Topo

Demitido por telefone, Valeixo ficou constrangido com "exoneração a pedido"

Eduardo Militão

Do UOL, em Brasília

24/04/2020 22h52Atualizada em 25/04/2020 00h42

O ex-diretor-geral da Polícia Federal Maurício Valeixo foi demitido pelo presidente Jair Bolsonaro pelo telefone na noite de ontem e ficou constrangido quando lhe questionaram se concordava com a inclusão da menção "a pedido" na exoneração que seria publicada no Diário Oficial na madrugada. O policial respondeu que essa decisão não cabia a ele, apurou o UOL.

Primeiro, Valeixo recebeu uma ligação da equipe do presidente. Em dado momento, Bolsonaro assumiu o telefonema. Na conversa, o delegado foi informado da demissão e questionado sobre o uso da expressão "a pedido" no decreto. A interlocutores Valeixo disse que não respondeu "nem que sim, nem que não" e que "não poderia concordar com alguma coisa".

A versão do delegado federal e ex-chefe da PF para o episódio é a mesma dada pelo ex-ministro Sergio Moro e diverge da declaração de Bolsonaro em pronunciamento feito nesta tarde, após o ex-juiz anunciar sua saída do governo federal.

A demissão de Valeixo foi tema de uma conversa que o presidente e o então ministro tiveram na manhã de ontem. Segundo Bolsonaro, havia um interesse do delegado em deixar a Polícia Federal, por "cansaço", e esse desejo foi expressado por ele numa videoconferência com os 27 superintendentes regionais da instituição. "Desde janeiro, [Valeixo] vinha falando ao senhor Sergio Moro que iria deixar a Polícia Federal", disse o presidente hoje no Palácio do Planalto.

A versão de Valeixo e de Moro é outra. O UOL apurou que na conversa do delegado com os superintendentes, o policial não disse que queria sair. Um colega perguntou ao diretor da PF como estavam as pressões. Ele confidenciou que as pressões eram "constantes" e que isso causava "cansaço".

Ao se pronunciar hoje, Bolsonaro disse que comunicou a Moro na quinta pela manhã a decisão de exonerar Valeixo e que, "pelo que tudo indicava, [era] uma exoneração a pedido".

Já o ex-ministro afirma que ficou sabendo pelo Diário Oficial, inclusive com o uso não autorizado de sua assinatura eletrônica — nesta noite o Diário Oficial circulou com outra exoneração, sem a assinatura de Moro.

Em seu pronunciamento, Bolsonaro afirmou ainda que Moro condicionou a demissão do delegado à indicação de seu nome para o STF, o que Moro negou.

A colegas o delegado disse que nem sequer assinou documento pedindo demissão — argumento foi usado por Moro em entrevista coletiva. "O fato é que não existe nenhum pedido que foi feito de maneira formal", disse o ex-ministro. "Sinceramente fui surpreendido, achei que foi ofensivo."

Despedida menciona República

Valeixo se encontrou com o ministro Sergio Moro nas primeiras horas desta sexta-feira (24) no Ministério da Justiça. Ficou lá até pouco antes das 11h, quando o ex-juiz da Lava Jato faria seu pronunciamento pedindo demissão. Voltou para casa. Depois, pediu ajuda a colegas para escrever uma carta de despedida aos colegas.

No texto divulgado à imprensa, defendeu "princípios republicanos", numa referência ao ex-ministro da Justiça, Márcio Thomaz Bastos, no governo Lula, que afirmava que a "polícia republicana" é aquela que segue a lei doa a quem doer, mas sem perseguições.