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Brasil e Paraguai apuram se 'doleiro dos doleiros' interferiu em processos

Dario Messer foi preso pela PF no apartamento em que se escondia em São Paulo Imagem: Reprodução

Vinicius Konchinski

Colaboração para o UOL, em Curitiba

06/09/2019 04h03Atualizada em 06/09/2019 15h35

Conhecido como o "doleiro dos doleiros", Dario Messer é investigado no Brasil desde a década de 1980 por suspeitas de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Apesar disso, nunca havia passado uma noite sequer na prisão até ser detido no final do mês de julho, em São Paulo, após ficar mais de um ano foragido.

A forma como Messer garantiu sua liberdade por todos esses anos é, agora, motivo de investigações. Tanto no Brasil como no Paraguai ?onde o doleiro também mantinha muitos negócios?, há investigações sobre uma possível influência dele no andamento de apurações sobre crimes atribuídos a ele e também sobre o andamento de processos judiciais dos quais ele foi parte.

No Brasil, essa investigação está a cargo do MPF-RJ (Ministério Público Federal do Rio de Janeiro) e corre sob sigilo. A apuração foi motivada por depoimentos de dois doleiros presos na Lava Jato que disseram em 2018 ter trabalhado para Messer num esquema de lavagem de US$ 1,6 bilhão (cerca de R$ 6,5 bilhões) entre 2010 e 2016.

Vinícius Claret, conhecido como Juca Bala, e Cláudio de Souza, o Tony, declararam em suas delações premiadas que pagaram US$ 50 mil (mais de R$ 200 mil) por mês de 2006 a 2013 para livrar Messer de ações da PF (Polícia Federal) e Ministério Público. Os pagamentos da "taxa de proteção" teriam sido feitos ao advogado criminalista Antonio Figueiredo Basto, de Curitiba.

Basto, que ficou famoso por ter fechado alguns dos mais importantes acordos de delação premiada no início da Lava Jato, no Paraná, negou ter recebido qualquer pagamento de Claret e Souza em entrevista ao UOL. Disse que a ideia da existência da tal taxa de proteção é "absurda e repugnante".

Ele admitiu, contudo, ter trabalhado para Messer de 2009 a 2014. O advogado defendeu o doleiro num processo no qual ele foi acusado de lavar dinheiro para empresários corruptos do Rio.

Messer acabou absolvido das acusações contra ele em 2016 pela juíza federal Gabriela Hardt, a mesma que condenou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva por corrupção no caso do sítio de Atibaia. A absolvição do doleiro seguiu recomendação do MPF-PR (Ministério Público Federal do Paraná).

Acusado no Rio, inocentado no Paraná

O processo no qual Messer foi absolvido no Paraná começou no Rio de Janeiro.

Em 2009, o MPF-RJ realizou a operação Sexta-Feira Treze e pediu a prisão de Messer, por facilitar o envio de recursos oriundos de corrupção para o exterior. A prisão do doleiro foi decretada. Ele, porém, não foi encontrado na ocasião.

Mais tarde, Messer foi denunciado pelo MPF-RJ. A denúncia contra ele foi aceita e seu processo passou a correr na Justiça Federal do Rio de Janeiro.

Figueiredo Basto, porém, percebeu que duas das três contas citadas no processo contra Messer no Rio já eram tema de investigações paranaenses no caso Banestado. Ele, então, foi ao STJ (Superior Tribunal de Justiça) pedir que parte do processo de Messer fosse transferido para a Justiça Federal do Paraná.

Num julgamento que até hoje segue sob sigilo, o STJ acatou o argumento de Basto em 2014. Logo após a decisão, ele deixou a defesa do doleiro.

Com a transferência do processo de Messer do Rio para o Paraná, a responsabilidade da acusação contra o doleiro passou do MPF-RJ para o MPF-PR. Contrariando a denúncia contra Messer feita pelo MPF-RJ, o MPF-PR recomendou a absolvição por não ver dúvidas sobre a participação dele nos crimes em 2015.

A peça do MPF-PR é assinada pelo procurador federal Alexandre Melz Nardes. Procurado pelo UOL, Nardes não quis dar entrevista.

