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Com decisão sobre 2ª instância, STF impõe nova derrota à Lava Jato

Abertura do terceiro dia de julgamento sobre a validade da prisão em segunda instância no Supremo Tribunal Federal (STF) - Fábio Rodrigues Pozzebon/Agência Brasil
Abertura do terceiro dia de julgamento sobre a validade da prisão em segunda instância no Supremo Tribunal Federal (STF) Imagem: Fábio Rodrigues Pozzebon/Agência Brasil

Felipe Amorim

Do UOL, em Brasília

07/11/2019 21h38

Os ministros do STF (Supremo Tribunal Federal) decidiram hoje alterar o entendimento fixado há quatro anos pelo tribunal e passaram a proibir a execução da pena após condenação em segunda instância.

Agora, os réus poderão aguardar em liberdade até o esgotamento de todos os recursos judiciais, o chamado trânsito em julgado do processo. O julgamento também deverá beneficiar o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), preso desde abril do ano passado pelo processo do tríplex em Guarujá (SP).

A decisão colocou o Supremo mais uma vez em campo oposto ao de parte do MPF (Ministério Público Federal), órgão responsável por investigações, como as da Operação Lava Jato, e por representar a acusação nos processos judiciais que tramitam na Justiça Federal.

Desde o início da operação, o STF tem emitido decisões que ajudaram a moldar os limites das investigações criminais no país e, com frequência, foram alvo de críticas de membros do Ministério Público.

Na corrente favorável às posições do Supremo, o argumento é o de que o tribunal tem atuado para garantir o direito de defesa dos réus e evitar abusos dos acusadores.

Veja as principais decisões do STF sobre temas que tiveram impacto nas investigações:

Alegações finais

Em setembro, a maioria dos ministros do Supremo entendeu que, nos processos com delações premiadas, os delatores devem apresentar alegações finais antes dos outros réus que foram incriminados por eles. As alegações finais são a última manifestação dos réus e da acusação antes da sentença.

Esse entendimento pode levar à revisão de sentenças em processos da Lava Jato e em outros "milhares" de casos, segundo afirmou no julgamento o procurador-geral da República interino, Alcides Martins.

O julgamento deverá ser retomado para que os ministros especifiquem em quais hipóteses os réus que estão nessa situação poderão pedir a revisão da sentença. A derrubada da condenação não leva à absolvição diretamente, mas sim ao retorno do processo à fase de alegações finais e a um novo julgamento.

Sete dos 11 ministros votaram a favor de anular condenações que não seguiram essa ordem nas alegações finais. Votaram assim os ministros Alexandre de Moraes, Rosa Weber, Cármen Lúcia, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli.

Quatro ministros votaram contra anular as condenações: Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e Marco Aurélio Mello.

Investigações utilizando dados do Coaf

Em julho, o presidente do STF, ministro Dias Toffoli, atendendo a pedido da defesa do senador Flávio Bolsonaro (PSL-SP), determinou a suspensão de todas as investigações que utilizaram sem ordem judicial dados detalhados de instituições fiscais, como Receita Federal, Banco Central e o antigo Coaf (Conselho de Controle de Atividades Financeiras).

O governo do presidente Jair Bolsonaro (PSL), pai de Flávio, rebatizou o Coaf como UIF (Unidade de Inteligência Financeira) e transferiu o órgão de controle do Ministério da Economia para o Banco Central.

A decisão de Toffoli paralisou ao menos 700 investigações e processos judiciais no âmbito do MPF (Ministério Público Federal), segundo levantamento divulgado pela PGR (Procuradoria-Geral da República). A medida atingiu principalmente investigações sobre crimes contra a ordem tributária (307 casos), como sonegação, e as relativas à lavagem de dinheiro (151 casos), incluídas as ligadas a esquemas de corrupção.

A decisão de Toffoli deverá ser julgada pelo plenário do STF no próximo dia 21.

Na ocasião, os ministros vão debater se mantêm a paralisação das investigações e, principalmente, quais devem ser as regras para o compartilhamento de informações entre as autoridades financeiras e órgãos de investigação, como a polícia e o Ministério Público.

