquanto advogado, apenas e tão somente como advogado, eu não sou gestor, não sou administrador, não sou, eu sou amigo e tão somente amigo, a amizade não se estende para essas outras informações todas."

ERRATA: A primeira versão desta matéria dizia que Teixeira confirmou o encontro em 2015, mas ele disse ter se encontrado com Costamarques em 2016.

Hospital registrou visita de contador

Segundo os registros do hospital, Leite fez ao menos três visitas a Costamarques --duas delas no mesmo dia-- durante sua internação no hospital Sírio-Libanês.

Os documentos foram entregues após ordem dada por Moro no dia 2, atendendo a pedido feito pela defesa de Costamarques, segundo a qual Leite visitou o engenheiro para que assinasse todos os recibos de aluguel referentes a 2015 do apartamento em São Bernardo do Campo alugado por Lula e sua família.

O contador, por sua vez, disse em nota, datada de 28 de setembro, que visitou Costamarques no hospital, mas não para que o engenheiro assinasse todos os recibos, "e sim em alguns meses, que embora tivéssemos os recibos, os mesmos não estavam assinados".

Ao ser interrogado por Moro, Teixeira afirmou que "João", um contador da empresa JML --da qual João Leite Muniz é proprietário--, prestava "serviços eventuais" a ele e preenchia as informações do imposto de renda de Lula e de Marisa Letícia.

Lula, por sua vez, disse em seu interrogatório que tinha um contador e perguntou ao seu advogado, Cristiano Zanin Martins: "Como era o nome do contador, João Leite?" Não é possível ouvir a resposta de Zanin Martins.

Em nota divulgada na semana passada, Zanin Martins disse que Muniz Leite emitiu declaração esclarecendo que "também era contador do Sr. Glaucos", sem esclarecer a que pessoa se refere o "também".

O MPF questiona a autenticidade dos recibos entregues pela defesa de Lula, e o juiz Moro pediu que os advogados informassem expressamente se detinham os recibos originais. Na última quarta (11), a defesa do ex-presidente disse que tem os recibos originais e apresentou pedido a Moro para entregá-los na presença de um perito.

6.set.2017 - Glaucos da Costamarques, réu na Lava Jato em processo com o ex-presidente Lula, em depoimento ao juiz Sergio Moro - Reprodução - 6.set.2017 - Reprodução - 6.set.2017
Glaucos da Costamarques durante interrogatório pelo juiz Moro
Imagem: Reprodução - 6.set.2017

Entenda a acusação a Lula

Segundo o MPF, o apartamento usado pela família de Lula em São Bernardo do Campo seria parte de propina da Odebrecht em troca da atuação do ex-presidente para beneficiar a empresa em oito contratos com a Petrobras. Um terreno em São Paulo para o Instituto Lula --que nunca foi usado pela entidade-- também faria parte da vantagem indevida.

A defesa do ex-presidente nega que tenha recebido a posse ou propriedade dos imóveis, muito menos em contrapartida a uma atuação em contratos com a Petrobras. Segundo os advogados de Lula, “nenhuma prova foi apresentada sobre essa alegação, que se mostrou, em verdade, ser manifestamente improcedente”.

“Essa situação, além de levar ao reconhecimento da inocência de Lula, mostra que o processo jamais poderia estar sendo conduzido pelo juiz Sergio Moro, pois não há qualquer relação efetiva e real com a Petrobras, como sempre foi afirmado pela defesa”, diz a defesa.

Costamarques afirmou ter comprado o apartamento a pedido de seu primo e amigo de Lula, o pecuarista José Carlos Bumlai --que foi condenado em outro processo da Lava Jato. Este, no relato de Costamarques, atendia a pedido de Marisa Letícia, que estava preocupada com a possível compra do imóvel por alguém desconhecido da família.

Pecuarista José Carlos Bumlai chega para prestar depoimento ao juiz federal Sérgio Moro por videoconferência, em São Paulo  - Renato S. Cerqueira - 9.mai.2017/Futura Press/Estadão Conteúdo - Renato S. Cerqueira - 9.mai.2017/Futura Press/Estadão Conteúdo
O pecuarista José Carlos Bumlai
Imagem: Renato S. Cerqueira - 9.mai.2017/Futura Press/Estadão Conteúdo

A defesa do engenheiro disse, em petição entregue a Moro no dia 28 de setembro, que Costamarques comprou e alugou o apartamento para a ex-primeira-dama "única e exclusivamente em razão do pedido feito pelo seu primo".

Os advogados de Lula apresentaram um contrato de aluguel com início em fevereiro de 2011 assinado pela ex-primeira-dama Marisa Letícia, falecida em fevereiro deste ano, e por Costamarques. Também entregaram à Justiça recibos assinados por Costamarques que comprovariam a quitação dos aluguéis.

No entanto, segundo o MPF, não há transações bancárias que comprovem o pagamento dos aluguéis até o fim de 2015. Costamarques disse à Justiça que, neste período, não recebeu nada --apesar de ter declarado isso no imposto de renda.

Segundo a defesa de Costamarques, "o fato de os recibos terem sido declarados à Receita Federal no Imposto de Renda deu-se em razão da própria existência do contrato de locação, da promessa de pagamento de todas as parcelas pelo seu primo e da orientação de que deveria, sim, declarar tais valores e sobre eles pagar o respectivo imposto."

Ainda de acordo com os advogados de Costamarques, "os recibos referentes à locação em causa foram exigidos do defendente, em razão da existência do contrato de locação, e corresponderam à confiança, amizade e grande estima que devotava ao primo, José Carlos Costa Marques Bumlai".