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Oficial da PM e médico, ex-secretário preso aproximou Witzel da polícia

Wilson Witzel (PSC) e o então secretário de Saúde Edmar Santos - Carlos Magno/ Divulgação/ Governo do Rio
Wilson Witzel (PSC) e o então secretário de Saúde Edmar Santos Imagem: Carlos Magno/ Divulgação/ Governo do Rio

Gabriel Sabóia

Do UOL, no Rio

15/07/2020 04h00

Preso na última sexta-feira (10) por suspeita de comandar fraudes em contratos do governo do Rio de Janeiro durante o estado de emergência decretado por causa do coronavírus, o ex-secretário de Saúde Edmar Santos era considerado o "nome ideal para o cargo" por Wilson Witzel (PSC) e ganhou protagonismo nos primeiros meses da pandemia.

Sem vínculo com partidos, Edmar reuniu a um só tempo dois atributos caros ao governador —era encarado como uma nomeação técnica, uma vez que é médico de formação e possui experiência em gestão de saúde, e também representou uma forma de aproximação com a Polícia Militar por ser tenente-coronel da corporação. Além de passar um recado de cortesia à PM, a escolha estava em linha com a onda bolsonarista que elegeu Witzel.

Edmar foi professor da Uerj (Universidade do Estado do Rio de Janeiro) e diretor do Hospital Universitário Pedro Ernesto, onde teve uma gestão elogiada.

Além do histórico como gestor de saúde, o ex-secretário exerceu papel político importante no início da gestão, enquanto o governador se empenhou em levantar a bandeira da valorização dos policiais. Foi ele quem intermediou, por exemplo, as visitas do governador aos batalhões em que Witzel se deixou filmar fazendo exercícios físicos e participando de treinamentos.

De lá para cá, apesar do distanciamento de Witzel dos ideais defendidos pelo presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e do arrefecimento do discurso militarista do governador, Edmar ganhou evidência. Se durante o primeiro ano de mandato a sua atuação foi considerada "discreta", o médico ganhou protagonismo a partir de março, quando a OMS (Organização Mundial da Saúde) decretou a pandemia.

Edmar passou a aparecer com frequência ao lado de Witzel em entrevistas coletivas e em anúncios do governo. Ele também era convocado para comentar as declarações de Bolsonaro que subestimavam a covid-19 e estava ao lado de Witzel durante encontros com outras autoridades.

No início do governo, o nome dele era citado com frequência por Witzel diante das contestações em relação às nomeações políticas para a composição do seu secretariado. Apontado como um quadro técnico, ele era um contraponto ao recém-nomeado secretário de Educação, Pedro Fernandes (PSC), que foi adversário de Witzel na corrida eleitoral e acabou ganhando o cargo depois de anunciar apoio ao ex-juiz federal no segundo turno.

10.jul.2020 - O ex-secretário da Saúde Edmar Santos após prisão no Rio - ANDRE MELO ANDRADE/MYPHOTO PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO - ANDRE MELO ANDRADE/MYPHOTO PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO
10.jul.2020 - O ex-secretário da Saúde Edmar Santos após prisão no Rio
Imagem: ANDRE MELO ANDRADE/MYPHOTO PRESS/ESTADÃO CONTEÚDO

MP apreendeu R$ 8,5 mi em operação que prendeu Edmar

O estado de emergência declarado no Rio como medida de combate à doença, no entanto, acabou dando início à crise que o levou à prisão. O contrato de R$ 836 milhões —feito sem licitação— com a OS (Organização Social) Iabas para a construção de hospitais de campanha precisou ser suspenso, diante dos atrasos. Até hoje, apenas dois, dos sete hospitais de campanha prometidos, foram entregues.

Também pairam sobre a sua gestão suspeitas de fraudes em contratos e licitações. O TCE (Tribunal de Contas do Estado) investiga se houve superfaturamento nas compras de respiradores e oxímetros. Há também a suspeita de manipulação na licitação que pretendia contratar leitos da rede privada para pacientes com covid-19.

Exonerado do cargo em meio a suspeitas, Edmar não ficou sem cargo: Witzel tratou de criar a Secretaria de Acompanhamentos das Ações Governamentais Integradas da Covid-19, feita para que ele a ocupasse. Diante de contestações feitas pela Justiça em relação à sua nomeação, o próprio Edmar pediu para ser desligado formalmente do governo.

Na fundamentação da prisão de Edmar, o MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) afirma que Witzel tentou dar "blindagem" ao aliado nomeando-o ao novo posto no primeiro escalão do governo, com direito a foro privilegiado.

A operação que deteve o ex-secretário apreendeu R$ 8,5 milhões. De acordo com o MP-RJ, o dinheiro foi entregue "espontaneamente por um dos investigados, que estava acompanhado de seu advogado". Não há informação sobre a identidade desse investigado responsável por entregar o dinheiro nem se há relação entre o montante e Edmar Santos.

A defesa dele negou relação do ex-secretário com a quantia milionária e disse que neste momento não se manifestaria sobre a prisão.

Na ocasião da prisão, também foram apreendidos telefones celulares e computadores do ex-secretário. A Justiça também autorizou o arresto de bens de Edmar até o valor de R$ 36,9 milhões, valor equivalente segundo o MP-RJ a recursos públicos desviados em três contratos fraudados para aquisição de equipamentos médicos.

Na última semana, dois dias antes de ser preso, Edmar Santos se recusou a responder a perguntas feitas por integrantes da Comissão Especial de Fiscalização da Alerj (Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro) que apura supostos casos de corrupção durante o estado de emergência.

Orientado por seus advogados, Edmar —que já havia faltado a uma convocação— permaneceu em silêncio e afirmou não ter a obrigação de "produzir provas contra si". Durante mais de uma hora e meia, parlamentares fizeram questionamentos em relação a compras e contratos emergenciais da área da saúde e sobre a destinação de verbas para a construção dos hospitais de campanha.

Apesar disso, o médico permaneceu em silêncio e argumentou que já é alvo de uma investigação no STJ (Superior Tribunal de Justiça). "Quero declarar meu respeito à Alerj, mas não tive acesso integral aos elementos de prova do inquérito STJ, cujos fatos investigados dizem respeito àqueles pelos quais fui chamado aqui. Por isso, fui expressamente orientado pelos meus advogados para utilizar meu direito de silêncio", afirmou.

De acordo com fontes ouvidas pelo UOL, o ex-secretário pretendia faltar mais uma vez à audiência virtual. No entanto, compareceu à reunião por pressão da cúpula da Polícia Militar.