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Cabral usava propina para pagar mesadas de até R$ 100 mil a ex-mulher, pais e filhos, diz operador

'Filhotes da Lava Jato': conheça as operações que miram Cabral

UOL Notícias

Paula Bianchi

Do UOL, no Rio

18/12/2017 17h49

Apontado como o principal operador financeiro de Sérgio Cabral (PMDB) em suposto esquema de corrupção investigado pela Lava Jato no Estado, Carlos Miranda afirmou nesta segunda-feira (18) que o ex-governador do Rio de Janeiro usava parte da propina que recebia em mesadas para a ex-mulher do peemedebista, Susana Cabral Neves, os pais, os filhos e a irmã Cláudia.

De acordo com Miranda, que fechou acordo de delação premiada, a ex de Cabral, Susana Neves Cabral, e os pais do governador receberiam R$ 100 mil por mês; a irmã Cláudia, R$ 25 mil e dois filhos do peemedebista com a ex, R$ 10 mil e R$ 5.000, respectivamente.

A Justiça não perguntou, no entanto, se havia algum pagamento para o outro filho dele com Susana, o deputado federal Marco Antônio Cabral (PMDB). Casados por 15 anos, Susana e Cabral têm três filhos.

Miranda detalhou a forma como os valores eram encaminhados à Susana, também investigada pela Lava Jato. O dinheiro, de acordo com Miranda, era enviado através da Survey Mar e Serviços Ltda., uma empresa de fachada ligada ao dono da FW Engenharia, Flávio Werneck.

“Cabral combinou com a Susana de enviar um valor mensal de R$ 100 mil”, disse Miranda nesta segunda em depoimento ao juiz Marcelo Bretas na 7ª Vara Criminal Federal. Segundo ele, os valores eram pagos a ela desde a época que Cabral era senador. Miranda não foi questionado, contudo, por quanto tempo os pagamentos perduraram.

Além do ex-governador e Carlos Miranda, a acusação inclui ainda Susana e o irmão do peemedebista, Maurício Cabral; Flávio Werneck e Alberto Conde, contador da FW.

“Flávio entrou como uma forma de regularizar os recursos repassados à Susana. Flávio me garantiu que o contador responsável era uma pessoa da mais alta confiança, então pedi para fazer esses pagamentos para Susana”, afirmou Miranda.

Segundo a denúncia, a FW Engenharia teria obtido vantagens em contratos com o governo do Estado durante a gestão Cabral. Entre 2007 e 2014, o volume de acordos comerciais entre as partes aumentou 37 vezes e incluiu obras grandiosas, como a urbanização das comunidades do Complexo de Manguinhos, na zona norte carioca.

Conde foi identificado como responsável pelos repasses indevidos. Para ocultar o rastro das operações, ele utilizava, de acordo com o MPF, a subsidiária Survey Mar e Serviços Ltda., registrada em nome de dois supostos laranjas, entre os quais a própria neta.

Ex de Cabral nega mesadas de R$ 100 mil

Em depoimento nesta segunda ao juiz Marcelo Bretas, Susana negou a suposta mesada de R$ 100 mil que Carlos Miranda disse ter repassado ela. Ela afirmou que mantinha uma relação cordial, mas distante, com o ex-marido, focada nos filhos, e que recebia apenas pensão.

“Vamos fazer 21 anos de separados. Apesar de ele ser um pai muito presente, a nossa relação se limita a falar sobre os meninos. Ele sempre custeou todas as despesas da casa, dos meninos. Me dava um dinheiro mensal que variava entre R$ 20 mil, R$ 25 mil e que chegou a até R$ 40 mil.”

Segundo ela, entre 2011 e 2013, o ex-governador a informou que havia fechado um negócio e que a pensão passaria a ser paga por uma empresa diretamente na conta da empresa de Susana, a Araras. “Eu confiava nele e queria era a pensão, não me interessava se seria paga na conta da minha empresa ou em dinheiro. Falou até que seria um valor maior, para eu usar como achasse melhor, em viagens com os meninos.”

Antes, diz Susana, o dinheiro era entregue em espécie por Luiz Carlos Bezerra, também apontado como operador de Cabral.

