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"Rei dos ônibus" diz que pagou propina para Picciani e outros políticos do Rio

Gabriel Sabóia

Do UOL, no Rio

24/08/2018 16h16Atualizada em 26/08/2018 13h45

O empresário Jacob Barata Filho, dono de empresas do setor de transportes e conhecido como "Rei dos ônibus" , afirmou pela primeira vez que repassou dinheiro, via caixa dois, para agentes públicos do Rio de Janeiro, entre eles os ex-presidentes da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) Jorge Picciani e Paulo Mello. Barata Filho presta depoimento nesta sexta-feira (24) ao juiz Marcelo Bretas, da 7º Vara Federal Criminal do Rio, responsável pela Lava Jato no estado.

Sem caixa dois, empresário nenhum opera no estado. O presidente da Assembleia é figura chave nessa engrenagem"

Jacob Barata Filho

No depoimento, o empresário não deu detalhes sobre os valores que teriam sido repassados. O depoimento acontece no âmbito da Operação Cadeia Velha, desdobramento da Operação Lava Jato no Rio.

Procurada pela reportagem, a defesa de Picciani afirmou que não faria cometários sobre as afirmações de Barata Filho. Segundo o advogado Rafael De Piro, "a defesa se manifestará pelos autos". A defesa de Paulo Mello disse que não se pronunciaria.

O "regime presidencialista da Alerj", segundo o Barata Filho, faria os repasses serem concentrados na figura do presidente da Alerj, que, possivelmente, distribuiria esses valores a deputados aliados dispostos a aprovar projetos que beneficiassem o setor de transportes.

"Sem apoio ninguém vai adiante", disse. 

Barata Filho disse ainda que o consórcio de empresas administrado por ele chegava a destinar até 1% dos valores totais de contratos com o poder público para "compra" de apoios. Os valores da propina teriam chegado a R$ 6 milhões por mês, segundo o relato do empresário. A verba de corrupção teria sido repassada a agentes públicos do ano 2000 até 2017.

A defesa de Jacob anunciou a devolução de R$ 80 milhões do seu patrimônio aos cofres públicos, o que, nas palavras dele, visa "minorar os prejuízos causados pelo esquema".

Entra e sai da cadeia

Jacob Barata Filho foi preso pela primeira vez em junho de 2017 na Operação Ponto Final --outro desdobramento da Lava-Jato do Rio que investiga o setor de transportes. De acordo com o Ministério Público Federal, esse esquema teria movimentado R$ 260 milhões.

Ele foi detido pela Polícia Federal na área de embarque do Aeroporto Internacional Antônio Carlos Jobim, de onde pretendia embarcar para Portugal. O empresário foi beneficiado por uma decisão do ministro do Supremo Tribunal Federal, Gilmar Mendes, que determinou sua soltura pouco mais de dois meses depois.

Em novembro de 2017, ele voltou a ser preso. Desta vez, pela Operação Cadeia Velha, mas foi solto no mês seguinte por nova decisão de Gilmar Mendes.

Operação Cadeia Velha

A Operação Cadeia Velha levou à prisão os deputados Jorge Picciani, Edson Albertassi e Paulo Mello (todos do MDB) em dezembro de 2017. As investigações apontaram que os parlamentares usariam da sua influência para aprovar projetos na Assembleia legislativa do Rio que visavam favorecer empresas de ônibus e empreiteiras. Em troca, os três -- receberiam repasses em dinheiro, via caixa dois. Em momentos diferentes, os três deputados acusados ocuparam a presidência da Alerj.

De acordo com o Ministério Público Federal, o esquema de corrupção é um dos mais antigos do estado e era chamado por deputados de "Caixinha da Fetranspor". Albertassi e Paulo Mello seguem presos no Complexo Penitenciário de Gericinó, na zona oeste do Rio. Picciani cumpre prisão domiciliar, por decisão que levou em conta o seu estado de saúde. Eles são acusados de corrupção passiva e ativa, organização criminosa e lavagem de capitais.

Filho de Picciani nega ter lavado dinheiro do pai

Felipe Picciani, filho do deputado Jorge Picciani, também prestou depoimento ao juiz Marcelo Brêtas.

Ele negou uma acusação de ter lavado suposto dinheiro de propina recebido pelo pai, através da empresa Agrobilara Comércio e Participações Ltda., da qual é sócio.

"Sou zootecnista. Minha participação na sociedade não é administrativa. Todos os meus rendimentos vêm do trabalho de inseminação e reprodução de gado. Não intervenho nos negócios da família", afirmou em resposta a Bretas.

De acordo com as investigações da Operação Cadeia Velha, um suposto superfaturamento na compra e venda de gados nas fazendas da família Picciani teria sido usado para lavar dinheiro -- que poderia ser oriundo de propina recebida de empresários do setor de transportes.

No despacho assinado pelo desembargador federal Abel Gomes, que autorizou a prisão do empresário em novembro de 2017, a pedido do Ministério Público Federal, o magistrado afirma que a Agrobilara "era utilizada para dar foros de licitude a valores oriundos de propina".