Após a recomendação do MPF-PR, a juíza Hardt absolveu Messer "por falta de provas". A juíza não respondeu aos pedidos de entrevista do UOL.

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A decisão da juíza contrariou a expectativa inicial do MPF-RJ. "É claro que, quando você denuncia alguém, espera a condenação", disse o procurador federal José Augusto Vagos, integrante da força-tarefa da Lava Jato, que voltou a denunciar Messer em 2018. "Mas, diante das provas, é comum o próprio MP que denunciou pedir absolvição."

Apesar disso, Vagos disse que todos os fatos citados em delações premiadas negociadas com o MPF-RJ serão investigados. Ele, contudo, não falou sobre linhas de investigação a respeito da possível proteção a Messer, pois o caso corre sobre sigilo.

."Temos centenas de investigações correndo simultaneamente. Estamos trabalhando dentro do que é humanamente possível", disse. "Posso lhe garantir que, na Lava Jato do Rio, existe a absoluta certeza de que tudo será investigado."

A parte do processo de Messer que não foi transferida do Rio para o Paraná segue em tramitação na Justiça Federal fluminense. Não há sentença.

Ileso no caso Banestado

Apesar de parte da denúncia contra Messer ter sido transferida para o Paraná justamente por conta de uma possível relação com o caso Banestado, o doleiro nunca foi formalmente acusado por sua suposta participação no esquema, que teria movimentado US$ 30 bilhões (mais de R$ 120 milhões).

Messer chegou a ser citado em depoimentos de doleiros na Justiça e em CPIs (Comissões Parlamentares de Inquérito). Antonio Oliveira Claramunt, o Toninho da Barcelona, e até Alberto Youssef falaram que Messer operava contas investigadas.

Questionado sobre investigações contra Messer no caso Banestado, o MPF-PR afirmou que "os investigados que tiveram condutas ilícitas verificadas e devidamente comprovadas foram denunciados e processados".

Sobre uma possível proteção a Messer citada nas delações premiadas, o MPF-PR informou que "não há referência direta nos depoimentos dos colaboradores de suposta proteção do MP, mas apenas do então advogado do investigado". "Trata-se de apuração que tramita no MPF-RJ", complementou o órgão.

Juíza investigada no Paraguai

Já no Paraguai, as suspeitas sobre uma possível influencia de Messer recaem sobre a juíza María Griselda Caballero. Foi ela quem recebeu em maio de 2018 o aviso da Interpol de que o doleiro era procurado pela Justiça do Brasil.

O pedido de prisão do doleiro havia sido expedido pela Justiça Federal do Rio, de novo por requisição do MPF-RJ. Messer não foi encontrado no Brasil e, naquela época, era grande a suspeita de que ele estava no Paraguai, país do qual chegou a ser cidadão.

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A juíza Caballero recebeu o aviso de busca de Messer às 17h50 do dia 3 de maio de 2018. O Ministério Público do Paraguai havia recomendado que ela determinasse de imediato buscas nos endereços de Messer no país vizinho. A juíza, entretanto, não viu urgência no caso.

Caballero deixou que o processo corresse seguindo trâmites ordinários. No dia seguinte, um juíz sorteado, Tadeo Fernández, analisou o caso e ordenou as buscas. A casa do doleiro só foi visitada por policiais no outro dia, 45 horas depois do alerta da Interpol chegar ao país.

A conduta da juíza Caballero no caso acabou virando tema de uma investigação da corregedoria do Judiciário do Paraguai. Caballero renunciou ao cargo de juíza e a investigação administrativa contra ela foi arquivada.

Quase um ano depois, em abril de 2019, uma CPMI (Comissão Parlamentar Mista de Inquérito) realizada no Congresso do Paraguai concluiu que a juíza favoreceu Messer ao não assinar seu pedido de prisão no Paraguai. O caso foi enviado ao Ministério Público local, que não se pronunciou sobre o andamento da investigação.

O UOL não conseguiu contato com a juíza Caballero. Os advogados de Messer no Paraguai não responderam à reportagem.

No Brasil, a defesa de Messer alega que ele é inocente de todas as acusações. Nega também qualquer influência do doleiro na tramitação de processo contra ele e em investigações de órgãos de controle brasileiros.

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