Susana descreveu Flávio Werneck como um amigo íntimo de Cabral, que conheceu na época em que começaram a namorar, ainda nos anos 80. O ex-governador, segundo ela, custeou reformas em seus sítios e apartamentos, feitas por Werneck, a pedido dos filhos.

Susana é neta do ex-presidente Tancredo Neves (1910-1985), prima do vice-governador do Rio, Francisco Dornelles (PP), e do senador Aécio Neves (PSDB-MG).

Empreiteiro diz ter pagado R$ 15 milhões a Cabral

O Ministério Público Federal afirma que a empreiteira pagou, no total, R$ 1,7 milhão de propina ao ex-governador. Outros valores também foram repassados por meio de empresas em nome de Susana Neves e Carlos Miranda.

Também ouvido nesta segunda, o empreiteiro Flávio Werneck confirmou em depoimento que havia um acordo para o pagamento de propina ao ex-governador. “Em diversas obras que fizemos para o governo do Estado havia o compromisso de 5% [do valor total da obra]”, afirmou.

O valor informado pelo empresário em Juízo foi, entretanto, superior ao apurado pela Lava Jato. Werneck estima ter pagado entre R$ 15 milhões e R$ 20 milhões em propina ao ex-governador.

A propina, disse Flávio, foi combinada com Wilson Carlos. Inicialmente, os valores eram entregues em dinheiro ao ex-assessor da Secretaria de Obras do Rio de Janeiro, Wagner Jordão Garcia. Posteriormente, os valores eram repassados para outras empresas, como a Araras Empreendimento, de propriedade da ex-mulher de Cabral.
 
Entre 2011 e 2013, foram realizados 31 depósitos bancários em favor de Susana Neves, totalizando mais de R$ 1,2 milhão. As transferências foram feitas, segundo a denúncia, em valores fracionados, que variavam entre R$ 6.000 e R$ 56.310.

Segundo o empresário, também houve lavagem de dinheiro através da compra de um sítio para a ex-mulher de Cabral e outro para Carlos Miranda, além da reforma de uma cobertura na Lagoa.

"Ninguém inventou nada. Acho que vem de tempos atrás. Simplesmente concordamos, erradamente, em participar desse tipo de situação até para exercer nossa profissão”, disse, ao confirmar a existência do pagamento de propina.

Operador confirma R$ 240 mil a irmão de Cabral

Cabral já foi denunciado 16 vezes pelo Ministério Público. A Procuradoria o acusa de pedir 5% de propina sobre os grandes contratos do governo do Rio. Cabral nega ter recebido propina, mas reconhece que fez uso pessoal de sobras de caixa dois de campanha eleitoral.

Mais uma vez, Miranda reafirmou a existência de um elaborado esquema de cobrança de propinas por parte de Cabral das empresas que estabeleciam contratos com o Estado durante o período que ele ficou à frente do governo fluminense, entre 2007 e 2014.

De acordo com ele, Wilson Carlos, então secretário de Governo, era responsável por todas as tratativas e acordos do governo com os empresários. Ele e Carlos Bezerra cuidavam de receber o dinheiro e distribuir. E o ex-secretário da Casa Civil Régis Fichtner seria o homem de confiança de Cabral e cuidava da estrutura da propina dentro do governo.

Ele afirmou ainda que toda propina arrecadada era direcionada aos irmãos doleiros Marcelo e Renato Chebbar, que tinham a função de enviar para o exterior ou manter guardados os recursos arrecadados pela quadrilha.

Miranda disse ainda que pagou R$ 240 mil ao irmão de Cabral a pedido do ex-governador. Segundo ele, o publicitário, ouvido pela Justiça na semana passada, o procurou em busca de novos clientes. Ao repassar a informação a Cabral, recebeu ordens para fazer o depósito.

Maurício Cabral disse a Bretas na última nesta quarta-feira (13) desconhecer a origem do dinheiro. O publicitário afirmou que o valor foi depositado após emitir uma nota por conta de um trabalho que havia combinado com Carlos Miranda, mas que acabou não sendo realizado.