Discurso de Lula tentou animar militância e reforçar perseguição, diz professor
O discurso do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em São Bernardo do Campo, na Grande São Paulo, neste sábado (7) reforçou a estratégia de o petista se colocar como vítima da imprensa e da Justiça.
Para o professor de ciências políticas da PUC (Pontifícia Universidade Católica) do Rio de Janeiro Ricardo Ismael, o discurso não trouxe nada diferente do que já era dito pelo petista em momentos anteriores e parece servir apenas para tentar manter a militância nas ruas.
"Ele pontuou basicamente o que já dizia em suas caravanas, criticando Justiça em primeira e segunda instâncias, falando em regulação da mídia. Não houve uma novidade, foi tudo em cima da mesma narrativa", diz.
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Para ele, uma das coisas que mais chamou a atenção foi a atenção dada ao ex-prefeito de São Paulo e virtual "plano B" petista para disputa da Presidência.
"A segunda pessoa que ele chamou, logo depois da Dilma [Rousseff], foi o [Fernando] Haddad. Haddad não estava nem ao lado dele, e ele o chamou para frente. Para mim, isso mostra que ele já foi escolhido, falta só a data e o anúncio", afirma.
Ismael assegura que a única novidade foi a afirmativa da entrega à Polícia Federal para iniciar o cumprimento da pena.
Ele falou das ideias, das flores, mas para tentar animar a militância. Ele sabe a candidatura ficou ainda mais difícil
Ricardo Ismael, cientista político
"Teve um evidente tom mais difícil [que em outros discursos], emotivo, e ele teve que explicar para a multidão que iria se entregar, e as pessoas não gostariam disso", afirma. "A grande novidade foi o fato de ele dizer que vai se entregar, o que não tinha sido dito."
A militância atuou para impedir que Lula deixasse o sindicato. Por volta das 17h do sábado (7), Lula chegou a entrar em um carro com seu advogado, mas foi impedido de sair por apoiadores que bloquearam o portão, por isso na segunda tentativa ele cruzou os portões a pé. Manifestantes da própria esquerda chegaram a derrubar as grades que barravam a entrada para tentar acompanhá-lo.
Foram quase 26 horas para se entregar após o esgotamento do prazo dado por Moro --e 49 horas depois de proferida a decisão.
Frases para "animar" militância
Durante o discurso, Lula usou frases de efeito para ressaltar que, mesmo com sua prisão, seus ideais devem permanecer vivos.
Entre as falas, ele citou que "não é mais um ser humano, mas sim uma ideia" e citou uma frase que disse ter ouvido em 1982: "Os poderosos podem matar uma, duas ou três rosas, mas jamais conseguirão deter a chegada da primavera".
"Na verdade, ele falou das ideias, das flores, mas para tentar animar a militância. Ele sabe a candidatura ficou ainda mais difícil", afirma.
O discurso deste sábado ainda ratificou um tom duro de Lula contra a esfera judicial, citando nominalmente o juiz Sergio Moro.
"A Polícia Federal da Lava Jato, quando fez o inquérito, mentiu que era meu. O Ministério Público, quando fez a acusação, mentiu dizendo que era meu. E eu pensei que o Moro ia resolver, e ele mentiu dizendo que era meu. E me condenou a nove anos de cadeia", disse o ex-presidente.
Para o cientista político, o discurso é exagerado e repetitivo. "Lula é um líder popular, tem um carisma muito grande, mas há um confronto com a Justiça que está passando do limite. Há um desgaste muito grande, o que acabo mobilizando uma raiva muito grande em relação a ele", pontua.
Em outro ponto marcante de seu discurso, Lula disse que gostaria de participar de um debate com o juiz Sergio Moro e com desembargadores do TRF (Tribunal Regional Federal) da 4ª Região.
"Foi algo sem sentido, é o fim do Judiciário? Qual país em democracia direta não tem Judiciário? Ele volta para antes do Estado, quando um sujeito absoluto dominava. Entendo que no discurso, na hora pode soar como uma prova de ele estava tão seguro da inocência que debateria com qualquer pessoa em praça pública. Mas não é assim que funciona", diz.
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