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Grampos nunca foram para 'bisbilhotar' escritório da defesa de Lula, diz MPF

Número telefônico de empresa de Lula constava como sendo do escritório que o defende - Pedro Ladeira/Folhapress - 19.nov.2017
Número telefônico de empresa de Lula constava como sendo do escritório que o defende Imagem: Pedro Ladeira/Folhapress - 19.nov.2017

Nathan Lopes

Do UOL, em São Paulo

06/12/2017 12h38Atualizada em 07/12/2017 07h24

Em parecer ao TRF (Tribunal Regional Federal) da 4ª Região, o procurador regional Mauricio Gotardo Gerum se posicionou contra o pedido para a destruição de áudios obtidos por meio de grampo no escritório da defesa do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). “Em momento algum a interceptação telefônica pretendeu ‘bisbilhotar’ conversas dos advogados do escritório com os seus clientes”, escreveu o membro do MPF (Ministério Público Federal) da 4ª Região.

As chamadas, gravadas entre fevereiro e março de 2016, envolviam um dos números do escritório que defende o petista, o Teixeira, Martins e Advogados, sediado na capital paulista. O ex-presidente também foi alvo de condução coercitiva e de mandados de busca e apreensão na ocasião. As gravações citadas neste pedido não envolvem a conversa entre Lula e a ex-presidente Dilma Rousseff (PT) sobre a nomeação do petista ao ministério da Casa Civil, que foi captada na mesma época.

Ao justificar sua posição, Gerum relembra os argumentos do juiz federal Sergio Moro, que autorizou as escutas. “Como reiteradamente afirmado pelo juízo de primeira instância, sempre se imaginou que o telefone fosse utilizado pelo titular da linha, o instituto L.I.L.S”, disse, referindo-se à empresa responsável pelas palestras de Lula.

Na sentença em que condenou Lula a nove anos e meio de prisão, Moro explicou que “a interceptação foi autorizada tendo por presente informação de que o terminal [a linha] seria titularizado pela empresa L.I.L.S. Palestras, do ex-presidente, e não por escritório de advocacia”. Tanto a Polícia Federal quanto o MPF no Paraná apontavam que o número era da empresa do petista pois era cadastrado no CNPJ dela.

Segundo a força-tarefa da Operação Lava Jato, a L.I.L.S., após o fim do sigilo sobre a interceptação, alterou o cadastro CNPJ para excluir do cadastro o referido telefone. A defesa de Lula, por sua vez, diz que a companhia telefônica teria avisado o juiz, em duas oportunidades, que o telefone grampeado era do escritório. Moro confirmou a informação, mas disse que não percebeu as notificações porque estava “com atenção tomada por centenas de processos complexos perante ele tramitando".

O parecer de Gerum foi encaminhado à Oitava Turma do TRF-4, a mesma que irá avaliar a apelação do ex-presidente contra a sentença de Moro no processo do tríplex. Ainda não há data marcada para o julgamento.

No começo de novembro, o desembargador João Pedro Gebran Neto, relator das ações da Lava Jato na Oitava Turma, negou o pedido da defesa de Lula para destruir os arquivos de áudio. Gebran avaliou que Moro já havia tomado medidas para “acautelar adequadamente a prova, assim como reserva para o final da consulta a inutilização dos diálogos".

No ano passado, ao STF (Supremo Tribunal Federal), Moro informou que o conteúdo dessas gravações seria inutilizado. A defesa de Lula, alegando que isso não aconteceu até o momento, acionou o TRF-4 por meio de mandado de segurança. Atualmente, os áudios estão, sob sigilo, na secretaria da 13ª Vara Federal Criminal, em Curitiba.

No parecer, Gerum relembra que “um dos advogados que dá nome ao escritório estava também sendo investigado por práticas criminosas, o que, inclusive fez com que, posteriormente, fosse denunciado em duas ações penais”. O procurador regional refere-se a Roberto Teixeira, advogado e amigo de Lula. Ele é réu em processo sobre um terreno para o Instituto Lula e na ação penal a respeito do sítio de Atibaia (SP). Esses dois processos ainda não foram julgados, o que deve acontecer apenas no ano que vem.

Para Gerum, “não há qualquer excepcionalidade na interceptação realizada”. “Como também não é excepcional que tenham sido captadas conversas normais a um escritório de advocacia e que nada tinham a ver com o objeto da investigação”.

O fato de os áudios estarem sob sigilo também é ressaltado pelo procurador, pontuando que a destruição deles aguarda “o procedimento e a forma legal própria, não havendo qualquer risco de que sejam acessados”. “Porque entendeu o magistrado de primeiro grau ser ‘a vedação ao acesso a todos os áudios do referido terminal’ a melhor medida para proteger eventuais diálogos de outros advogados não investigados”.

Em nota, a defesa de Lula diz que o parecer do MPF "tenta modificar a realidade dos fatos". "A maior prova da intenção indevida é que a Polícia Federal analisou e mapeou toda a estratégia de defesa estabelecida pelos advogados de Lula durante ligações telefônicas", diz o comunicado assinado pelo advogado Cristiano Zanin Martins.

Ainda na nota, a defesa diz que a Procuradoria ignora no parecer uma "gravíssima violação à garantia de inviolabilidade de escritórios de advocacia e também do direito de defesa".

Após o parecer do MPF na 4ª Região, a Oitava Turma deve apresentar uma decisão a respeito do mandado de segurança da defesa de Lula. Ainda não há data para que isso ocorra.

OAB interessada

Nesta quarta-feira (6), Gebran voltou atrás na decisão em que barrava a presença da OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) como parte interessada no mandado de segurança.

O Conselho Federal da OAB e a Seccional da OAB de São Paulo decidiram apoiar o pedido do escritório que defende Lula para destruir as gravações. Segundo a entidade, as interceptações ferem o direito ao sigilo das comunicações entre advogado e cliente. Por isso, a OAB pleiteou ao TRF-4 a sua participação como interessada no caso. 

Na semana passada, o desembargador havia negado o pedido da Ordem. Gerbran argumentou que a decisão não causaria para atuação profissional de advogados. Ele também dizia não reconhecer a OAB como parte interessada do processo por se "tratar de discussão que diz respeito não às prerrogativas profissionais da advocacia, mas à situação concreta envolvendo tão somente o escritório".

No despacho de hoje, Gebran disse que, "a fim de evitar incidentes desnecessários no trâmite deste processo", reconsidera, por ora, a decisão. A questão, porém, ainda será avaliada em conjunto pela Oitava Turma quando o mandado for julgado.

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