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Forças Armadas, Moro e trocas na PF: o dia de Bolsonaro em meio à pandemia

Assinatura do termo de posse do diretor-geral da PF, Rolando Alexandre de Souza - Isac Nóbrega/PR/Divulgação
Assinatura do termo de posse do diretor-geral da PF, Rolando Alexandre de Souza Imagem: Isac Nóbrega/PR/Divulgação

Clarice Cardoso

Do UOL, em São Paulo

05/05/2020 02h30

Resumo da notícia

  • Bolsonaro é criticado por fala em ato que pedia fechamento do Congresso e do STF
  • Presidente ironizou acusações do ex-ministro da Justiça Sergio Moro
  • PGR quer que STF ouça ministros e deputada federal Carla Zambelli sobre alegações de Moro
  • Novo diretor-geral da PF toma posse e decide trocar comando da PF do Rio, foco de interesse da família Bolsonaro

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) elevou o tom ao participar de ato no domingo (03) que pedia o fechamento do Congresso e do STF (Supremo Tribunal Federal) e dizer: "Chegamos no limite, não tem mais conversa".

Sem máscara, aproximou-se algumas vezes dos manifestantes, que estavam aglomerados, e deu a entender que teria o apoio das Forças Armadas. "Tenho certeza de uma coisa, nós temos o povo ao nosso lado, nós temos as Forças Armadas ao lado do povo".

Em nota de ontem, o ministro da Defesa, Fernando Azevedo e Silva —que segundo a colunista do UOL, Thaís Oyama, tem desagradado o presidente—, afirma que as Forças são "uma instituição de Estado".

À exemplo do que aconteceu no domingo, diversas personalidades políticas e militares se manifestaram em relação à postura do presidente. Enquanto isso, o vice-presidente da República, Hamilton Mourão, minimizou a situação dizendo que a "grande maioria" dos manifestantes presentes no protesto de domingo estava lá para "pura e simplesmente apoiar o governo".

As Forças Armadas se consideram e sempre se considerarão como elementos do Estado brasileiro, e é desta forma que elas agem."
Hamilton Mourão, vice-presidente

Contudo, generais da reserva ouvidos pelo colunista do UOL, Chico Alves, disseram que não há qualquer possibilidade de Exército, Marinha e Aeronáutica embarcarem em uma aventura antidemocrática.

Ex-presidentes também se manifestaram.

As declarações do senhor presidente da República são extremamente perturbadoras e sérias, porque nós não sabemos exatamente o que ele quer dizer com isso."
Fernando Collor de Mello (Pros-AL), senador e ex-presidente

Hoje, não há um projeto de autoritarismo. Ele pode acontecer, o que é pior, talvez, porque não há projeto. Há o ímpeto de pessoas, inclusive do presidente. É grave. Pode acontecer? Depende."
Fernando Henrique Cardoso, ex-presidente

Atacados pelo presidente, ministros do STF criticaram suas atitudes:

Não acredito que as Forças Armadas aceitem ser puxadas, arrastadas para esse varejo da política."
Luís Roberto Barroso, ministro do STF

Aperfeiçoar, sim, a democracia, romper com ela, jamais."
Gilmar Mendes, ministro do STF

A nova ida do presidente a um ato considerando antidemocrático foi usada como argumento pela bancada do PSOL na Câmara, que pediu ao STF a inclusão de Bolsonaro entre os investigados no inquérito que apura as manifestações favoráveis ao fechamento do Congresso e do próprio Supremo ocorridas em abril.

Troca na PF a portas fechadas

Pela manhã, o presidente também ironizou as acusações feitas pelo ex-ministro da Justiça e Segurança Pública Sergio Moro de que tenta interferir na Polícia Federal (PF). Ao deixar o Palácio do Planalto, mostrou o print de uma notícia do site O Antagonista compartilhada em conversa entre eles e cravou: "É fofoca".

Para esclarecer suas acusações, o ex-juiz da Lava Jato prestou depoimento no sábado (2), na Superintendência da Polícia Federal em Curitiba, citando nomes de ministros do atual governo para reforçar suas alegações. Sua defesa pediu ontem a divulgação completa de sua fala, decisão que cabe ao ministro Celso de Mello, relator do caso no Supremo.

Segundo ele, o chefe do Gabinete de Segurança Institucional (GSI), general Augusto Heleno, e os ministros Walter Braga Netto (Casa Civil) e Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo) testemunharam o presidente ameaçá-lo com demissão dois dias antes de sua saída.

Com isso, o procurador-geral da República, Augusto Aras, solicitou a Celso de Mello uma série de diligências para apurar os fatos narrados, e quer que a PF ouça os três ministros, bem como a deputada federal Carla Zambelli (PSL-SP).

A Procuradoria também solicitou a oitiva de delegados, entre eles Maurício Valeixo, ex-diretor da PF cuja saída levou ao rompimento de Bolsonaro e Moro, e Alexandre Ramagem Rodrigues, cuja nomeação para o cargo foi suspensa pelo ministro do STF Alexandre Moraes.

Em um novo capítulo dessa crise política, a solução para a direção-geral da PF foi dada hoje pelo presidente, que nomeou ontem Rolando Alexandre de Souza para o cargo de diretor-geral da PF em cerimônia reservada realizada minutos após a publicação da nomeação no Diário Oficial da União.

Foi a primeira vez em 17 anos que a posse não ocorreu na sede da PF ou no Ministério da Justiça, mas na Presidência. Também foi a primeira vez que ela foi fechada à imprensa.

Poucas horas após assumir o cargo, Souza tomou como primeira decisão a troca da chefia da superintendência do Rio de Janeiro, foco de interesse da família Bolsonaro. Alvo da interferência do presidente, a Superintendência do Rio já perdeu produtividade em 2019, conforme mostrou reportagem do UOL.

Por conta da proximidade com Ramagem, que é amigo pessoal da família Bolsonaro, o deputado federal Alessandro Molon (PSB-RJ) entrou com um mandado de segurança no STF para que o último tenha de passar por uma nova sabatina no Senado antes de reassumir o cargo na Agência Brasileira de Inteligência (Abin).

Ainda na esteira da decisão de Moraes de suspender a nomeação de Ramagem, a Frente Parlamentar da Segurança Pública, conhecida como Bancada da Bala, sugeriu ao presidente que peça o impeachment de ministros do STF no Senado.

Em reunião fora de sua agenda oficial, o presidente reuniu-se por uma hora ontem com o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e o governador de Goiás, Ronaldo Caiado (DEM), no Palácio do Planalto. Na pauta, entre outros assuntos, estava a "união dos Três Poderes e o fortalecimento da democracia".

Coronavírus avança

Enquanto isso, a pandemia de covid-19 avança pelo país, e a escalada das mortes sugere o pior momento da pandemia no país até o momento: a doença já mata ao menos 16 pessoas por hora.

Segundo o Ministério da Saúde, subiu para 7.321 o número de óbitos e o total de casos é de 107.780 casos. Enquanto os estados lutam para conter o avanço do novo coronavírus e à crescente falta de leitos e de covas para sepultamento, a pasta chegou a divulgar boletim ontem com menos casos e mortos no Amazonas, um dos estados mais afetados pela crise sanitário, que dado anterior publicado por ela cinco horas antes.