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Arsenal de Witzel contra Bolsonaro na CPI tem Marielle, Queiroz e milícia

CPI da Covid realiza oitiva do ex-governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel - Jefferson Rudy/Agência Senado
CPI da Covid realiza oitiva do ex-governador do Rio de Janeiro, Wilson Witzel Imagem: Jefferson Rudy/Agência Senado

Igor Mello

Do UOL, no Rio

16/06/2021 18h21

Adotando postura de franco-atirador, o ex-governador do Rio Wilson Witzel (PSC) levou à CPI da Covid uma série de acusações contra Jair Bolsonaro. O arsenal do ex-juiz federal —inimigo jurado dos Bolsonaro— contou com insinuações sobre as investigações da morte da vereadora Marielle Franco, suposto envolvimento de milícias com aliados do presidente e o escândalo da rachadinha no gabinete de Flávio Bolsonaro (Patriota-RJ).

A ida de Witzel à CPI se deu por articulação dos senadores governistas, em um lote que também aprovou a convocação de nove governadores. Contudo, a medida —que tinha como objetivo tirar o foco da comissão dos atos do governo federal para possíveis escândalos de corrupção nos estados— saiu pela culatra.

De posse de liminar concedida pelo STF (Supremo Tribunal Federal), Witzel compareceu à CPI sem o compromisso de falar apenas a verdade e com direito a deixar o Senado no momento que quisesse.

Muitas vezes em tabelinha com a oposição, Witzel centrou as baterias em Bolsonaro —a quem acusou de ter boicotado as medidas de isolamento nos estados e de ter recusado o emprego dos hospitais federais no Rio para pacientes com covid-19.

No auge da pandemia no estado, 1.243 dos 2.803 leitos federais existentes em unidades no Rio estavam fechados por falta de pessoal, insumos, equipamentos ou obras.

Em contrapartida, o ex-juiz praticamente não foi pressionado em relação às denúncias de corrupção na saúde do Rio, que levaram ao seu impeachment e à prisão de seu primeiro secretário de Saúde, Edmar Santos.

Caso Marielle

Um tema que apareceu frequentemente hoje no discurso de Witzel foi a morte de Marielle Franco.

Ele atribuiu o início da articulação de seu impeachment ao avanço da investigação, sobretudo após o vazamento do depoimento do porteiro do condomínio Vivendas da Barra, onde Bolsonaro morava antes de assumir a Presidência. No mesmo local vivia Ronnie Lessa, apontado como um dos executores do crime.

Ouvido pela Polícia Civil, o porteiro afirmou que foi o "seu Jair" quem autorizou a entrada do outro acusado pelas mortes de Marielle e Anderson, o ex-PM Élcio de Queiroz, ao condomínio no dia do crime. Posteriormente, investigação do MP-RJ (Ministério Público do Rio de Janeiro) mostrou que foi o próprio Lessa, e não Bolsonaro, quem liberou a entrada do comparsa.

Em outro momento, Witzel afirmou que gostaria de aprofundar as denúncias em uma reunião sigilosa com os membros da CPI, para não prejudicar uma eventual investigação: "São fatos graves", apontou.

A menção ao porteiro fez com que Flávio Bolsonaro interrompesse o depoimento e iniciasse um bate-boca. O ex-governador chamou o filho 01 do presidente de "mimado" e disse que não aceitaria nenhum tipo de pressão.

"Senador, pode ficar tranquilo que eu não sou porteiro. Não vai me intimidar, não", disparou.

Dobradinha com Renan Calheiros

A dobradinha mais explícita ocorreu entre Witzel e o relator da CPI, Renan Calheiros (MDB-AL). Desafeto do governo, o ex-presidente do Senado usou o interrogatório para provocar Flávio Bolsonaro, com quem trocou ofensas durante a oitiva de Fabio Wajgarten, ex-chefe da Secom (Secretaria de Comunicação).

Renan fez uma série de perguntas a Witzel sobre a investigação do escândalo das rachadinhas.

Também repercutiu revelação da jornalista Juliana Dal Piva, colunista do UOL, de que Fabrício Queiroz foi fotografado no estacionamento do Palácio Guanabara após a chegada de Cláudio Castro (PSC) ao governo do Rio.

Evelyn Melo de Queiroz, filha do ex-assessor de Flávio, foi nomeada por Castro para um cargo na Secretaria da Casa Civil —a contratação foi revogada após chegar à imprensa.

Witzel voltou a repetir o discurso de que foi derrubado do Palácio Guanabara pelo que chamou de "máfia da saúde", a quem disse ter combatido. Segundo ele, esse grupo —cujos participantes não foram nomeados— atua em articulação com milícias no Rio. Sugeriu, entretanto, que se quebre os sigilos de uma série de OSs (Organizações Sociais) que atuam no estado.

"Eu tenho certeza de que tem miliciano envolvido por trás disso, eu corro risco de vida", alegou.

Posteriormente, o ex-governador foi perguntado sobre a falta de ação dos hospitais federais durante a pandemia. Witzel disse ter proposto ao governo federal assumir as unidades no Rio, tendo como contrapartida o financiamento federal, mas disse não ter sido atendido.

Foi também questionado sobre a suposta ação de milicianos no Hospital Federal de Bonsucesso, o maior do Rio, denunciada pelo então ministro Gustavo Bebbiano em 2019.

Witzel então recomendou a quebra de sigilos de empresas contratadas e ex-superintendentes responsáveis pelas unidades no Rio para descobrir quem é o "dono" dos hospitais federais —nos bastidores, atribui-se a Flávio Bolsonaro uma série de nomeações nas unidades.

Witzel foi questionado sobre as denúncias de corrupção ao fim da sessão, quando senadores governistas tiveram a palavra. Jorginho Mello (PL-SC), apoiador de Bolsonaro, perguntou sobre os contratos firmados pelo escritório da mulher de Witzel, Helena, com empresas investigadas pelo MPF. O senador chamou os depósitos de "propina", conforme acusação feita pelo MPF.

O ex-governador retrucou, dizendo que falar em propina era "leviano". Jorginho então subiu o tom: "Leviano é você, que foi cassado", rebateu.

Quando o senador General Girão (Podemos-CE), um dos mais próximos aliados do governo, iniciou suas perguntas, Witzel comunicou que deixaria a sessão.

O vice-presidente da CPI, Randolfe Rodrigues (Rede-AP), solicitou então uma oitiva sigilosa para que Witzel apresente novos elementos sobre as denúncias que fez, como o próprio ex-juiz já havia pedido.

A CPI da Covid foi criada no Senado após determinação do Supremo. A comissão, formada por 11 senadores (maioria era independente ou de oposição), investigou ações e omissões do governo Bolsonaro na pandemia do coronavírus e repasses federais a estados e municípios. Teve duração de seis meses. Seu relatório final foi enviado ao Ministério Público para eventuais criminalizações.