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Bolsonaro exonera equipe de combate à tortura; órgão diz que vai recorrer

Presídios do Ceará sofrem com superlotação carcerária e estrutura deficitária - Divulgação/OAB-CE
Presídios do Ceará sofrem com superlotação carcerária e estrutura deficitária Imagem: Divulgação/OAB-CE

Leandro Prazeres e Igor Melo

Do UOL, em Brasília e no Rio de Janeiro

11/06/2019 12h52Atualizada em 11/06/2019 18h27

O presidente Jair Bolsonaro (PSL) exonerou hoje os onze integrantes do MNPCT (Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate à Tortura), um grupo do governo federal que monitora violações de direitos e atua para prevenir a prática de tortura em instituições como penitenciárias. De acordo com o decreto, o grupo agora passa a ser formado apenas por participantes não remunerados.

Recém-exonerado, o ex-coordenador da entidade, Daniel Melo, afirma que essa mudança inviabiliza o funcionamento do órgão. O presidente do CNDH (Conselho Nacional de Direitos Humanos), Leonardo Pinho, disse que vai recorrer à Justiça contra a medida.

A reportagem procurou a Presidência da República e o MMFDH (Ministério da Mulher, Família e Direitos Humanos) - órgão ao qual o mecanismo estava vinculado. O ministério afirmou que "os cargos em comissão foram extintos, mas a função de perito permanece, com as mesmas prerrogativas pela prestação do serviço público de peritos, podendo atuar normalmente, com independência funcional suficiente para a realização das perícias, o que não foi, nem de longe, alterado pelo novo decreto".

O MNPCT é um grupo criado em 2013 que faz estudos e relatórios sobre violações de direitos humanos no país. Foram eles, por exemplo, que elaboraram relatórios sobre a situação de presídios como o Compaj (Complexo Penitenciário Anísio Jobim), no Amazonas, onde 111 presos foram mortos em massacres entre 2017 e 2019.

Para o agora ex-coordenador do mecanismo, a exoneração do grupo é uma retaliação à atuação da instituição. "Essa é uma retaliação clara à forma como nós vínhamos atuando. O mecanismo vem, há anos, revelando a prática sistemática da tortura no Brasil", afirmou.

O decreto assinado por Bolsonaro exonera a atual equipe, mas mantém o mecanismo em funcionamento no papel. Segundo o decreto, a partir de agora, o grupo será formada por integrantes não remunerados. Para Melo, essa mudança equivale, na prática, à "extinção" do mecanismo.

"O trabalho do grupo fica inviabilizado se for feito com membros voluntários e não remunerados. O formato do mecanismo precisa de estrutura, de pessoas que possam se dedicar exclusivamente para esse trabalho. Isso garante autonomia, independência para receber e apurar denúncias", disse.

Leonardo Pinho disse que o CNDH vai recorrer ao MPF (Ministério Público Federal) e à DPU (Defensoria Pública da União) para barrar o decreto de Bolsonaro.

Segundo uma fonte com atuação na área, o MPF (Ministério Público Federal) e a DPU (Defensoria Pública da União) devem recorrer à Justiça para barrar a medida. As cúpulas dos dois órgãos ainda discutem qual será a medida jurídica adotada, mas nas instituições há a leitura de que a via judicial é a única possível para reverter a situação.

A Human Rights Watcht também se manifestou por meio de nota. "Na prática, o decreto não só enfraquece como pode inviabilizar a atuação do Mecanismo, pois dependerá da atuação de voluntários que, além disso, não poderão ter vinculação com organizações da sociedade civil e acadêmicas que atuam na área do combate à tortura e participam no Comitê Nacional de Prevenção e Combate à Tortura", diz a entidade.

Errata: este conteúdo foi atualizado
Diferentemente do publicado, o decreto foi assinado pelo presidente Jair Bolsonaro (PSL), sem a participação do ministro da Justiça e Segurança Pública, Sergio Moro. O texto foi corrigido.