Topo

Bolsonaro me vetou e sinalizou que interferiria mais em Moro, diz Szabó

A especialista em segurança pública Ilona Szabó - Eduardo Knapp/Folhapress
A especialista em segurança pública Ilona Szabó Imagem: Eduardo Knapp/Folhapress

Ana Carla Bermúdez

Do UOL, em São Paulo

24/04/2020 17h40

Pivô de uma dos primeiros reveses de Sergio Moro no Ministério da Justiça e Segurança Pública no ano passado, a especialista em segurança pública Ilona Szabó afirmou hoje que não se surpreendeu com o fato de o ex-juiz da Lava Jato ter saído do governo de Jair Bolsonaro (sem partido).

"A minha nomeação era algo pequeno demais. Se ele [Bolsonaro] interferiu em algo desse tipo, é porque de fato ele estaria interferindo em outras coisas", diz ela ao UOL.

Para Szabó, "desde o início havia um choque entre as agendas [de Moro e Bolsonaro]". "Moro assumiu o ministério com o compromisso da luta contra a corrupção e o crime organizado. A gente sabe que, em algum momento, isso se chocaria com o que quer o presidente, seus filhos e o círculo próximo a eles", disse.

Bolsonaro chegou a citar Szabó no discurso nesta tarde que fez em resposta a Moro. "Uma senhora, ou senhorita, que tem publicações a favor do aborto e ideologia de gênero".

Apesar das divergências que, segundo Szabó, eram latentes desde o início do governo, a especialista avalia que a saída de Moro é um "duro golpe no sistema de equilíbrio democrático".

Vetada por Bolsonaro

Em fevereiro do ano passado, Szabó foi nomeada como membro suplente do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária pelo então ministro Moro. Por apresentar posições divergentes do governo com relação a temas como armamento e políticas de drogas, sua nomeação foi alvo de críticas por apoiadores de Bolsonaro. O próprio presidente pressionou Moro, que acabou recuando em relação à nomeação da especialista.

Szabó avalia que o episódio que a envolveu foi apenas um dentro de uma série de interferências de Bolsonaro sobre ações e políticas da área da segurança pública.

Ela lembra o conflito entre Moro e Bolsonaro envolvendo o primeiro decreto de armas, em 2019. "Saiu um texto do Ministério da Justiça e esse texto não foi respeitado pelo Planalto", afirma.

Para a especialista, naquele momento ficou claro a existência de duas agendas. "Uma delas era a agenda técnica, que poderia avançar desde que não comprometesse os interesses políticos e privados do presidente", afirma. "São muitos episódios em que essa intolerância é generalizada a qualquer tipo de pensamento diferente".

Szabó diz temer que, com as sinalizações de interferência de Bolsonaro na Polícia Federal, o órgão perca a sua autonomia, trazendo riscos à democracia. Ela defende que outras instituições republicanas -como Ministério Público e o Judiciário— devem atuar de forma a respaldar o trabalho da PF.

"Foi um movimento muito arriscado [por parte de Bolsonaro]", avalia. "Ou porque há uma disputa política muito grande ou porque há, de fato, algo sendo escondido".

Para ela, Moro sai do governo "mais fortalecido e tendo cumprido a promessa que fez". "Pelo menos frente aos apoiadores e seguidores, ele seguiu a sua palavra", afirma.

Quanto a Bolsonaro, Szabó avalia ser difícil que "qualquer narrativa que ele coloque fique maior do que entre um grupo marginal de apoiadores radicais".

Moro anunciou sua demissão na manhã de hoje. Em pronunciamento, ele afirmou que entre os motivos para a sua saída estariam tentativas de interferência, por parte de Bolsonaro, no trabalho da Polícia Federal. Segundo Moro, o presidente desejaria acesso a informações confidenciais de inquéritos avaliados pelo STF (Supremo Tribunal Federal).

Sergio Moro pede demissão

Band Notí­cias