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Governistas pedem dados sobre UTIs, vacina e salário a estados e municípios

Djalma Junior/Secretaria de Estado da Saúde do Amazonas
Imagem: Djalma Junior/Secretaria de Estado da Saúde do Amazonas

Carlos Madeiro

Colaboração para o UOL, em Maceió

23/05/2021 04h00

Senadores que apoiam o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) e integram a CPI da Covid enviaram uma série de ofícios a estados e municípios cobrando informações que extrapolam o teor previsto da investigação —que deve se limitar, no caso desses entes, às verbas federais enviadas.

Os pedidos incluem dados que vão desde protocolos de uso de remédios a folhas de pagamento. Também há solicitação de informações sobre apurações das polícias e procuradorias dos estados, sobre leitos de hospitais e até de eventuais pagamentos a pessoas que foram candidatas em 2020.

Até quinta-feira (20), foram encaminhados pela CPI 1.120 ofícios com pedidos a pessoas, órgãos de governos, entidades e empresas privadas. Desses:

  • 284 eram endereçados a prefeituras,
  • 162 a estados,
  • 188 a secretarias estaduais de Saúde e
  • 130 a pastas municipais.

Governadores reagiram ao teor dos ofícios e pediram esclarecimentos à CPI. Para a oposição, os documentos têm o objetivo político de dificultar a apuração com pedidos excessivos e fora do escopo da investigação.

A CPI da Covid, criada após ordem do STF (Supremo Tribunal Federal), tem como missão apurar, no prazo de 90 dias, "as ações e omissões do governo federal no enfrentamento da pandemia da covid-19 no Brasil e, em especial, no agravamento da crise sanitária no Amazonas com a ausência de oxigênio para os pacientes internados".

Ainda segundo a descrição do objetivo, a CPI tem investigação "limitada apenas quanto à fiscalização dos recursos da União repassados aos demais entes federados para as ações de prevenção e combate à pandemia da covid-19, e excluindo as matérias de competência constitucional atribuídas aos estados, Distrito Federal e municípios".

O que foi pedido a estados e municípios

O campeão em pedidos a estados e municípios é o senador Eduardo Girão (Podemos-CE), que fez uma extensa lista nos ofícios encaminhados a prefeituras e governos dos estados.

Entre os pedidos estão:

  • A quantidade de leitos de UTIs (unidades de tratamento intensivo) de hospitais públicos e conveniados entre 2019 e 2021;
  • Os documentos relativos à aquisição frustrada de respiradores através de contratação do Consórcio Nordeste;
  • As doações em dinheiro, material ou cessão de uso de bens móveis ou imóveis para ajudar na pandemia;
  • Todos os contratos e aditivos firmados durante a pandemia relativos às transferências de recursos a instituições privadas sem fins lucrativos, a exemplo das OS's e OSCIP's, principalmente aquelas que tenham atuação na área da saúde;
  • A lista de fornecedores que tenham sido contratados para a prestação de serviços no enfrentamento à pandemia da covid-19 e que prestaram serviços para candidatos na cidade no pleito de 2020;
  • A evolução da folha de pagamento por função de governo, iniciando a série histórica em março de 2020 e finalizando na competência de março de 2021, além da comparação com o mesmo período do ano anterior, informando o crescimento percentual e fonte de recursos;
  • Informações relativas ao eventual desembolso de pagamento para a aquisição da vacina Sputnik V, especificando a quantidade de doses adquiridas, o instrumento legal para a contratação e a modalidade licitatória.

Ainda no Ceará, onde faz oposição ao governador Camilo Santana (PT), Girão faz um pedido à parte: solicitou informações sobre uma requisição administrativa do governo do estado de medicamentos e produtos médico-hospitalares, em abril de 2020, disponíveis em estoque.

"Relevantes são os esclarecimentos acerca do direcionamento dos itens retidos pelo governo do Ceará, mais especificamente quanto aos fármacos: hidroxicloroquina, cloroquina e azitromicina", diz o ofício.

Procurado pelo UOL, Girão disse que o objetivo dos pedidos é "constatar se as dezenas de bilhões de reais enviadas pelo governo federal para estados e municípios brasileiros foram realmente aplicados no enfrentamento à covid ou tiveram outro fim como para cobrir rombos nas contas públicas desses entes federativos e utilizados em outras áreas fora a saúde".

"Temos exemplos de cidades que estavam com as contas no vermelho e conseguiram se equilibrar após as verbas federais na pandemia. Queremos analisar esses números com cautela e sempre dando a ampla defesa e o direito ao contraditório, diferentemente de membros da CPI, incluindo aí o relator, que já fez antecipação de julgamento antes mesmo de ser instalada a comissão", argumenta.

Outros casos

Já o senador Marcos Rogério (DEM) solicitou a todas as prefeituras de capitais e governos estaduais, informações sobre "os protocolos medicamentosos utilizados no tratamento de pacientes com covid-19."

Em outro ofício, o pedido é extenso, e foi enviado para estados e prefeituras pedindo "as notas de empenho, ordens bancárias, notas fiscais, processos administrativos de despesa irá os recursos federais destinados a cada um daqueles entes federados para o combate à covid-19, incluindo, ainda: os extratos bancários e os documentos bancários de comprovação de todos os débitos e créditos ocorridos nas respectivas contas".

O senador Ciro Nogueira (PP-PI) solicitou às 27 diretorias de Polícia Civil e à Polícia Federal cópia integral de todos os inquéritos ou investigações em qualquer fase relativos à aplicação de "recursos federais destinados aos estados, Distrito Federal e municípios de até 200 mil habitantes para o combate à covid-19, bem como de todos os bancos de dados criados pelos respectivos órgãos policiais, relativos à mesma matéria".

O mesmo pedido foi feito às 27 Procuradorias Gerais de Justiça dos estados e do Distrito Federal e ao MPF (Ministério Público Federal).
O UOL enviou pedido de informações aos três senadores citados, mas não recebeu resposta até a publicação desta reportagem.

Governadores reclamam oficialmente dos pedidos

A overdose de pedidos irritou governadores. Na última terça-feira (18), 18 deles enviaram um ofício ao presidente da CPI, Omar Aziz (PSD-AM), para que oriente o que deve e o que não deve ser respondido.

Existe um grande número de pedidos para esticar os prazos dados (dez dias em regra) por conta do volume de informações. A Prefeitura de João Pessoa, por exemplo, solicitou mais 30 dias. Outras pedem períodos menores, mas cobram ampliação.

Para a oposição, o volume e teor das informações solicitadas extrapolam o limite da investigação federal e tentam incluir indevidamente na apuração atos de prefeitos e governadores. "O objetivo desses requerimentos é claramente político", diz o senador Humberto Costa (PT-PE), que integra a CPI.

"A gente investiga aqui os recursos da covid que foram transferidos voluntariamente pela União, mas para o qual existam denúncias. Não existe isso de pedir folha de pagamento, protocolo de remédio. Não é esse o objetivo da comissão", afirma o senador. Segundo ele, a CPI já decidiu que não vai mais aprovar requerimentos que fujam ao limite estipulado pelo regimento.