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Manifestantes protestam contra o racismo e Bolsonaro na zona sul de SP

Luís Adorno

Do UOL, em São Paulo

04/07/2020 13h58Atualizada em 04/07/2020 15h55

Cerca de 100 pessoas caminharam na zona sul de São Paulo, entre o fim da manhã e o início da tarde de hoje, contra o racismo, o fascismo e o presidente Jair Bolsonaro (sem partido). O ato foi inteiramente pacífico e não houve nenhum incidente. Parte dos manifestantes agradeceu o apoio da PM (Polícia Militar), que escoltou o protesto.

Considerado um ato esvaziado, organizadores disseram que o protesto foi uma iniciativa para descentralizar manifestações e mobilizar a periferia. A ideia é que haja engajamento para os próximos atos.

O protesto teve início às 10h no largo 13 de Maio, em Santo Amaro. Os manifestantes caminharam pelas avenidas Santo Amaro e Adolfo Pinheiro até chegar, às 12h40, na estação Borba Gato do metrô, onde há uma estátua em homenagem ao bandeirante. O ato foi encerrado às 13h30.

Em 7 de junho, manifestantes britânicos derrubaram e jogaram no rio Avon a estátua de Edward Colston (1636-1721), na cidade de Bristol. O traficante fez fortuna transportando mais de 100 mil negros escravizados da África para as antigas colônias europeias no Caribe e nas Américas.

A ação dos manifestantes britânicos gerou debate público no Brasil. A estátua de Borba Gato, por exemplo, é questionada por registros históricos de que, em sua busca por ouro e riquezas, o bandeirante provocou mortes e destruições de quilombos e aldeias indígenas.

Movimentos sociais defendem que, se vidas negras importam, o ideal é que a estátua de Borba Gato esteja contextualizada com seu histórico de violência. O monumento ganhou um cercadinho, em 11 de junho, com presença da GCM (Guarda Civil Metropolitana).

Policiais escoltam estátua de Borba Gato, em SP, em ato contra racismo - Luís Adorno/UOL - Luís Adorno/UOL
Policiais escoltam estátua de Borba Gato, em SP, em ato contra racismo
Imagem: Luís Adorno/UOL

PMs com escudos, capacetes e cassetetes em mãos fizeram a proteção do monumento. Ninguém chegou perto. Enquanto a reportagem registrava a formação de PMs em frente à estátua, um policial da Força Tática sem identificação na farda ordenou que a reportagem deixasse o local e atravessasse a rua.

Enquanto aguardava o semáforo para pedestre ficar verde e poder cumprir a ordem do policial sem identificação, a reportagem foi indagada ironicamente se precisava de ajuda para atravessar a rua. O PM pegou o crachá do repórter, disse: "Folha de S.Paulo, ok" e retornou para a defesa do monumento.

Gritos contra o governo e o racismo

Manifestante com placa contra o racismo - Luís Adorno/UOL - Luís Adorno/UOL
Manifestante com placa contra o racismo
Imagem: Luís Adorno/UOL

Ana Luiza, 24, da UJS (União da Juventude Socialista) afirmou que foi à rua "para combater o governo fascista que mata a população negra, que mata a população que depende do SUS e que mata a população das políticas públicas".

A assistente social de formação de 47 anos que se identificou apenas como Marilene acrescentou que foi ao protesto "contra o genocídio da população negra e contra a segregação racial".

O professor da rede municipal João Batista, 39, disse que foi ao ato porque "derrubar o governo Bolsonaro hoje é uma necessidade da classe trabalhadora". Ele criticou o governo federal não só no combate ao coronavírus, mas também em suas políticas públicas econômicas e de segurança.

O administrador de empresas Wilson Costa, 51, complementou que foi ao ato conta a política de repressão às minorias. "O próprio presidente já se mostrou nem aí para a população", disse.

Presente no ato, o deputado estadual Carlos Giannazi (PSOL) afirmou em frente à estação que Borba Gato é um "escárnio que representa o genocídio contra os negros e contra os escravos no Brasil". Os manifestantes terminaram o ato em frente ao presidente, mas distante do monumento.

Mais negros mortos por covid

Protesto toma avenida em Santo Amaro, na zona sul de SP - Luís Adorno/UOL - Luís Adorno/UOL
Protesto toma avenida em Santo Amaro, na zona sul de SP
Imagem: Luís Adorno/UOL

O ato foi organizado por partidos políticos de esquerda, sindicatos e movimentos sociais. Segunda região mais populosa da cidade, com cerca de 2,72 milhões de habitantes, a zona sul teve alta incidência de mortes pela covid-19. Para os manifestantes, os posicionamentos do presidente impulsionou a expansão do vírus.

Relatório da Rede Nossa São Paulo mostra que, dos dez bairros com mais casos e mortes pelo vírus, sete estão na zona sul —entre eles, Jardim Ângela e Grajaú, que concentram mais moradores autodeclarados pretos e pardos.

Além disso, das cinco grandes áreas das subprefeituras da cidade, as três com maior número de residências em favelas estão na zona sul: Campo Limpo (59.483 moradias), M'Boi Mirim (42.350) e Cidade Ademar (25.468).

Também na zona sul, o índice de desemprego é o mais elevado da capital (15,5%), diante da média de 12,8% do município, enquanto o número de habitantes formados em curso superior é o mais baixo, proporcionalmente (10%, para 34,1%), segundo pesquisa divulgada em janeiro pela Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados.

Esses dados, de acordo com os manifestantes, demonstram que, por meio de uma política pública que não defende os menos privilegiados, o coronavírus, o desemprego e as residências mais precárias se concentram na área periférica. Há cobrança para que isso seja alterado.

Protesto contra o racismo em SP