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Recursos federais 'vieram no laço', diz ex-governador Witzel à CPI da Covid

Thaís Augusto e Hanrrikson de Andrade

Do UOL, em São Paulo e em Brasília

16/06/2021 11h47Atualizada em 16/06/2021 13h32

O ex-governador do Rio Wilson Witzel declarou hoje, em depoimento à CPI da Covid, que as verbas federais destinadas a custear ações de enfrentamento à pandemia "vieram em cima do laço" —isto é, quase no limite do que seria um prazo aceitável.

Witzel relatou que, em face do atraso para injeção de recursos do Ministério da Saúde, o Executivo estadual chegou a cogitar a possibilidade de sugerir cortes nos salários do funcionalismo público.

"Demorou o auxílio emergencial, demorou os recursos que foram encaminhados para completar o orçamento dos estados. Nós tínhamos até imaginado a possibilidade de redução do salário de servidores para poder fazer frente ao controle da pandemia", disse.

"Os recursos vieram, em cima do laço, e conseguimos dar continuidade, mas até lá tivemos dificuldade", emendou o ex-governador.

O ex-governador fluminense comparece hoje à comissão na condição de testemunha convocada. Ele optou por não fazer uso do direito a habeas corpus deferido ontem (15) pelo ministro Kassio Nunes Marques, do STF (Supremo Tribunal Federal).

A decisão da Corte autorizava o depoente a se ausentar, sob argumento de que ele teria o direito de "não produzir provas contra si mesmo", pois já é investigado pelo MPF-RJ (Ministério Público Federal do Rio).

Witzel também declarou que o dinheiro repassado a estados e municípios não foi suficiente. Afirmou ainda ter manifestado incômodo com a demora para aprovação do auxílio emergencial (socorro financeiro criado durante a pandemia para suprir queda abrupta de renda).

"Você pede para que fiquem em casa porque é necessário e a população não tem uma resposta do auxílio na mesma agilidade que as medidas de combate a pandemia eram acionadas. Evidentemente você tem dificuldade de conduzir a pandemia".

Governadores ficaram 'desamparados', diz Witzel

Witzel relatou que, de acordo com o seu entendimento, prefeitos e governadores ficaram "desamparados" e sem canal de diálogo com a União durante a pandemia do coronavírus.

O depoente, cujo mandato foi cassado devido a acusações de corrupção na área da saúde, criticou o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), a quem ele se opõe no cenário político.

Na versão do depoente, o chefe do Executivo federal "politizou" a pandemia e criou "narrativas" de enfrentamento aos governos locais por divergências em relação a temas como o isolamento social.

"Os governadores, prefeitos de grandes capitais e de pequenas cidades, ficaram totalmente desamparados do apoio do governo federal. É uma realidade inequívoca que está documentada em várias cartas que nós encaminhamos ao presidente", disse Witzel.

"Fizemos várias reuniões suplicando ao presidente da República que nos atendesse, que pudéssemos conversar para encontrar soluções em conjunto, soluções que outros países encontraram."

Segundo Witzel, nas poucas reuniões que teriam ocorrido com Bolsonaro, houve percepção coletiva de que a chefia do governo federal se empenhava em politizar o assunto e transformar governadores em rivais. "[O governador de São Paulo João] Doria foi frontalmente atacado de forma descortês".

Witzel disse ainda ter feito pedidos de ação conjunta entre o Executivo e os governos estaduais, o que, segundo ele, não foi acatado.

O depoente também defendeu a ação de governadores. "Desde o início do controle da pandemia, buscamos tomar as medidas de acordo com as orientações da OMS (Organização Mundial da Saúde)".

O ex-governador usou o espaço de fala na abertura da audiência da CPI da Covid para se defender das acusações pelas quais teve o mandato cassado.

Na versão dele, o impeachment foi resultante de uma suposta tentativa de perseguição política relacionada às investigações do caso Marielle.

"Tudo isso começou porque eu mandei investigar sem parcialidade o caso Marielle. Quando foram presos os dois executores da Marielle, o meu calvário e a perseguição conta mim (foram) inexoráveis."

A argumentação de Witzel, que faz parte de uma estratégia de defesa, não é baseada em fatos apurados pelas instituições competentes.

Impeachment

A cassação do mandato de Witzel foi confirmada por um tribunal especial misto (formado por deputado estaduais do Rio e desembargadores) em 30 de abril deste ano. Ele foi condenado, por unanimidade, pelo crime de responsabilidade após denúncias de corrupção durante a pandemia. Witzel nega ter cometido irregularidades.

Na CPI da Covid, senadores esperam ouvir de Witzel detalhes sobre a destinação e aplicação de verbas federais para custeio de ações de enfrentamento à covid-19. Esse é um dos pontos de interesse da comissão, sobretudo da ala formada por congressistas aliados ao governo do presidente Jair Bolsonaro (sem partido).

Com a pressão para ampliar o escopo da investigação e abranger governadores e prefeitos, os parlamentares da "tropa de choque bolsonarista" tentam amortecer o impacto do foco nas ações e eventuais omissões do Ministério da Saúde no decorrer da crise sanitária, que perdura desde o período entre fevereiro e março de 2020.

A CPI da Covid foi criada no Senado após determinação do Supremo. A comissão, formada por 11 senadores (maioria era independente ou de oposição), investigou ações e omissões do governo Bolsonaro na pandemia do coronavírus e repasses federais a estados e municípios. Teve duração de seis meses. Seu relatório final foi enviado ao Ministério Público para eventuais criminalizações.