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Kassio Marques nega plágio em dissertação: 'Produções doutrinárias opostas'

O desembargador Kassio Nunes Marques, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro ao STF - Dida Sampaio/Estadão Conteúdo
O desembargador Kassio Nunes Marques, indicado pelo presidente Jair Bolsonaro ao STF Imagem: Dida Sampaio/Estadão Conteúdo

Do UOL, em São Paulo

07/10/2020 19h22Atualizada em 07/10/2020 19h26

Indicado para substituir Celso de Mello no STF (Supremo Tribunal Federal), o desembargador Kassio Nunes Marques negou hoje que tenha copiado trechos de artigos publicados na internet em sua dissertação de mestrado. Segundo Marques, seu trabalho e o do advogado Saul Torinho Leal, suposta vítima do plágio, são "produções doutrinárias opostas".

"O desembargador Kassio Nunes Marques busca em sua dissertação a autocontenção judicial. O trabalho é diferente do posicionamento do professor Saul Tourinho, defensor do ativismo judicial. (...) A coincidência das citações apontadas provavelmente decorre da troca de informações e arquivos relacionados a um dos temas abordados", justificou a assessoria do desembargador em nota.

A denúncia sobre o suposto plágio foi feita hoje pela revista Crusoé. Segundo a reportagem, Marques teria copiado trechos de artigos escritos por Leal, integrante da banca de advocacia do ex-ministro do STF, Carlos Ayres Britto. Até erros de português foram repetidos, o que indica que o desembargador "copiou e colou" os textos sem revisão.

Com a dissertação, apresentada em 2015 à Universidade Autônoma de Lisboa, em Portugal, Kassio Marques garantiu seu título de mestre em Direito. A Crusoé analisou 127 páginas deste trabalho e identificou pelo menos dez trechos que reproduzem passagens de Leal. O desembargador não faz nenhuma referência ao advogado.

A assessoria de Marques argumenta que, à época, a universidade já dispunha da melhor ferramenta antiplágio de Portugal. A dissertação de mestrado, com todas as citações apontadas, foi avaliada por esse programa e considerada "dentro do padrão exigível pela instituição".

"Vale ressaltar que a titulação acadêmica nunca trouxe nenhuma vantagem financeira para o desembargador, pois não exerceu a docência após a obtenção do título e jamais proferiu nenhuma palestra remunerada, tendo apenas buscado o aperfeiçoamento do exercício da magistratura", concluiu a assessoria.

Trechos supostamente plagiados

Nas páginas 30 e 31 da dissertação de Marques, é possível identificar os primeiros trechos compatíveis a artigos de Leal. O desembargador escreve:

"Na Constituição da Índia, no seu art. 37, ao falar de direitos sociais, diz-se que as disposições contidas nesta Parte não devem ser efetivadas por nenhuma Corte, mas os princípios aqui estabelecidos são, entretanto, fundamentais para o governo do país e deve ser um dever do Estado aplicar esses princípios ao elaborar as leis. O constituinte estabeleceu previsão acerca do conteúdo meramente programático dos direitos sociais, não só endereçando-os exclusivamente ao governo do país, mas vedando, taxativamente, a inserção, do Poder Judiciário, nas discussões relativas à concretização do direito à saúde. Não foi o que aconteceu no Brasil."

Já o artigo do advogado Saul Tourinho Leal diz:

"A Constituição da Índia, no seu art. 37, ao falar de direitos sociais, diz-se que 'as disposições contidas nesta Parte não devem ser efetivadas por nenhuma Corte, mas os princípios aqui estabelecidos são, entretanto, fundamentais para o governo do país e deve ser um dever do Estado aplicar esses princípios ao elaborar as leis'. No caso indiano o constituinte estabeleceu previsão expressa acerca do conteúdo meramente programático dos direitos sociais, não só endereçando-os exclusivamente ao governo do país, mas vedando, taxativamente, a inserção do Poder Judiciário nas discussões relativas à concretização do direito à saúde. Não foi o que aconteceu no Brasil".

Em outro trecho, Kassio Marques reproduz um erro ortográfico. Nos dois trabalhos, o país africano Namíbia aparece como "Naníbia":

"Por sua vez, p art. 101 da Constituição da Naníbia diz que os princípios da política de estado contidos neste Capítulo não devem ser, por si sós, exigíveis legalmente por qualquer Corte, mas deve, entretanto, guiar o governo na elaboração e aplicação das leis para dar eficácia aos objetivos fundamentais dos referidos princípios", diz o trabalho assinado pelo desembargador.

No texto de Tourinho Leal, o texto:

"O art. 101 da Constituição da Naníbia diz que "os princípios da política de estado contidos neste Capítulo não devem ser, por si sós, exigíveis legalmente por qualquer Corte, mas deve, entretanto, guiar o governo na elaboração e aplicação das leis para dar eficácia aos objetivos fundamentais dos referidos princípios".