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Lava Jato prende irmão de Beto Richa, e primo tem prisão decretada

Pepe Richa (dir.) integrou o governo do irmão Beto Richa (esq.) no Paraná - Reprodução - 16.mar.2018/Facebook/José Richa Filho
Pepe Richa (dir.) integrou o governo do irmão Beto Richa (esq.) no Paraná Imagem: Reprodução - 16.mar.2018/Facebook/José Richa Filho

Nathan Lopes e Vinicius Boreki

Do UOL, em São Paulo, e colaboração para o UOL, em Curitiba

26/09/2018 11h08Atualizada em 26/09/2018 16h42

A PF (Polícia Federal) prendeu nesta quarta-feira (26) em Curitiba o irmão do ex-governador do Paraná Beto Richa (PSDB) em nova etapa da Operação Lava Jato. Ex-secretário de Infraestrutura e Logística do Paraná, José Richa Filho, conhecido como Pepe Richa, teve a prisão temporária decretada (com duração de cinco dias). Um primo de Richa teve a prisão preventiva decretada (ele não foi detido porque viajou para o Líbano).

Os alvos têm relação com casos de corrupção envolvendo a concessão de rodovias federais no Paraná. Segundo a Lava Jato, autoridades do governo paranaense desde 1999 praticaram atos de ofício em benefício das concessionárias e exerciam influência política junto a órgãos técnicos.

De acordo com o MPF, Beto Richa seria um dos beneficiários finais do esquema, embora não seja alvo dessa investigação. Batizada de "Integração 2", a 55ª fase da Lava Jato é derivada de ação realizada em fevereiro. O candidato ao Senado pelo PSDB teria recebido, segundo a Lava Jato, recursos via seu primo, o empresário Luiz Abi Antoun --detido nesta quarta. Segundo a Lava Jato, Beto Richa teria cobrado o primo em reunião no Palácio Iguaçu em 2014.

De acordo com os investigadores, o ex-secretário Pepe Richa usou R$ 500 mil de propina para a compra de um terreno em Balneário Camboriú (SC). “A utilização de dinheiro em espécie para pagar por imóveis que são registrados por um valor inferior ao negociado configura uma forma clássica de lavagem de dinheiro utilizando o mercado imobiliário, e já foi vista inclusive em outros casos na Operação Lava Jato”, pontuou o procurador da República Diogo Castor de Mattos.

Um ex-chefe de gabinete de Beto Richa, que governou o Paraná entre 2011 e 2018, foi alvo de operação da Lava Jato no começo do mês. Na ocasião, era apurado o pagamento de propina no valor R$ 3,5 milhões por parte da Odebrecht a agentes públicos e privados no Paraná. O objetivo era ganhar a licitação para investimento na duplicação, manutenção e operação de uma rodovia estadual. No mesmo dia, ele, o irmão e o primo foram presos por conta de outra investigação, liderada pelo MP estadual, mas foram libertados, por decisão do ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Gilmar Mendes dias depois. Pepe também foi solto na mesma ocasião.

Ao todo, a PF cumpriu nesta quinta três mandados de prisão preventiva, 16 mandados de prisão temporária e 73 mandados de busca e apreensão em Curitiba, Ponta Grossa, Irati, Maringá, Londrina e São Paulo. Desse total, 11 mandados foram cumpridos em Curitiba, quatro fora da capital paranaense, três pessoas não foram localizadas e uma delas está no exterior.

A ação visa aprofundar as investigações sobre a prática de crimes de corrupção, lavagem de dinheiro, sonegação fiscal, estelionato e peculato em esquema relacionado à administração das rodovias federais no Paraná.

Segundo as investigações, mensalmente, as seis concessionárias do Anel de Integração do Paraná (Econorte, Ecovia, Ecocataratas, Rodonorte, Viapar e Caminhos do Paraná) rateavam um pagamento de R$ 120 mil em propina proporcionalmente ao faturamento de cada uma delas e que foi atualizado de acordo com os reajustes do pedágio, chegando a R$ 240 mil por mês. Os pagamentos teriam ocorrido até janeiro deste ano.

Os valores eram pagos a agentes públicos do DER-PR (Departamento de Estradas de Rodagem), subordinada à secretaria administrada por Pepe Richa, e, depois de 2011 --o esquema segundo a Lava Jato acontece desde 1999--, a funcionários da Agepar (Agência Reguladora do Paraná), que controla serviços públicos concedidos. Segundo a investigação, os pagamentos eram efetuados em dinheiro em espécie por emissários na sede das concessionárias na ABCR (Associação Brasileira de Concessionária de Rodovias) a agentes do DER e da Agepar.

Os grupos suspeitos simulavam ou superfaturavam a prestação de serviços com empresas envolvidas --estima-se que cerca de 70 companhias participaram do esquema--, além de maquiar suas taxas de retorno.

Segundo o MPF, Antoun recebia vantagens indevidas do DER e centralizava o "caixa ilícito" de Beto Richa.

De acordo com o MPF, desde 1999, operadores financeiros que simulavam a prestação de serviços movimentaram ao menos R$ 130 milhões em faturamento de notas frias para concessionárias. A Lava Jato estima no período pagamento de propina a agentes públicos no valor de cerca de R$ 35 milhões.

