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Presidente não pode mandar PF apurar casos específicos, dizem especialistas

Jair Bolsonaro, antes do pronunciamento após a saída de Sergio Moro - EVARISTO SA / AFP
Jair Bolsonaro, antes do pronunciamento após a saída de Sergio Moro Imagem: EVARISTO SA / AFP

Luís Adorno

Do UOL, em São Paulo

24/04/2020 19h33Atualizada em 24/04/2020 19h39

Ao contra-atacar o ex-ministro Sergio Moro, o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) citou, em tom de críticas e cobrança ao ex-juiz federal, que pediu que a PF (Polícia Federal) interrogasse um sargento em Mossoró (RN), investigasse um porteiro de seu condomínio no Rio de Janeiro e que encontrasse quem ordenou que Adélio Bispo o atacasse com uma faca durante a campanha eleitoral de 2018.

Esse tipo de determinação, no entanto, não tem previsão legal, segundo advogados criminalistas, desembargadores, policiais federais e pesquisadores da área de segurança pública. De acordo com os especialistas, quem pode determinar investigações, inquéritos e interrogatórios é apenas o delegado. Bolsonaro poderia, como qualquer pessoa, apenas peticionar pedindo para a polícia investigar.

A desembargadora do TJ-SP (Tribunal de Justiça de São Paulo) Ivana David explica que, segundo o Código de Processo Penal em vigor, quem decide a linha de investigação, como qual testemunha deve ser ouvida é o delegado. "Aquele que, segundo artigo 144 da Constituição Federal tem a atribuição de investigar. Pode o Ministério Público indicar em sua manifestação oitivas ou interrogatórios. Ao presidente, que não é parte no inquérito, não existe qualquer previsão legal nesse sentido", diz.

Tânia Prado, presidente do Sindicato dos Delegados da PF de SP, pondera que "qualquer autoridade, mesmo o presidente, tem que respeitar a independência do delegado de polícia presidente de um inquérito policial, conforme a lei 12.830 de 2013". Renato Sérgio de Lima, presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública complementa que "o delegado precisa achar que tem sinal de crime para investigar. O MP e o judiciário é que podem determinar. A decisão é do delegado".

O advogado criminalista Bruno Salles, sócio do Cavalcanti, Sion e Salles Advogados, afirma que Bolsonaro "não pode ingerir nos rumos de uma investigação como presidente da república. Se ele se sente ofendido ou vitimado, ele deve procurar a AGU para que faça os pedidos em nome dele. Nesse sentido, ele confessou que praticou os atos ilícitos denunciados por Sergio Moro".

Para Rafael Alcadipani, professor de Gestão Pública da FGV (Fundação Getúlio Vargas), a ação de Bolsonaro denota "uma mistura completa de atribuição". "A polícia só pode interrogar alguém se houve uma investigação em curso e houver suspeita sobre a pessoa. Tem que haver indício de crime. Tem que ter uma ordem de serviço, determinada por um delegado, para tanto", afirmou.