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Palocci foi porta-voz do governo para direcionar pedidos de propina de Belo Monte, diz Lava Jato

Nathan Lopes e Vinicius Boreki

Do UOL, em São Paulo e colaboração para o UOL, em Curitiba

09/03/2018 10h32Atualizada em 09/03/2018 15h52

O ex-ministro Antonio Palocci (ex-PT) era o "porta-voz do governo" para direcionar pedidos de propina às empreiteiras do consórcio Norte Energia durante a construção da Usina Hidrelétrica de Belo Monte, no Pará, segundo a força-tarefa da Lava Jato, que iniciou nesta sexta-feira (9) nova fase da operação. 

A investigação desta etapa está baseada em indícios de que o consórcio de empreiteiras que venceu a leilão para construir Belo Monte foi favorecido por agentes do governo federal. O leilão ocorreu em 2010, durante o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). "O governo federal, ao convidar empresas para participar do empreendimento, solicitou, por intermédio de Antonio Palocci, proprina para o PT e para o MDB", disse o procurador Athayde Ribeiro Costa durante entrevista coletiva nesta sexta-feira (9).

Segundo o Ministério Público Federal, foram identificados o pagamento de R$ 135 milhões em propinas, sendo R$ 60 milhões para cada um dos partidos e outros R$ 15 milhões para o ex-ministro da Fazenda e ex-deputado federal Antônio Delfim Netto. "A investigação apurou que os valores giram em torno deste número para os partidos [R$ 60 milhões para cada um]. O valor da propina seria de 1% do contrato, sendo que 45% disso ia para o PT, 45% para o PMDB, atualmente MDB, e 10% para o ex-ministro Delfim Netto", afirmou Athayde.

Delfim Netto, 89, foi o principal alvo da 49ª fase da Lava Jato, deflagrada nesta sexta. Batizada de “Buona Fortuna”, a etapa investiga pagamento de propina a agentes públicos e políticos pelo consórcio de empreiteiras envolvido na construção de Belo Monte, considerada a terceira maior hidrelétrica do mundo.

A residência de Delfim, em São Paulo, foi um dos endereços envolvidos nos dez mandados de busca e apreensão, expedidos pelo juiz federal Sergio Moro. Também houve ações da PF (Polícia Federal) em Jundiaí (SP), Guarujá (SP) e Curitiba. Sobrinho do ex-ministro, o empresário Luiz Appolonio Neto também foi um dos alvos da ação. Costa apontou que não foram reunidos elementos suficientes para um pedido de prisão.

PF apura pagamentos de propina ligados às obras de Belo Monte - Lalo de Almeida - 09.mar.2016/Folhapress - Lalo de Almeida - 09.mar.2016/Folhapress
PF apura pagamentos de propina ligados às obras de Belo Monte
Imagem: Lalo de Almeida - 09.mar.2016/Folhapress

De acordo com o MPF, já foram identificados, até o momento, pagamentos superiores a R$ 4 milhões, feitos entre 2012 e 2015, envolvendo as empresas Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Odebrecht, OAS e J. Malucelli, todas integrantes do consórcio. O valor era destinado a pessoas jurídicas relacionadas a Delfim por meio de contratos fictícios de consultoria. 

Do total de R$ 15 milhões que seriam destinados a Delfim Netto, a investigação já rastreou R$ 4 milhões pagos pelas empresas Camargo Corrêa, Andrade Gutierrez, Odebrecht, OAS e J. Malucelli, todas integrantes do Consórcio Construtor de Belo Monte, em favor de pessoas jurídicas relacionadas a Antônio Delfim Netto, por meio de contratos fictícios de consultoria.

No caso da Odebrecht os pagamentos foram registrados no sistema de controle de propinas da empresa (“Drousys”), com o codinome “Professor”. As apurações demonstraram não foram prestados serviços pelo ex-ministro às empreiteiras.

Os advogados do ex-ministro Delfim Netto, Fernando Araneo, Jorge Nemr e Ricardo Tosto, afirmam por meio de nota que os valores recebidos por Delfim foram pagos por “honorários por consultoria prestada”, sem, no entanto, precisar o montante recebido. “O professor Delfim Neto não ocupa cargo público desde 2006 e não cometeu nenhum ato ilícito em qualquer tempo”, afirma a nota.

Em relação ao depoimento de Delfim à PF (Polícia Federal), em agosto de 2016, no qual o ex-ministro afirmou ter recebido R$ 240 mil em espécie da Odebrecht em outubro de 2014 por "motivos pessoais, por pura conveniência", devido a um serviço de consultoria que ele teria prestado à empreiteira, o procurador da Lava Jato disse que "ele não falou a verdade". "Ele tentou mascarar o recebimento de vantagem indevida em supostos contratos de consultoria cujos serviços jamais foram prestados".

Sobre o envolvimento dos partidos na investigação, o procurador disse que a investigação corre junto ao STF (Supremo Tribunal Federal) por causa do foro privilegiado de alguns dos envolvidos.

Em nota, o MDB afirma que “não recebeu propina nem recursos desviados no Consórcio Norte Energia” e lamenta que “uma pessoa da importância do ex-deputado Delfim Neto esteja indevidamente citada no processo”. O PT diz em nota que os procuradores da Lava Jato ao PT “tentam criminalizar o partido” com acusações “sem fundamento” conforme se aproximam as eleições. 

Procurada, a Norte Energia ainda não se manifestou. A defesa de Luiz Appolonio Neto, representada pelo advogado Fernando Araneo, sócio do Leite, Tosto e Barros Advogados, afirmou em nota "que sua vida profissional sempre foi pautada pela legalidade".

Preso em setembro de 2016, na 35ª fase da Lava Jato, Palocci foi condenado a 12 anos de prisão por corrupção passiva e lavagem de dinheiro pelo Juiz Sergio Moro, em junho de 2017. Seu advogado, Alessandro Silvério, disse que a defesa se manifestará apenas nos autos de uma eventual ação penal.