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Ex-diretor da Saúde Roberto Dias paga fiança de R$ 1.100 e deixa prisão

Paulo Sampaio e Gilvan Marques

Do UOL, em Brasília e em São Paulo

07/07/2021 23h19Atualizada em 08/07/2021 00h06

Cerca de cinco horas depois de receber a ordem de prisão, efetuada pelo presidente da CPI da Covid, senador Omar Aziz (PSD-AM), o ex-diretor de Logística do Ministério da Saúde Roberto Ferreira Dias pagou a fiança de R$ 1.100 e foi liberado na noite de hoje. Ele deixou o local acompanhado de sua advogada, Maria Jamille José. Dias vai responder por perjúrio em liberdade.

Aziz mandou prender o ex-diretor sob a acusação de mentir à comissão. Dias foi o primeiro depoente a ser detido pela Comissão Parlamentar de Inquérito, após várias ameaças a convocados passados. Aziz já havia alertado o depoente sobre suas declarações à CPI.

Chame a polícia do Senado. O senhor está detido pela Presidência do Senado, pela Presidência da CPI."
Omar Aziz, presidente da CPI

"Estou tentando ajudá-lo, estou sendo sincero com você. Agora, chegar aqui e dizer que saiu [do Ministério da Saúde], não sabe por quê; que lhe tiraram poderes no seu departamento não sabe por quê; demitiram duas pessoas que trabalhavam diretamente com o senhor, o senhor não sabe por quê. [...] Nós queremos só a verdade!", disse Aziz mais cedo.

A decisão gerou bate-boca e nem todos os senadores, inclusive da oposição, concordaram com a prisão de Dias determinada por Aziz. Para eles, Dias é uma espécie de "peixe pequeno" no suposto esquema de corrupção na pasta da Saúde.

A advogada de Dias protestou contra a prisão, disse que o ato é uma ilegalidade e buscou argumentar que ele estava colaborando com a CPI desde de manhã.

A reportagem do UOL entrou em contato com a defesa do ex-diretor, e aguarda posicionamento.

Prisão ocorreu após divulgação de áudios

Áudios e mensagens encontrados no celular do cabo da Polícia Militar de MG e suposto representante da Davati Medical Supply Luiz Paulo Dominghetti Pereira desmentiram a versão dada hoje à CPI da Covid por Roberto Ferreira Dias. Segundo Dias, o encontro em que um pedido de propina teria ocorrido foi acidental. O celular de Dominghetti está em poder da comissão e foi periciado.

O conteúdo dos áudios foi revelado pela jornalista da CNN Brasil Daniela Lima enquanto ocorria a sessão da comissão no Senado. Momentos depois, as mensagens foram exibidas na CPI. O presidente da comissão, senador Omar Aziz (PSD-AM), já havia dado ordem de prisão a Dias, sob a acusação de ele mentir à comissão, e senadores tentavam fazê-lo mudar de ideia.

Encontro "incidental"

À CPI, o ex-diretor da Saúde havia dito que o encontro com Dominghetti ocorrera "incidentalmente" em um restaurante dentro de um shopping em Brasília. No entanto, um dos áudios, enviado por Dominghetti em 23 de fevereiro —portanto, dois dias antes do encontro— mostra que ele já mencionada a "reunião", que aconteceria em 25 de fevereiro, uma quinta-feira, a um interlocutor, chamado apenas de "Rafael".

Rafael, tudo bem? A compra vai acontecer, tá? Estamos na fase burocrática. Em off, pra você saber, quem vai assinar é o [Roberto] Dias mesmo, tá? Caiu no colo do Dias... e a gente já se falou. E quinta-feira [25 de fevereiro] a gente tem uma reunião para finalizar com o ministério.
Luiz Paulo Dominghetti Pereira, em áudio registrado no celular periciado pela CPI

Dominghetti havia relatado à Folha de S.Paulo um esquema de corrupção na compra de 400 milhões de doses de vacinas da AstraZeneca. Segundo o relato dele, Dias teria cobrado propina de US$ 1 por dose de vacina em 25 de fevereiro, um dia depois de o Brasil bater a marca de 250 mil óbitos pela covid-19.

Dias foi indicado ao cargo pelo líder do governo de Jair Bolsonaro (sem partido) na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR). Sua nomeação ocorreu em 8 de janeiro de 2019, na gestão do ex-ministro Luiz Henrique Mandetta (DEM). Após as denúncias, na semana passada, Dias foi exonerado do cargo no Ministério da Saúde.

Na CPI, além de reafirmar as denúncias feitas ao jornal, o PM e vendedor autônomo exibiu ainda um áudio sugerindo que o deputado Luis Miranda (DEM-DF), que diz ter alertado o presidente Bolsonaro sobre irregularidades na compra de outra vacina, a indiana Covaxin, também havia tentado adquirir vacinas com a Davati. No entanto, não é possível ter certeza sobre quais assuntos tratavam na ocasião.

Luis Miranda afirma que os diálogos do áudio são de outubro do ano passado e não se referem à negociação de vacinas, mas, sim, de luvas cirúrgicas. Ele, inclusive, registrou em um cartório de Brasília conversas mantidas por meio do aplicativo WhatsApp. O diálogo abordava, de acordo com o parlamentar, negociações para aquisição de luvas hospitalares com o objetivo de desmentir a versão dada por Dominghetti.

Resposta da empresa

O empresário Cristiano Alberto Carvalho, representante da Davati no Brasil, disse ao jornal O Globo que Dominghetti "quer aparecer" e que a mensagem trata "sobre os negócios dele [Luis Miranda] nos EUA". Disse, também, que o áudio citado durante o depoimento à CPI não tem nenhuma relação com a Davati.

Por meio de nota, a empresa informou não ser representante do laboratório britânico AstraZeneca. "[A empresa] jamais se apresentou ao governo federal ou a qualquer outro órgão como tal. Como esclarece o documento de oferta (Full Corporate Offer) feita ao Ministério da Saúde, a Davati Medical Supply não detinha a posse das vacinas, atuando na aproximação entre o governo federal e 'allocation holder' que possuía créditos vacinas do laboratório AstraZeneca".