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Processos da Lava Jato contra Lula devem prescrever; entenda

Situação do petista é favorável, avaliam advogados, juízes e ex-procuradores da Lava Jato Imagem: Edilson Dantas/Ag.Globo

Eduardo Militão

Do UOL, em Brasília

15/04/2021 18h53Atualizada em 15/04/2021 23h55

São grandes as chances de todos os processos ainda existentes contra o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) caducarem sem nunca serem julgados em definitivo. Isso porque o plenário do STF (Supremo Tribunal Federal) confirmou que quatro ações da Lava Jato contra o petista vão recomeçar em outra vara da Justiça Federal.

A idade de Lula, o período dos fatos considerados criminosos e o tamanho das punições contribuem para isso, segundo três advogados, um juiz e três ex-procuradores da Lava Jato consultados pelo UOL. Eles entendem ser quase certo que os casos estão "prescritos" ou, pelo menos, que o petista não será punido ao final dos processos por causa da demora das engrenagens do Judiciário.

A chamada "prescrição" acontece quando um processo demora demais para julgar um fato do passado. A contagem se refere à data do crime até o momento em que o juiz "recebe" a denúncia e abre uma ação penal.

Assim, mesmo que o político seja culpado ou inocente, a Justiça nunca vai esclarecer isso, punindo-o ou lhe dando uma espécie de "certidão positiva".

De outro lado, advogados defendem a prescrição para impedir que o Estado passe tempo demais exigindo explicações e punições dos cidadãos que eventualmente transgridam a lei. "Tudo muda com o passar do tempo, e, se eu pudesse punir alguém 50 anos depois do fato, eu já estaria gerando injustiça maior que a reparação do dano", explica o criminalista Daniel Gerber.

Sítio poderia tirar petista das eleições

O caso do sítio de Atibaia é um exemplo. Lula foi condenado a 17 anos de prisão por corrupção e lavagem de dinheiro, em segunda instância. Segundo a acusação, a partir de 2010, quando ainda era presidente, ele se beneficiou de reformas na propriedade rural que, embora em nome de terceiros, estava sob seu poder. As construtoras Odebrecht e OAS tinham contratos com o governo federal.

A ordem do ministro do STF Edson Fachin diz que todos os atos judiciais contra o petista - incluindo o do processo do sítio - devem ser anulados. Isso permitiu a Lula ter condições de disputar as eleições de 2022. No entanto, os juízes das Varas Federais de Brasília podem reaproveitar tudo o que foi apurado pela 13ª Vara Federal de Curitiba. O primeiro passo seria receber a denúncia.

Mas, mesmo que isso seja confirmado imediatamente, vários crimes já estarão prescritos na "largada" da ação penal. Os crimes de corrupção no caso do sítio estariam extintos desde janeiro de 2020, avaliam eles.

"Como na sentença ele terá mais que 70 anos, cai para oito anos corrupção e lavagem", explica o cientista político e advogado criminalista Rafael Favetti.

Lula tem 75 anos, e a lei prevê que maiores de 70 tenham o benefício de prescrição com prazos pela metade.

Crimes que passam de oito anos do período do fato até o recebimento da denúncia, que ainda vai ocorrer, devem ser declarados prescritos"
Rafael Favetti, cientista político e advogado

Doutor em Direito pela Universidade Federal de Minas Gerais, Eugênio Pacelli também vê "muitas" chances de prescrição dos processos de Lula.

Haveria uma saída. As acusações de lavagem de dinheiro do sítio de Atibaia e, eventualmente, do caso do tríplex em Guarujá ainda poderiam ser recebidas pela Justiça. No caso do sítio, o prazo seria até agosto de 2022, para julgar ao menos um dos fatos mencionados na denúncia.

Lula pode ficar livre no momento das sentenças

Mas isso não esgota os problemas, anotam os ex-procuradores da Lava Jato e o criminalista Daniel Gerber. É que a prescrição acontece enquanto o processo anda. Ou seja, nenhuma punição é aplicada por causa da demora em ser dada uma sentença ou dos acórdãos, que são as decisões dos tribunais sobre os recursos do caso.

A prescrição acontece em vários níveis. É do fato até a denúncia, da sentença até o acórdão e do acórdão até o trânsito em julgado [fim do processo]"
Daniel Gerber, criminalista

Além disso, as condenações anuladas de Lula, mesmo anuladas, servirão de base para as novas decisões dos juízes de Brasília, apostam as fontes ouvidas pelo UOL. E o motivo é que a análise dos juízes excluiu alguns fatos apontados contra o petista.

No caso do tríplex, o ex-juiz Sergio Moro absolveu Lula da acusação de lavar dinheiro no armazenamento do acervo presidencial. A Justiça de Brasília deve descartar isso também, avaliam ex-procuradores. Com menos crimes sendo avaliados, as chances de tudo prescrever aumentam.

Anulação de provas e novas suspeições preocupam

As mesmas dificuldades vistas nos casos do sítio e do tríplex se estendem às outras duas ações que Fachin enviou às varas de Brasília: a que trata da sede do Instituto Lula e que se refere a doações de empreiteiras à entidade comandada pelo petista.

O processo do tríplex ainda tem um problema adicional. Nele, a 2ª Turma do STF considerou o ex-juiz Sergio Moro parcial. Portanto, o processo sequer poderia ser reiniciado. Neste caso, as provas estão anuladas, avaliam servidores do Supremo e investigadores.

A ação do tríplex é fortemente baseada numa busca e apreensão de documentos na residência do petista, em São Bernardo do Campo. Sem essa prova, pouco sobra do processo.

Como Moro foi considerado suspeito nesta ação penal, outra possibilidade é que isso seja aplicado em novos julgamentos das outras três ações. Assim, mais provas e buscas e apreensões seriam desconsideradas. Sem provas documentais consideradas legais, uma ação não se sustenta apenas com depoimentos de testemunhas e colaboradores - confissões de réus que contaram sua versão dos fatos em troca de benefícios.

Ainda que tudo isso seja vencido, surge mais uma questão: o tamanho das penas a serem eventualmente aplicadas a Lula também importa. Se o petista for condenado a uma pena mais baixa do que a punição máxima prevista para o crime, o prazo de prescrição muda. Isso tem potencial para favorecer o petista. O motivo é que a situação mais comum no país é que as penas sejam baseadas no mínimo legal, reforçam as fontes consultadas pela reportagem.

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