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Desconforto no Senado cresce com vetos de Bolsonaro e demissão de Teich

Senado tem feito sessões virtuais para evitar aglomerações em Brasília durante a pandemia do coronavírus - Jefferson Rudy/Agência Senado
Senado tem feito sessões virtuais para evitar aglomerações em Brasília durante a pandemia do coronavírus Imagem: Jefferson Rudy/Agência Senado

Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

16/05/2020 14h57

O desconforto com o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) no Senado atingiu um novo pico nesta semana diante vetos a propostas aprovadas pela Casa, ordem de recuo quanto à votação de medidas econômicas e a saída de Nelson Teich do Ministério da Saúde, apurou o UOL.

A crescente insatisfação não se limita à oposição, mas atinge também parlamentares de partidos que costumam votar com o governo ou que se declaram independentes.

"O termômetro ficou mais exacerbado do que a média normal por todo um contexto", disse ao UOL uma senadora que pediu para falar reservadamente.

Vetos de Bolsonaro a projetos

Senadores estão descontentes com a demora de Bolsonaro para sancionar propostas que consideram importantes para o país em meio à pandemia, como a de socorro a estados e municípios, e indicações de vetos.

O texto que prevê ajuda de R$ 60 bilhões pela União foi aprovado pelo Congresso em 6 de maio e ainda não foi sancionado, por exemplo. Pela legislação, o presidente da República tem 15 dias para sancioná-lo ou vetá-lo, tanto na íntegra quanto de forma parcial. Portanto, está dentro do prazo.

Senadores reclamam, porém, que a demora do presidente leva o assunto a esfriar, a retardar a retomada da economia e a prejudicar a população mais vulnerável. Muitos parlamentares na Casa são ex-governadores ou políticos mais experientes com força nos respectivos governos estaduais, com quem Bolsonaro vive relacionamento conflituoso por querer o fim do isolamento social amplo.

No dia seguinte à aprovação do projeto, para contrariedade generalizada, Bolsonaro disse que irá vetar o trecho que permite aumento salarial para algumas categorias de servidores públicos em meio à pandemia de coronavírus. A decisão final ainda não foi publicada no Diário Oficial da União.

Outro veto que causa aborrecimento no Senado é referente à ampliação de categorias de trabalhadores que poderão receber o auxílio emergencial de R$ 600, aprovada por unanimidade na Casa. Bolsonaro retirou ontem do projeto a previsão de que informais sem inscrição no Cadastro Único e homens solteiros chefes de família sejam contemplados, entre outros pontos.

Os vetos poderão ser derrubados em votação do Congresso, mas as sessões para essas análises não têm data para ocorrer devido à pandemia do coronavírus.

Mais um motivo de incômodo foi a edição por Bolsonaro de Medida Provisória que estabelece que agentes públicos envolvidos na resposta à pandemia da covid-19 e aos danos por ela causados na economia só serão punidos se agirem ou se omitirem com dolo (propositalmente) ou por "erro grosseiro".

Por se tratar de uma MP, o texto já está em vigor, mas precisa ser apreciado pela Câmara e pelo Senado em até 120 dias para não perder a validade.

Sessão cancelada após apelo da Economia

Na quinta-feira (14), a sessão virtual do plenário do Senado foi cancelada de última hora, embora a pauta de votação com medidas econômicas tivesse acordo entre as lideranças da Casa. Segundo senadores, o presidente do Senado, Davi Alcolumbre (DEM-AP), recuou sem dar satisfação aos colegas após apelo do Ministério da Economia e setores que seriam afetados.

Seriam analisadas propostas que suspendem por 120 dias o reajuste de preços de remédios e planos de saúde privados e estabelece teto de 20% ao ano para todas as modalidades de crédito ofertadas por meio de cartões de crédito e cheque especial às dívidas contraídas entre março de 2020 e julho de 2021.

"Nunca vi o governo pressionar de tal forma e derrubar uma sessão, porque não tinha os votos para atender aos interesses pouco republicanos dos banqueiros, dos planos de saúde e dos fabricantes de medicamentos", disse um parlamentar, sob reserva.

No dia, a Presidência do Senado informou que o cancelamento foi motivado para "dar mais tempo" para a discussão das matérias.

Senadores preocupados após saída de Teich

Para completar o mal-estar, senadores ouvidos pela reportagem afirmaram que a maioria da Casa ficou surpresa e preocupada com o pedido de demissão de Nelson Teich do Ministério da Saúde devido a divergências com Bolsonaro.

Na avaliação do senador Otto Alencar (PSD-BA), a saída de Teich demonstra que o governo não tem orientação e quer na pasta alguém que seja submisso às vontades do presidente, mesmo que sem evidências científicas, como o uso mais amplo da cloroquina no tratamento de pacientes com coronavírus.

"É um governo confuso que não encontra saídas e quer jogar a culpa nos outros. Teich fez o certo em não ceder à pressão de um presidente sem parâmetro médico. O Senado está atônito com o presidente. Os próprios governistas ficaram constrangidos com a situação", falou.