Investigações na Justiça Eleitoral

Em março, o STF decidiu, por 6 votos a 5, que processos da Operação Lava Jato que envolvem crimes comuns, como corrupção, quando estão associados a crimes eleitorais, como caixa dois, devem tramitar na Justiça Eleitoral.

A decisão representou uma derrota para procuradores da força-tarefa da Lava Jato no MPF (Ministério Público Federal), que defendiam que processos desse tipo fossem divididos e os crimes comuns permanecessem na Justiça Federal, onde tramita a maior parte das investigações da operação.

Votaram a favor da competência da Justiça Eleitoral para julgar os crimes comuns os ministros Marco Aurélio Mello, Alexandre de Moraes, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Celso de Mello e Dias Toffoli.

Os ministros Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Rosa Weber, Luiz Fux e Cármen Lúcia foram favoráveis à separação dos processos, com o envio da parte eleitoral à Justiça Eleitoral e a remessa dos crimes comuns à Justiça Federal.

Conduções coercitivas

Em junho de 2018, o STF decidiu, por 6 votos a 5, proibir a determinação por juízes de conduções coercitivas para interrogatório de investigados, medida que vinha sendo adotada em investigações como as da Operação Lava Jato.

Votaram contra as conduções coercitivas os ministros Gilmar Mendes, Rosa Weber, Dias Toffoli, Ricardo Lewandowski, Marco Aurélio Mello e Celso de Mello. Já Alexandre de Moraes, Edson Fachin, Luís Roberto Barroso, Luiz Fux e a então presidente Cármen Lúcia votaram a favor da prática.

A condução coercitiva ocorre quando um juiz determina que pessoas sejam levadas por autoridades para prestar depoimento independentemente de sua vontade.

A prática está prevista no Código de Processo Penal quando "o acusado não atender à intimação para o interrogatório, reconhecimento ou qualquer outro ato que, sem ele, não possa ser realizado". Mas muitas vezes os juízes determinavam a condução mesmo sem ter havido a negativa prévia de comparecer ao depoimento.

A decisão do STF se aplica apenas às conduções realizadas para interrogar o investigado, e não atingiu outras hipóteses em que a prática é possível, como para confirmar a identidade de um suspeito.

Afastamento do mandato

Em 2017, após o senador Aécio Neves ter sido gravado pedindo R$ 2 milhões à JBS, o plenário do STF decidiu que medidas judiciais que afetem o mandato dos parlamentares podem ser revistas pelo Legislativo.

Aécio chegou a ser afastado do exercício do mandato por decisão da Primeira Turma do STF, colegiado formado por cinco dos 11 ministros. A decisão gerou tensão entre o Supremo e o Senado.

A possibilidade de o Legislativo derrubar decisões judiciais que interfiram no mandato foi então levada a julgamento pelo plenário do STF, onde a hipótese foi referendada por 6 votos a 5.

Após a decisão do plenário do Supremo, o Senado revogou o afastamento de Aécio do mandato determinado pela Primeira Turma do STF.

Aécio, que sempre negou qualquer irregularidade nesse caso, é hoje deputado federal.

Fatiamento da Lava Jato

Em 2015 o plenário do STF decidiu que os casos que não tem relação direta com desvios na Petrobras, alvo original da Lava Jato, não deveriam ser julgados pela 13ª Vara Federal de Curitiba, onde estão concentrados os processos da operação.

Nesse julgamento também ficou decidido que só seriam processados no Supremo os políticos com foro privilegiado e que os processos dos demais investigados seriam remetidos à primeira instância, como é o caso da 13ª Vara de Curitiba.

A decisão de 2015 foi um importante precedente para que já em 2018 diversos trechos da delação da Odebrecht fossem retirados do então juiz Sergio Moro, que atuou na 13ª Vara Federal.

Por exemplo, em agosto do ano passado a Segunda Turma do STF decidiu, por 3 votos a 1, enviar à Justiça do Distrito Federal os depoimentos de seis delatores que acusavam o ex-presidente Lula e o ex-ministro Guido Mantega em um suposto esquema de repasses ilegais ao PT.