Para Lava Jato, o esquema revelado levanta suspeita de que as descobertas relativas às concessionárias que operavam pedágios em rodovias federais no Paraná possam se estender a outros estados porque muitas das empresas citadas na operação têm atuação nacional. Segundo o procurador, a fraude em empresas de pedágio mostra o impacto da corrupção na vida da população, com reflexos no frete de produtos que rodaram nas estradas paranaenses (e ficam mais caros nas prateleiras dos supermercados), nos acidentes causados em rodovias que deveriam ter sido duplicadas, assim como o valor adicional pago nas cancelas do pedágio por quase duas décadas.

Lava Jato: esquema pode ter atravessado 3 governos

Segundo o MPF, o esquema de propinas teve início em 1999 --os procuradores dizem que vão aprofundar investigações nas gestões dos últimos três governadores do estado (além de Richa, Jaime Lerner --ex-PFL e atualmente sem partido-- e Roberto Requião --MDB).

Segundo delação de colaboradores, o esquema nunca deixou de funcionar, exceto em 2015, após temor causado pelo início da Lava Jato, em 2014. Para o procurador Mattos, esse tipo de situação comprova o fato de a Lava Jato ser uma investigação apartidária.

"Ultimamente, temos sido acusados de partidarismo, querendo dizer que estamos influenciando os pleitos eleitorais. Temos ciência de que o último governador [Beto Richa] sabia e teria se beneficiado. Em relação a outros governos, a investigação deve ser aprofundada, porque geralmente esses esquemas se estendem da área técnica à política”, diz Mattos.

O advogado de Lerner, Cid Campelo Filho, afirmou que os procuradores estão “buscando pelo em ovo, pois não houve corrupção na época do Jaime Lerner”.

Já Requião, que disputa uma vaga ao Senado, afirmou que não houve menção ao nome dele no despacho do juiz e que os corruptos foram presos “antes tarde do que nunca”. “Requião vem denunciando a corrupção no pedágio desde que ele foi criado e tomou as medidas que poderia tomar. Foram movidas cerca de 40 ações judiciais que nunca foram acolhidas pelo Judiciário”, afirmou, por meio de nota enviada por sua assessoria. “Além disso, Requião nunca autorizou reajuste que as concessionárias pediram”, ressaltou.

Outro lado

Por meio de nota, Beto Richa disse que "nunca foi condescendente com desvios de qualquer natureza e é o maior interessado na investigação de quaisquer irregularidades". Sua assessoria de imprensa afirma que ele "segue confiando na Justiça e tem a certeza que o devido processo legal provará sua inocência".

Já a defesa de Pepe Richa afirmou que ele nunca foi chamado pela Polícia Federal para esclarecer quaisquer fatos relativos à operação de hoje. Os advogados dizem ter pedido acesso aos autos que, segundo eles, estariam sob sigilo na 23ª Vara Federal. "O ex-secretário seguirá colaborando com a Justiça e confia que sua inocência restará provada na conclusão do processo", afirma nota da defesa.

A defesa do Luiz Abi Antoun afirma que vai se manifestar quando tiver acesso ao processo.

A ABCR disse que contribui com as autoridades para fornecer as informações necessárias. "Até o momento, a associação não teve acesso aos autos do processo", afirmou.

Por meio de nota, a Viapar afirmou que "sempre cumpriu todas as regras legais e está comprometida em atender ao contrato de concessão, de forma ética e transparente". A concessionária diz que está à disposição da autoridade para esclarecimentos.

A Ecovia e a Ecocataratas também dizem que estão colaborando com as autoridades e afirmam "compromisso com a transparência e a ética em todas as suas relações profissionais".

A CCR, da qual a Rodonorte faz parte, informa que tem contribuído com as autoridades para esclarecer todos os pontos relativos à operação de hoje. A concessionária disse também que, em fevereiro, quando surgiram denúncias envolvendo o grupo, o conselho de administração da companhia constituiu um comitê independente para conduzir investigação de todos os fatos relacionados.

A concessionária Caminhos do Paraná lamentou e considerou "desnecessária" a prisão de José Julião Terbai Junior, diretor-presidente, e Ruy Sergio Giublin, ex-diretor-presidente da companhia. Segundo nota, ambos "possuem reputação ilibada ao longo de mais de 30 anos de atuação no setor de engenharia, no Brasil e no exterior". A Caminhos do Paraná diz que "reforça seu compromisso com a transparência e a integridade e está colaborando com a Justiça, prestando todos os esclarecimentos solicitados e visando a completa elucidação dos fatos".

A Agepar informa que as denúncias "se referem a condutas individuais imputadas a agentes e não podem ser consideradas como elemento que comprometa o trabalho da Agepar enquanto instituição reguladora". Segundo o órgão, a agência vai se pronunciar após tomar ciência do processo.

Por determinação da governadora Cida Borghetti (PP), a Secretaria de Estado de Infraestrutura e Logística e o DER-PR informam que estão colaborando com a 55ª fase da Operação Lava Jato. Por meio de nota, o governo paranaense disse "não tolerar práticas de corrupção". Em junho, segundo a nota, todas as concessionárias foram notificadas que os seus contratos não serão renovados.

Em nota, o governo do Paraná disse que determinou a exoneração de todas as pessoas que ocupam cargos em órgãos do estado e foram alvo de prisão ou de mandados de busca e apreensão. A administração também instaurou um processo administrativo contra os servidores citados na investigação.