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Lava Jato no Rio identifica pela 1ª vez lavagem de dinheiro com bitcoins

13.mar.2018 - O delegado Marcelo Martins (centro) é um dos alvos da operação  - Severino Silva/Agência O Dia/Estadão Conteúdo
13.mar.2018 - O delegado Marcelo Martins (centro) é um dos alvos da operação Imagem: Severino Silva/Agência O Dia/Estadão Conteúdo

Marcela Lemos

Colaboração para o UOL, no Rio

13/03/2018 12h54Atualizada em 13/03/2018 17h10

As investigações da nova fase da Lava Jato no Rio de Janeiro, operação Pão Nosso, identificaram pela primeira vez operações de lavagem de dinheiro envolvendo a moeda virtual bitcoin.

De acordo com Luiz Henrique Casemiro, superintendente-adjunto da 7ª Região Fiscal da Receita Federal, suspeitos de integrar esquema de superfaturamento e fraude no fornecimento de pão para os presos das cadeias estaduais fizeram quatro operações no valor total de R$ 300 mil neste tipo de moeda.

Segundo Casemiro, a movimentação está sendo estudada e trata-se de uma nova forma para driblar a Receita. Ele não informou, contudo, quais foram os suspeitos que realizaram as operações com bitcoins.

“As pessoas estão tentando sofisticar de alguma forma, talvez tentando voar abaixo do radar da Receita Federal, do Banco Central e do Coaf [Conselho de Controle de Atividades Financeiras, órgão do Ministério da Fazenda]. Talvez um teste ainda. É uma forma de receber dinheiro no exterior usando instrumento que não é regulado na maioria dos países", disse o superintendente.

Na operação desta terça-feira (13), foram expedidos 16 mandados de prisão. Até o começo da tarde, sete pessoas haviam sido presas, dentre elas, o delegado Marcelo Martins e o ex-secretário de Administração Penitenciário de Sérgio Cabral (MDB), César Rubens Monteiro de Carvalho.

De acordo com o MPF, um dos operadores financeiros de Cabral revelou, em colaboração premiada, que parte da propina recebida na Seap (Secretaria de Administração Penitenciária) era repassada ao ex-governador.

Segundo as investigações, o esquema teria desviado ao menos R$ 44 milhões dos R$ 73 milhões em contratos firmados para o fornecimento de pães a presídios no Rio.

Como funcionava o esquema

Segundo o MPF (Ministério Público Federal), as irregularidades foram identificadas primeiramente no projeto Pão-Escola, de ressocialização dos presos.

Os procuradores afirmam que a empresa Induspan, de Felipe Paiva, que também teve a prisão ordenada pela Justiça, fornecia lanches acima do valor de mercado, apesar de receber insumos do Estado para a produção dos pães e contar com a mão de obra de detentos do sistema carcerário do Estado.

Após a identificação de desequilíbrio financeiro, o contrato com a Induspan foi rescindido. No entanto, Felipe Paiva, por meio de laranjas, criou a OSCIP Iniciativa Primus, que sucedeu a empresa anterior no fornecimento de lanches em presídios. Porém, o Tribunal de Contas identificou que o esquema era mantido.

Mesmo após a identificação das irregularidades, o ex-secretario César de Carvalho autorizou prorrogações de contrato com a Iniciativa Primus, segundo os investigadores. As investigações também apontam que o patrimônio de Carvalho aumentou ao menos dez vezes enquanto esteve à frente da Seap.

Já o delegado Marcelo Martins é suspeito de participar do esquema de lavagem de dinheiro superfaturado no sistema penitenciário. Ele e seu pai, Carlos Mateus Martins --cuja prisão foi ordenada--, também sócio do ex-secretário de Administração Penitenciária, são suspeitos de colaborar na estrutura de pessoas jurídicas para viabilizar a lavagem de dinheiro.

Segundo a Lava Jato, pai e filho ainda atuaram por meio da empresa Finder junto ao grupo Dirija, de Ary da Costa Filho, um dos operadores financeiros do núcleo central de Cabral.

Há ainda registro de emissão de notas fiscais por parte da Finder para outras empresas investigadas no esquema, como o grupo Magro, que adquiriu a refinaria de Manguinhos e é investigado por participar de esquema de sonegação fiscal e fraude; a Toesa Service, envolvida na prática de crimes na área de saúde, e a Trans-Expert Vigilância e Transporte de Valores, cujo administrador foi denunciado em decorrência da operação Ponto Final, desdobramento da Lava Jato.

Outro lado

A reportagem do UOL tenta localizar as defesas de Marcelo Martins, César de Carvalho e Felipe Paiva.

Por meio de nota, o advogado de Cabral, Rodrigo Roca, disse que todos os secretários da gestão do ex-governador do Rio ouvidos em Juízo afirmaram nunca terem sofrido ou ouvido falar de qualquer tipo de pressão ou interferência de Cabral nas respectivas pastas. Roca também afirma que a nova suspeita se contrapõe ao que disseram outros delatores nos processos em andamento.

"O ex-governador desconhece irregularidades na Seap ou em qualquer outra secretaria do seu governo, reafirmando que nunca compactuou com ilícitos seja na sua vida pessoal ou como gestor público", diz a defesa de Cabral. Cabral é réu em 21 processos --as cinco condenações que já existem contra ele ultrapassam cem anos de prisão.