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Entenda a diferença entre os casos de Daniel Silveira e Felipe Neto

Felipe Neto e Daniel Silveira respondem pela Lei de Segurança Nacional - Leo Aversa/Agência O Globo/divulgação - Felipe Neto/Dida Sampaio/Estadão Conteúdo
Felipe Neto e Daniel Silveira respondem pela Lei de Segurança Nacional Imagem: Leo Aversa/Agência O Globo/divulgação - Felipe Neto/Dida Sampaio/Estadão Conteúdo

Arthur Stabile

Colaboração para o UOL, de São Paulo

16/03/2021 17h12

Autoridades enquadraram tanto o deputado federal Daniel Silveira (PTB-RJ) quanto o youtuber Felipe Neto na Lei Nº 7.170/83, a LSN (Lei de Segurança Nacional). Enquanto o parlamentar ficou preso e, agora, responde em prisão domiciliar, o influencer é alvo de um inquérito. Advogados criminais explicam as diferenças dos dois casos.

Silveira teve prisão determinada pelo ministro do STF (Supremo Tribunal Federal) Alexandre de Moraes após publicar um vídeo no YouTube com ofensas e ameaçando dar um soco em ministros do Supremo.

Neto responde inquérito da Polícia Civil do Rio de Janeiro por chamar o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) de "genocida" em um post no Twitter. O influenciador denunciou o caso nas redes sociais e chamando de perseguição política. "Estou preocupado com a situação do nosso país e as ameaças à liberdade de expressão", afirmou ele à BBC.

Para André Lozano, professor de processo penal na Universidade São Judas e mestre em direito penal pela PUC, há uma diferença simples entre as declarações de Silveira e Neto: um incita agressões, enquanto o outro faz "crítica política".

"Ambas, tanto de Silveira quanto de Felipe Neto, são críticas. Só que na do Daniel ele está estimulando a violência e o ódio contra os ministros. No caso de Neto, não tem qualquer tentativa de estimular ódio ou violência contra o presidente", continua.

O deputado federal é investigado pelo Supremo nos inquéritos de fake news e dos atos antidemocráticos, "o que faz com que a conduta seja vista com gravidade um pouco maior", segundo Lozano.

O advogado explica que a prisão ocorreu dentro de um "rito correto", ainda que seja uma medida questionável, enquanto a intimação de Neto não caberia à polícia do Rio, mas à Polícia Federal, como ocorreu com o deputado.

É absolutamente ilegal e, ouso dizer, criminosa, a atuação da Polícia Civil do Rio de Janeiro nesse sentido. Demonstra que existe uma perseguição a opositores ao governo Bolsonaro.

Hugo Leonardo, presidente do IDDD (Instituto de Defesa pelo Direito de Defesa), define como "absolutamente inconstitucional" a Lei de Segurança Nacional contra qualquer cidadão.

"Sempre que for usada para perseguir pessoas a partir de manifestações de pensamento, será um problema", diz, ainda que emita "repúdio" aos ataques de Daniel à democracia. "Trata-se de um sujeito que mistura imunidade parlamentar com cometimento de crimes a torto e a direito".

Segundo ele, a prisão de Silveira está diretamente ligada à intimação de Felipe Neto. "Estamos vivendo uma subversão no estado democrático de direito. O que há é um nítido esgarçamento das instituições e vivemos para além da legalidade", define.

'Demanda dos Bolsonaros é retrocesso aos anos 1960'

O criminalista Emerson Tauyl faz análise diferente, ainda que concorde que a LSN não teria aplicação para ambos. Ele vê disparidade no tratamento do deputado e do youtuber, mas pelo fato de um responder em prisão domiciliar e o outro ser chamado a prestar esclarecimentos.

"É desproporcional. Não é tratar paixões políticas, como operadores do Direito. Temos a função de bem aplicar o bem jurídico. Não vejo proporção razoável", justifica ao ver as ações "dentro da normalidade", não fosse a aplicação da LSN nos dois casos.

"Quando se criou a lei, a ideia não era essa. Vejo um retrocesso. Fala-se tanto da ditadura, de autoritários, fascistas, e estão retroagindo de uma forma penal e política aplicando-se uma lei da ditadura", critica.

Denise Dora, diretora da Artigo 19, defende o banimento da LSN por ter sido responsável pela perseguição de ativistas e impedir, por exemplo, o direito do habeas corpus. "É uma lei extremamente cruel, pensada para calar as pessoas", justifica.

Além de Silveira e Neto, a lei foi usada na prisão de um jovem de 24 anos em Uberlândia. Na véspera da visita de Bolsonaro à cidade, ele postou nas redes sociais: "alguém fecha virar herói nacional?". O comentário foi suficiente para a PM mineira enquadrá-lo na LSN e prendê-lo.

"Interpretamos como um grave risco à democracia. A LSN foi e é instrumento de uso autocrático do estado contra os seus cidadãos", explica, diferenciando as ações contra o youtuber e o deputado.

"Foi importante o STF ter dito que há uma linha de respeito às instituições [contra Daniel]. No caso do Felipe, a demanda da família Bolsonaro é um retrocesso ao final dos anos 1960: é para calar as pessoas", compara.