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Coaf: o que pode acontecer com investigações que miram Flávio Bolsonaro

O senador Flávio Bolsonaro (sem partido) - Fátima Meira/Futura Press/Estadão Conteúdo
O senador Flávio Bolsonaro (sem partido) Imagem: Fátima Meira/Futura Press/Estadão Conteúdo

Felipe Amorim

Do UOL, em Brasília

04/12/2019 20h11Atualizada em 04/12/2019 20h20

A decisão do STF sobre as regras de uso de dados fiscais e bancários sigilosos em investigações criminais terá impacto direto em centenas de investigações em todo o país, sendo a mais rumorosa delas a que envolve o senador Flávio Bolsonaro (sem partido-RJ), filho do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Flávio passou a ser investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro após relatório do Coaf apontar movimentações suspeitas ligadas a seu gabinete quando ele era deputado no Rio.

Hoje o STF (Supremo Tribunal Federal) concluiu o julgamento sobre o compartilhamento de informações de órgãos de controle financeiro, como a Receita Federal e o antigo Coaf, rebatizado de UIF (Unidade de Inteligência Financeira), com o Ministério Público e as polícias.

O Supremo considerou legal o envio de dados, com a ressalva de que seja feito somente por comunicações formais, sob sigilo e com a possibilidade de fiscalização posterior da Justiça sobre eventuais irregularidades.

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O aval do STF ao envio de informações pelo Coaf abre caminho para que a apuração sobre Flávio seja retomada, depois de a defesa do parlamentar ter obtido com um recurso ao STF a paralisação as investigações em julho, que agora perde o efeito.

Pelo menos outras 935 investigações do MPF (Ministério Público Federal) também ficaram paralisadas, à época, com a decisão de presidente do Supremo, Dias Toffoli.

A defesa de Flávio ainda pode recorrer na Justiça contra pontos da investigação que ela considerar irregulares. O processo corre sob sigilo.

Isso faz com que um eventual novo recurso do senador leve a Justiça a analisar especificamente as investigações contra ele, agora sob os efeitos da decisão recente do STF. Um novo recurso da defesa poderia chegar a ser analisado pelo Supremo, última instância do Judiciário.

Os principais argumentos da defesa de Flávio:

  • A pedido do Ministério Público, o Coaf enviou dados bancários e financeiros de Flávio sobre um período de mais de dez anos, o que equivale a uma quebra de sigilo bancário
  • Após solicitação da Promotoria, o Coaf pediu que os bancos complementassem informações que não estavam nos relatórios, o que não seria permitido
  • O Ministério Público trocou informações com o Coaf por e-mail, o que também não seria regular

Quais regras o STF definiu hoje:

  • É constitucional o compartilhamento dos relatórios de inteligência financeira da UIF e da íntegra do procedimento fiscalizatório da Receita com as polícias e o Ministério Público, sem a obrigatoriedade de prévia autorização judicial
  • Deve ser resguardado o sigilo das informações e as investigações estão sujeitas a controle posterior da Justiça
  • O compartilhamento de relatórios financeiros pela UIF e pela Receita deve ser feito por um sistema oficial de comunicação, com garantia de sigilo e instrumentos que permitam apurar eventuais irregularidades.

Ainda não está claro, sobre o caso de Flávio, como o Judiciário pode interpretar esses pontos da investigação contra o senador:

  • As informações enviadas pelo Coaf estavam dentro do legalmente permitido?
  • O pedido do Ministério Público aos bancos serviu apenas a esclarecimentos pontuais sobre informações previamente enviadas ou representou uma quebra de sigilo?
  • A comunicação entre o Ministério Público e o Coaf seguiu as regras de segurança e sigilo exigidas pelo STF?

Responsável pelas investigações contra o senador, o Ministério Público do Rio de Janeiro afirmou que a apuração cumpriu "rigorosamente" a legislação. A afirmação foi feita em nota divulgada após o início do julgamento no STF.

Segundo o MP-RJ:

  • Após o primeiro relatório, o Ministério Público pediu complementações de informação ao Coaf, o que é permitido
  • Toda a comunicação entre o Ministério Público e o Coaf foi feita por meio do sistema do próprio Coaf
"Toda a movimentação que envolve a remessa de RIFs [Relatórios de Inteligência Financeira] se dá de forma padronizada para todos os órgãos de fiscalização, fato que pode ser confirmado junto ao Coaf. Dessa forma, portanto, não há a possibilidade de solicitação nem de remessa de RIF por e-mail", diz o MP-RJ, na nota.

Caso o STF entenda que houve irregularidades no compartilhamento de informações pelo Coaf, isso pode levar a diferentes consequências para a investigação:

  • As informações dos relatórios de inteligência financeira do Coaf podem ser excluídas do processo
  • Outras provas coletadas a partir dos relatórios também podem ser anuladas, se for considerado que as informações do Coaf foram a principal pista que levou a elas
  • As investigações em si poderiam ter continuidade se houver outras provas independentes dos dados do Coaf. Mas a anulação das provas financeiras pode na prática inviabilizar a elucidação de eventuais crimes
Flávio e Fabricio Queiroz - Reprodução - Reprodução
O senadro Flávio Bolsonaro e seu ex-assessor Fabrício Queiroz
Imagem: Reprodução
O caso Flávio Bolsonaro

Filho do presidente Bolsonaro, Flávio está sendo investigado pelo Ministério Público do Rio de Janeiro por suspeitas de crimes como peculato, lavagem de dinheiro e organização criminosa. A investigação teve origem em relatórios produzidos pelo Coaf que identificaram movimentações atípicas na conta bancária de Fabrício Queiroz, ex-assessor de Flávio.

O relatório apontou uma movimentação de R$ 1,2 milhão na conta de Queiroz. As operações se davam em depósitos e saques em dinheiro, o que chamou a atenção dos promotores do MP-RJ.

A principal suspeita dos investigadores é da prática da "rachadinha", como ficou popularmente conhecido o desvio pelo parlamentar de parte do salário dos funcionários de seu gabinete.

Em abril, a Justiça autorizou a quebra de sigilo fiscal e bancário do senador e de Queiroz, mas a defesa de Flávio alega que o MP-RJ teve acesso a seus dados financeiros há mais de um ano, quando a investigação começou.

O senador tem negado a prática de qualquer irregularidade.