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Teich aceitou cargo de Mandetta: 'não vai haver definição brusca'

Luís Adorno e Wanderley Preite Sobrinho

Do UOL, em São Paulo

16/04/2020 16h18Atualizada em 16/04/2020 19h42

O oncologista Nelson Luiz Sperle Teich aceitou a vaga deixada hoje por Luiz Henrique Mandetta (DEM), que se reuniu com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e anunciou sua saída do Ministério da Saúde.

"Não vai haver definição radical ou brusca", disse Teich ao lado de Bolsonaro, em relação às medidas para o combate ao novo coronavírus — dentre as quais o isolamento social, alvo de críticas por parte do presidente.

O novo ministro afirmou ainda que "saúde e economia não competem", ecoando o raciocínio do presidente da República, que voltou a pedir que os brasileiros sejam liberados das quarentenas decretadas em diversos municípios.

Divórcio

Bolsonaro falou que houve um "divórcio consensual" entre ele e Mandetta. Os dois divergiam publicamente quanto à estratégia para evitar o avanço da covid-19, a doença causada pelo novo coronavírus.

Quem é Teich

O oncologista Nelson Luiz Sperle Teich é um velho conhecido do presidente Bolsonaro. Consultor da campanha do então candidato a presidente, Teich é um oncologista com experiência empresarial para quem a gestão da pandemia não deve excluir o socorro econômico. Apesar disso, ele já defendeu, assim como o antecessor Henrique Mandetta, que ninguém saia de casa durante a quarentena.

Teich é carioca, viveu a maior parte da vida na Barra da Tijuca, zona oeste do Rio. Foi na Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) que se formou em medicina em 1980. Também na capital fluminense, Teich cursou suas duas especializações em oncologia: de 1985 a 1987, no Hospital de Ipanema, e entre 1987 e 1990 no Instituto Nacional do Câncer, onde fez residência médica.

Desde então, seu foco acadêmico foi unir medicina à gestão de saúde — foi estudante PhD em Health Sciences e Health Economics na Universidade York, no Reino Unido.

No mundo empresarial, ajudou a fundar o grupo COI (Clínicas Oncológicas Integradas), que presidiu até 2018, e foi sócio de Denizar Vianna — secretário de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos- - no MDI Instituto de Educação e Pesquisa. Ele também foi o diretor-executivo da MedInsight - Decisions in Health Care e faz parte do corpo editorial da publicação especializada American Journal of Medical Quality.

Teich chegou a prestar consultoria em gestão de saúde de 2010 a 2011 para o Hospital Israelita Albert Einstein, que viria a cuidar do presidente após a facada que recebeu durante a campanha.

Da eleição à pandemia

Teich foi um dos consultores para a área da saúde na campanha vitoriosa de Bolsonaro ao Planalto, em 2018, quando foi cotado para o Ministério da Saúde. Ele perdeu a vaga para Mandetta, de perfil mais político e também reconhecido por sua proximidade à iniciativa privada.

Ele acabou trabalhando indiretamente para o governo Bolsonaro ao assessorar Denizar Vianna na Secretária de Ciência, Tecnologia e Insumos Estratégicos.

Assim que o ex-ministro anunciou que estava de saída, o nome de Teich foi alçado a favorito para assumir a vaga. Ele foi o primeiro a se encontrar com Bolsonaro na quinta-feira (16), quando foi sabatinado pelos ministros Luiz Ramos, da Secretaria de Governo, Jorge Oliveira, da Secretaria-Geral, e pelo general Braga Netto, da Casa Civil. Na ocasião, o médico ponderou sobre como enfrentar o novo coronavírus e elencou suas propostas para o ministério.

Embora uma das rusgas do presidente com Mandetta tenha sido a insistência do ex-ministro pelo isolamento horizontal (para todas as pessoas), Teich também defendeu que todas as pessoas guardem quarentena, ao contrário do que defende Bolsonaro, partidário do isolamento apenas para o grupo de risco, como idosos e doentes com problemas respiratórios crônicos.

Em 3 de abril, Teich escreveu em um artigo que por "falta de informações detalhadas e completas do comportamento, da morbidade e da letalidade da covid-19, e com a possibilidade do Sistema de Saúde não ser capaz de absorver a demanda crescente de pacientes, a opção pelo isolamento horizontal [?] é a melhor estratégia no momento".

Covid-19 e economia

O aumento da crise ministerial, no entanto, aproximou o discurso de Teich ao de Bolsonaro. Segundo a CNN, ele foi questionado na semana passada sobre a relação conflituosa entre o presidente e Mandetta. O médico fez uma longa introdução antes de defender a ideia de Bolsonaro de que a economia brasileira deve fazer parte das preocupações governamentais durante o combate aos efeitos da pandemia.

"A saúde e a economia não são antagônicas. Foi criada uma situação como se você investisse na saúde não estivesse focando na economia e vice-versa, quando na verdade os dois são equivalentes. E a gente nem está lidando com a parte social, que é fundamental. Então na prática você tem que ver todo dia o que corre na saúde, na economia e no social", afirmou.

Antes disso, disse que faltava liderança na condução da crise. "Acho que tem duas coisas que são muito ruins. Primeiro, é você não ter uma liderança, eu digo no país, que você perceba uma tranquilidade, que você perceba um equilíbrio. E aí não estou falando especificamente do Mandetta ou do presidente. Estou falando da situação."

Em um artigo intitulado "COVID-19: Histeria ou Sabedoria?", de 24 de março, o oncologista escreveu que um gestor de saúde só poderia atuar bem durante a pandemia se munido de informação farta. "A informação que chega a cada dia precisa ser complexa, detalhada e em tempo real. É necessário rever diariamente a realidade, os cenários, as projeções e as ações. Projeções e posições radicais e emocionais só levam a mais confusão e problema."

Fritura de Mandetta

Bolsonaro é contrário às recomendações do Ministério da Saúde, da OMS (Organização Mundial da Saúde) e de especialistas sobre a eficácia da quarentena para reduzir o número de casos da covid-19. Os seguidos embates de Mandetta com Bolsonaro se arrastaram por dois meses, até que o ex-ministro decidiu entregar o cargo.

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O ex-ministro da Saúde, Henrique Mandetta
Imagem: UESLEI MARCELINO/REUTERS
"Sessenta dias tendo de medir palavras. Você conversa hoje, a pessoa entende, diz que concorda, depois muda de ideia e fala tudo diferente. Você vai, conversa, parece que está tudo acertado e, em seguida, o camarada muda o discurso de novo. Já chega, né? Já ajudamos bastante", afirmou ele em entrevista à Veja.

Mandetta já havia criticado Bolsonaro em uma entrevista ao Fantástico no último domingo, quando disse que o brasileiro não sabe se escuta ele ou o presidente.

Ainda na quarta-feira (15), o secretário de Vigilância em Saúde, Wanderson de Oliveira, chegou a anunciar sua demissão do Ministério da Saúde — depois rejeitada por Mandetta. Segundo Oliveira, esse processo vem já há algum tempo e que a mensagem era se preparar para sair junto com o ministro.

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