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Bolsonaro tem mais responsabilidade do que mera prevaricação, diz Renan

Rayanne Albuquerque, Gabriel Toueg e Leticia Simionato

Do UOL e colaboração para o UOL, em São Paulo

28/06/2021 10h14Atualizada em 29/06/2021 07h43

O relator da CPI da Covid, senador Renan Calheiros (MDB-AL), declarou hoje ao UOL Entrevista que o presidente Jair Bolsonaro (sem partido) tem mais responsabilidade diante das suspeitas do contrato superfaturado na compra da vacina indiana Covaxin "do que mera prevaricação".

O presidente [Bolsonaro] não só teria praticado crime de prevaricação, como também participou em todos os momentos da aquisição dessa vacina, da Covaxin. Ele telefonou ao primeiro-ministro da Índia, mandou mensagem, colocou o Itamaraty, que durante todo o período fez uma espécie de advocacia administrativa. O presidente tem mais responsabilidade com isso do que mera prevaricação."
Renan Calheiros

O parlamentar lembrou que, durante depoimento à CPI, o deputado Luis Miranda (DEM-DF) disse que Bolsonaro tinha conhecimento do esquema irregular de compra do imunizante. "Eu fiz uma pergunta ao deputado Luis Miranda: 'Quando o senhor falou com o presidente sobre a Covaxin, qual foi a impressão que colheu? Você acha que ele já sabia desse assunto?' E ele disse: 'Ah, senador, sabia tudo. Sabia até quem era o líder disso'. Ele [Miranda] respondeu isso na CPI", disse Renan. "O presidente participou em todos os momentos da compra da Covaxin".

Acho que [a comissão] já tem elementos [para indiciar Bolsonaro] nessa fase e que terá mais."
Renan Calheiros

Entrevistado pelos colunistas Josias de Souza e Tales Faria, Renan disse ainda que a Comissão Parlamentar de Inquérito está aprofundado os trabalhos, e que agora avança na fase da verificação para saber se houve ou não corrupção.

O colegiado conta com sigilos quebrados para conferir informações e já tem detalhes novos, segundo o relator.

Tivemos esses depoimentos dos irmãos Miranda com revelações e até com promessas de outras revelações. E estamos sendo procurados por várias pessoas de diversas fases que querem depor, colaborar com a investigação. Nós vamos para essa nova fase assim com a expectativa muito grande de que também com relação a ela, tem muitos elementos."
Renan Calheiros

Gravação de Luis Miranda

Questionado sobre a existência de uma suposta gravação da conversa que o deputado Luis Miranda (DEM-DF) e seu irmão, o servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, tiveram com Bolsonaro, Renan lembrou que o parlamentar indicou que podem haver outras provas, mas disse não saber se existe a gravação.

O deputado (Luis Miranda) falou na própria CPI, em vários momentos advertiu que ele poderia ter outras provas de como comprovar ainda mais. De modo que essa expectativa existe, mas eu não sei se existe ou não a gravação."
Renan Calheiros

Ricardo Barros e Covaxin

O senador mencionou, ainda, que a "maneira como o presidente se calou sobre a conversa dos irmãos Miranda", que abriu um novo capítulo dentro da CPI, "terá desdobramentos". Segundo ele, caso o deputado Ricardo Barros não fale, "ele estará incriminando o líder do seu governo". Barros foi apontado por eles como Citado o pivô das supostas irregularidades em torno da Covaxin.

Esse esquema é um esquema gigantesco. É uma coisa grandiosa, que será investigada. Nós já comprovamos o gabinete paralelo, a tese da imunidade de rebanho que foi procurada e o presidente continua a procurar. Muita coisa vai acontecer."
Renan Calheiros

Segundo ele, a CPI pretende ouvir o deputado, como convidado, nas próximas semanas. "Nós aceitamos para facilitar a convocação. A ideia é aprovar amanhã e não pegar o depoimento nos próximos 15 dias porque a investigação está avançando e, igualmente, outras pessoas precisam ser ouvidas. É muito melhor que nos tenhamos acesso a outras informações, para quando ouvirmos o deputado, já ouvirmos com uma outra condição do acesso".

"Ministério da Saúde" paralelo

Segundo Calheiros, a CPI já comprovou a existência de um gabinete paralelo que atuava orientando o presidente Jair Bolsonaro (sem partido), assim como "a tese da imunidade de rebanho que foi procurada e o presidente continua a procurar".

Queiroga está muito mal. Ele tem procurado se equilibrar, tem se agarrado ao cargo, mentiu muito no primeiro e no segundo depoimentos e tem procurado obscurecer tudo o que a a comissão quer investigar."
Renan Calheiros

Para o parlamentar, o que existe, na realidade, é um Ministério da Saúde paralelo, e não apenas um gabinete — como apontam os depoimentos colhidos pelo colegiado.

O Queiroga precisa colaborar, ele não vai fazer diferentemente do que fizeram [os ex-ministros da Saúde Luiz Henrique] Madetta e o [Nelson] Teich, de se segurar no ministério, porque agora se sabe que paralelo não era o gabinete das sombras, paralelo era o ministério, porque o gabinete despachava com o presidente sobre políticas públicas, tratamento precoce. O gabinete priorizava despesas em detrimento do ministério, dos ministros que tentaram enfrentar o gabinete caíram. Talvez por isso o Queiroga prefira ser ministro do Ministério da Saúde paralelo."
Renan Calheiros

Outro nome que pode ser ouvido pela CPI é Andrea Barbosa, ex-mulher do ex-ministro, general Eduardo Pazuello, que procurou a Comissão Parlamentar de Inquérito para ser ouvida. O pedido foi feito diretamente ao senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP), que atua como vice-presidente do colegiado.

O presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz (PSD-AM), Andrea elencou apenas questões pessoais relacionadas à Pazuello e ao casamento que tiveram. Na avaliação do parlamentar, o assunto não deveria ser abordado pela comissão.

Ela nos procurou, mandou um e-mail, pormenorizado e depois pediu para novamente conversar conosco. Vamos marcar para o inicio da semana essa conversa. Claro que nós aceitamos qualquer colaboração. As pessoas dizem: 'É tudo pessoal, não há nenhum fato grave'. Há um fato gravíssimo, que é o fato de Pazuello ter nomeado a sua atual companheira para exercer uma função importante no Ministério da Saúde."
Renan Calheiros

Onyx Lorenzoni deve ser convocado

Segundo Calheiros, o ministro-chefe da Secretaria-Geral da Presidência, Onyx Lorenzoni, deve ser convocado a depor. "Não só porque mentiu, inverteu a questão e ameaçou uma testemunha muito importante".

No Brasil, se há uma coisa da qual a justiça não abre mão, é de ouvir e tomar medidas toda vez que alguém interfere na própria investigação, que foi o que aconteceu com o Onyx. Uma vez que se sabe que a CPI tem poderes constitucionais para investigar e apurar e tem poder de polícia. Vamos pedir medidas complementares se ele continuar fazendo o que já fez."
Renan Calheiros

Na semana passada, Lorenzoni protagonizou um pronunciamento em que disse que Bolsonaro determinara à Polícia Federal que investigue a declaração de Luís Miranda.

Flávio Bolsonaro

Renan lembrou, ainda, os depoimentos marcados para esta semana, do empresário Carlos Wizard, que faltou à oitiva no dia 17 de junho, e de Francisco Emerson Maximiano, sócio da Precisa Medicamentos, empresa envolvida no processo de aquisição do imunizante indiano. "[Wizard] terá que depor e fizemos uma recomendação ao [ministro do STF Luís Roberto] Barroso para que ele fique no Brasil até que durem os trabalhos da CPI", disse Renan.

"O Maximiano é dono da Global e de 13 outras empresas feitas para fazer negócios no Brasil, especialmente no enfrentamento da pandemia", disse o relator da CPI. "O senador Flávio Bolsonaro [Patriota-RJ] confirmou que teria ido ao BNDES acompanhar o proprietário da Global e da Precisa para obter financiamento e benefícios", disse Renan.

Segundo o juízo do parlamentar, ao fazer isso, o filho do presidente Bolsonaro "confessou um crime, o crime de advocacia administrativa, buscando benefícios empresariais que não são da competência de um senador".

Segundo ele, os senadores estão consultando juristas para ver como a CPI pode ouvir ou até mesmo investigar o presidente da República.

Queda na popularidade

O relator avaliou, ainda, que a CPI da Covid foi um fator que ajudou a derrubar a popularidade do presidente.

Nós teremos eleição no próximo ano, em outubro, sabemos que o governo passa por um período de muita dificuldade e está muito fragilizado. Apenas 23% de aprovação, o que significa uma queda muito grande."
Renan Calheiros

Segundo o parlamentar, o vice-presidente Hamilton Mourão (PRTB) é um general de direita e, por isso, se torna um entrave para um impedimento. A leitura que Calheiros faz sobre o atual momento da gestão federal é que ele está "fragilizado" e que há um "sepultamento" em curso do comando de Jair Bolsonaro.

Nós só não sabemos se esse velório será longo ou se esse velório acontecerá rapidamente com o processo de impedimento. O certo é que o sepultamento um dia acontecerá e esse velório será concluído, nós temos certeza que é muito difícil o defunto levantar do caixão. Nós temos um governo que terceirizou a economia, que agora pousa a um falso brilhantismo."
Renan Calheiros

Encaminhamentos da CPI

O vice-presidente da CPI da Covid, senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) apresentou hoje um requerimento para que as investigações do colegiado sejam prorrogadas por mais 90 dias. Para que o pedido seja aprovado, é necessário que 27 senadores assinem o documento.

O pedido já era esperado diante do entendimento dos integrantes da cúpula da CPI sobre a necessidade aprofundar as investigações, principalmente em relação às suspeitas sobre a compra da vacina indiana Covaxin.

Caso a CPI da Covid seja prorrogada no Senado, Renan disse esperar uma maior colaboração da PGR (Procuradoria-Geral da República).

A CPI já impactou muita coisa, o presidente se viu obrigado a ir para as ruas, enquanto a sua aprovação continua a cair. O povo se encorajou a ir para as ruas, fazer manifestação e, acho que já tivemos duas, a terceira será ainda maior. Já influenciamos na agilização do calendário da vacina, não como queríamos. E há uma mobilização nacional em função dos trabalhos da CPI, com aprovação maior de 60%, sobretudo nas redes socais. Eu acho e torço para que essa circunstância da PGR evolua na medida."
Renan Calheiros