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Operação Lava Jato

"Foge à regra da Lava Jato": a procuradora que pediu desculpas a Lula

A procuradora da Republica Jerusa Viecili na Superintêndencia da Policia Federal em Curitiba - Geraldo Bubniak/AGB
A procuradora da Republica Jerusa Viecili na Superintêndencia da Policia Federal em Curitiba Imagem: Geraldo Bubniak/AGB

Vinicius Konchinski

Colaboração para o UOL, em Curitiba

08/09/2019 04h02

A procuradora da República Jerusa Viecili rompeu o padrão de comportamento de membros da operação Lava Jato com uma postagem no twitter no último dia 27. "Errei", admitiu ela, em seu perfil na rede social.

Horas antes, o UOL, em parceria com o The Intercept Brasil, publicara uma reportagem sobre ironias de integrantes da força-tarefa a respeito da morte da ex-primeira-dama Marisa Letícia e do luto do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT). Procurados, ninguém da Lava Jato havia se pronunciado sobre o conteúdo das mensagens divulgados na matéria.

Viecili quebrou o silêncio em um post no Twitter.

Além da manifestação pública, a postagem serviu, por exemplo, para confirmar a autenticidade das conversas vazadas, o que até então nunca havia sido admitido pela Lava Jato. Não chegou, entretanto, a causar espanto naqueles que conhecem Viecilli pessoalmente.

Perfil moderado

Quem acompanha o trabalho da procuradora, por exemplo, diz que ela sempre mostrou-se um pessoa moderada. Deixava essa característica aparecer até em negociações de acordos de delação premiada com criminosos confessos e em denúncias feitas pelo MPF-PR (Ministério Público Federal do Paraná) sobre casos de corrupção que ela investigou.

"Sempre foi ponderada", disse um advogado ouvido pelo UOL. "Foge à regra da Lava Jato."

Contrária à disputa política dualista entre direita e esquerda, a procuradora também manifesta-se com frequência na internet a favor do diálogo, do respeito e do amor. Um mês antes de pedir desculpas a Lula, ela chegou a compartilhar uma entrevista com a jornalista e escritora espanhola Pilar del Río pedindo reflexão contra a violência e a favor da humanização.

Del Río esteve no Brasil para participar da Flip (Festa Literária Internacional de Paraty) e visitar Lula na prisão, em Curitiba.

Viecili integra a Lava Jato desde março de 2016. Hoje, porém, já não mora mais na capital do Paraná, e sim em Porto Alegre.

Em julho de 2018, a PGR (Procuradoria-Geral da República) determinou que ela passasse a dividir seu atenção entre a Lava Jato e investigações no Rio Grande do Sul. Lá, um dia depois de pedir desculpas a Lula, Viecili denunciou 32 pessoas por fraudes envolvendo bolsas de estudo na UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul).

Gaúcha, gremista e feminista

Viecili nasceu em Ijuí (RS), cidade cerca de 83 mil habitantes. Formou-se em direito na UFSM (Universidade Federal de Santa Maria) em 2002 e virou assessora da Justiça gaúcha logo após deixar a faculdade. Um ano depois, passou no concurso do MPF e virou procuradora federal.

Desde o início de sua carreira, participou de investigações sobre corrupção. Em 2007, atuou na Operação Rodin, que denunciou fraudes no Detran do Rio Grande do Sul. Especializou-se também em casos de direito ambiental, um de seus grandes temas de interesse.

Em seu perfil no Twitter, são várias as postagens em defesa da preservação do meio ambiente. São muitas também as postagens sobre feminismo, nas quais Viecili se pronuncia claramente em favor da igualdade de oportunidades entre homens e mulheres, e sobre futebol, umas de suas paixões.

Críticas ao STF e Bolsonaro

A procuradora costuma se manifestar sobre assuntos relacionados ao seu trabalho e até sobre a política. Além de defender a Lava Jato, Viecili se colocou a favor do respeito à lista tríplice para nomeação de um novo chefe da PGR, em favor do veto do chamado projeto de lei contra o abuso de autoridade e da utilização de informações da Receita Federal em investigações.

Nesta semana o presidente Bolsonaro sancionou o projeto de lei e nomeou o novo procurador-geral, ignorando a lista de indicados pelo MPF.

Suas posições em defesa do fortalecimento do combate à corrupção já a colocaram em rota de colisão com o STF (Supremo Tribunal Federal). Viecilli mostrou preocupação com a decisão do ministro Dias Toffoli que determinou a suspensão de investigações que contenham dados compartilhados pelo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).

Ela também já demonstrou insatisfação com ações do presidente Jair Bolsonaro (PSL). No último dia 23, por exemplo, ela publicou duas notícias relacionadas à autonomia do ex-juiz da Lava Jato, Sergio Moro, no Ministério da Justiça.

Na primeira, de novembro do ano passado, Bolsonaro prometia "carta branca" a Moro. Já na segunda, de agosto, o presidente dizia que era ele, não Moro, o responsável pela indicação do diretor-geral da PF (Polícia Federal). "Nada como um dia após o outro", comentou a procuradora.

As críticas mais pesadas a Bolsonaro, contudo, foram feitas quando o presidente ordenou que o Ministério da Defesa providenciasse comemorações ao Golpe de 1964. "Não pode ser verdade! Comemorar a ditadura?", escreveu.

Sobre Lula, Viecili pouco postou. Divulgou a segunda condenação criminal do ex-presidente pelo caso do sítio de Atibaia obtida após denúncia da Lava Jato e ironizou a decisão de Ricardo Lewandowski, do STF, que autorizou a entrevista do ex-presidente, da cadeia, durante a campanha eleitoral de 2018.


A decisão, mais tarde, foi cassada. A entrevista de Lula só ocorreu neste ano, depois da posse de Jair Bolsonaro.

Viecili foi procurada pelo UOL por diversas vezes nos últimos dias para falar sobre seu pedido de desculpas ao ex-presidente. Por meio de um interlocutor próximo a ela, agradeceu a atenção e a oportunidade. Não quis, no entanto, falar com a reportagem.

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