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Governo favorece aliados investigados ao adiar veto ao pacote anticrime

O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em almoço com aliados do PP. Parte da bancada é suspeita de envolvimento em corrupção. - Arthur Lira/Reprodução
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) em almoço com aliados do PP. Parte da bancada é suspeita de envolvimento em corrupção. Imagem: Arthur Lira/Reprodução

Luciana Amaral

Do UOL, em Brasília

19/08/2020 16h22

A adesão do centrão à base parlamentar governista cobra seus custos e faz com que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) busque adiar a análise do veto do pacote anticrime no Congresso Nacional para beneficiar aliados investigados, afirma ala de senadores ligados à bandeira anticorrupção.

O senador Major Olímpio (PSL-SP) disse que o governo vai "alterar mais ainda o pacote anticrime, se puder", e "jogar o prejuízo como incompetência" do ex-ministro da Justiça Sergio Moro.

"O presidente não preza nem a assinatura dele. A única coisa que o governo faz questão é de manter o veto no item que triplicou a pena para crimes contra a honra praticados na internet. Papi vai proteger os pimpolhos", declarou.

A previsão inicial era de que o veto fosse analisado hoje (19) no Congresso Nacional, mas foi adiado após reunião de líderes nesta semana, por pressão da base governista. Agora, a previsão é que seja apreciado em 2 de setembro.

O veto referente ao projeto do pacote anticrime é o mais antigo na fila de espera. O pacote foi defendido por Moro e sancionado em 24 de dezembro do ano passado. Entre os 24 trechos do veto de Bolsonaro, alguns à revelia de Moro, estão a triplicação da pena para crime contra a honra cometido ou divulgado nas redes sociais.

Assim como Olímpio, uma ala de senadores afirmou ao UOL acreditar que Bolsonaro quer manter trecho do veto para que não haja maior pena a crimes na internet em meio a disputas judiciais envolvendo a suspensão de contas no Twitter e no Facebook de influenciadores, empresários e políticos bolsonaristas.

Parte dos alvos é investigada no âmbito do inquérito das fake news no STF (Supremo Tribunal Federal). Sem definição quanto ao veto, eventuais condenações hoje não teriam a pena aumentada.

Outros atuais aliados de Bolsonaro são investigados por suposto envolvimento em crimes de corrupção ou irregularidades. Entre eles, o líder do governo na Câmara, deputado Ricardo Barros (PP-PR), o deputado Arthur Lira (PP-AL) e o senador Ciro Nogueira (PP-PI), com quem o presidente almoçou hoje.

O líder da Minoria no Senado, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), falou que ala na Casa buscará derrubar o veto sobre crimes online. Quanto aos itens restantes, o governo aparenta estar mais flexível para que sejam rejeitados, disse. No entanto, na avaliação de Randolfe, isso não é necessariamente um passo em direção ao combate à corrupção.

"Alguns [vetos] fortalecem as medidas de combate à corrupção. O governo está com interesses parecidos aos do centrão. Há uma aliança bolsonarista com o centrão em favor da corrupção", disse.

O senador Alessandro Vieira (Cidadania-SE) afirmou parecer que o governo "não trata mais o pacote anticrime como prioridade, seguindo a postura do centrão".

Procurado pela reportagem, o líder do governo no Congresso, senador Eduardo Gomes (MDB-TO), disse que a argumentação desses parlamentares é "absolutamente sem sentido".

Sob reserva, um senador afirmou que um ex-líder governista lhe confessou haver divergências quanto aos posicionamentos público e privado do presidente da República.

"O Jair [Bolsonaro] tem uma posição pública e pede para a tropa de choque fazer o serviço. Esses vetos [restantes] foram por solicitação de Moro. A posição do Jair deve ser diferente em vários pontos", relatou.