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Luis Miranda sobre Bolsonaro, Pazuello e Elcio: 'Um dos três prevaricou'

Gabriel Toueg

Colaboração para o UOL, em São Paulo

20/07/2021 11h53Atualizada em 20/07/2021 13h29

O deputado federal Luis Miranda (DEM-DF) disse hoje ter certeza de que houve prevaricação no caso do processo irregular de compra da vacina indiana Covaxin pelo Ministério da Saúde. "Que houve [prevaricação] de alguém, a gente não tem dúvidas", disse o parlamentar, pivô do escândalo envolvendo o governo federal sobre o imunizante. Na opinião do deputado, "um dos três prevaricou, com certeza", em referência ao presidente da República, Jair Bolsonaro (sem partido); ao ex-ministro da Saúde Eduardo Pazuello; e ao ex-secretário executivo da pasta, coronel Elcio Franco.

Um dos três [Bolsonaro, Pazuello ou Elcio Franco] prevaricou, certeza.
Deputado federal Luis Miranda [DEM-DF]

"Depois que a CPI [da Covid] estoura o tema, manda-se investigar, manda-se suspender o contrato até que tudo fique devidamente comprovado, uma série de ações que poderia ter sido feita no momento em que a gente foi lá [apresentar a denúncia a Bolsonaro]", afirmou ele no UOL Entrevista, conduzido pela apresentadora Fabíola Cidral e com o colunista Tales Faria e o repórter Lucas Valença. "Alguém não agiu".

"O presidente [confirmou] o que falamos para ele, em entrevista. Ele disse que recebeu [os documentos], que passou para frente, ele valida que alguém então recebeu essa denúncia dele, que seria o Pazuello", disse Miranda. "Quando o Pazuello mandou o Elcio investigar, ele deveria ter verificado; se não fez, alguém prevaricou".

Miranda é irmão do servidor do Ministério da Saúde Luis Ricardo Miranda, cujo depoimento ao Ministério Público do DF (MP-DF) deu estofo à denúncia. No UOL Entrevista, ele disse que pediu à Polícia Federal para adiar o depoimento que estava marcado para hoje porque está fora de Brasília, acompanhando a filha em uma competição esportiva. Ele afirmou que a família "está acima de tudo, de qualquer pessoa", inclusive do presidente Bolsonaro. "Tendo condições legais e não afetando a investigação, vou priorizar minha família", disse.

Reunião com Bolsonaro

Durante a entrevista, o parlamentar deu detalhes sobre a reunião que ocorreu no Palácio da Alvorada, no dia 20 de março entre ele, o irmão e o presidente Bolsonaro. "A reunião durou uns 40 minutos, mais ou menos", disse. "Uns 20 [minutos] nesse assunto e outros vinte em outros temas".

"Eu acho até que o Bolsonaro não conhecia o caso [denunciado]", afirmou o parlamentar. "Quando meu irmão entregou o processo, ele [Bolsonaro] claramente não sabia do que a gente estava falando, estava perdido. Não sabia nem de qual vacina estávamos falando", relatou. "Talvez ele tenha dúvidas do que acontece no ministério, porque a reação dele foi: 'pô, esse cara novamente'. Será que ele já sabia de algo antes ou foi uma reação humana? Admito que fiquei com certa dúvida, mas não imputaria o presidente de que ele sabia de alguma coisa", revelou.

O "cara" citado por Bolsonaro, segundo a narrativa de Miranda, é o líder do governo na Câmara, o deputado Ricardo Barros (PP-PR). Miranda revelou o nome de Barros em seu depoimento à CPI da Covid, após ser pressionado por senadores.

"Meu irmão explicou a documentação, o pedido da Anvisa [Agência Nacional de Vigilância Sanitária] para liberar a importação [da Covaxin] no modelo emergencial, flexibilizando para esse momento que estamos vivendo. Pedir documentação da Anvisa é automático, então se alguém te pressiona antes, levamos ao presidente", disse Miranda.

Ele lembrou que ao longo da CPI da Covid o fato de que as doses da vacina indiana negociadas pelo Ministério da Saúde "não chegariam a tempo de ser aplicadas, por conta da validade de 6 meses". "As vacinas venceriam entre abril e maio, [...] receber o lote sem tempo hábil de aplicar na população", disse. Segundo ele, "o Brasil ficaria no prejuízo e a empresa diria que foi o Brasil que não aplicou a tempo".

Para Miranda, "se queriam tocar [a vacina] para frente, algo maior estava por trás". Ele diz que a denúncia não foi sobre "crime, mas sobre um modus operandi atípico".

Gravação existe?

Questionado sobre a existência de uma gravação da conversa que ele e o irmão tiveram com Bolsonaro, na qual levaram a denúncia de irregularidades na compra da Covaxin, Miranda disse nunca ter confirmado tal fato. "Eu não gravei o presidente", voltou a afirmar, como tem feito desde que o assunto veio à tona. "Eu nunca falei que [a gravação] existia, a imprensa deu a entender que poderia existir uma gravação".

Segundo o parlamentar, ao dizer que pode provar "que tudo foi dito e provado, todo mundo subentende" que a gravação existe. "[Isso] nunca saiu da minha boca", afirmou. "Tudo que falei foi comprovado. Mais uma vez, eu não gravei o presidente, não posso afirmar que tem [gravação]. Segundo meu irmão, ele não foi perguntado [pela PF, em depoimento, sobre a existência] da gravação."

Pressão para saída de Pazuello

Ainda durante a entrevista, Miranda comentou sobre um episódio em que teria estado com o ex-ministro Pazuello em um avião. Segundo o parlamentar, o ex-ministro teria dito que alguém o pressionava, dizendo que "ainda vou tirar você dessa cadeira". A história da aeronave foi revelada por ele em entrevista ao programa Roda Viva, da TV Cultura.

Miranda fugiu da pergunta sobre quem teria pressionado o então chefe da Saúde, dizendo que "isso pode ser [o desabafo de] um ministro magoado e chateado, porque estava sendo retirado, que havia deixado claro que achava que estava fazendo tudo certo".

"Você está pressionando a pessoa errada, tem pessoas para serem pressionadas, que estão envolvidas nisso de forma grave", disse Miranda no UOL Entrevista. "O Pazuello cita o nome de uma pessoa poderosíssima e a minha consciência me faz tomar isso com certa cautela, é só isso", se defendeu.

Segundo ele, o também ex-ministro Ernesto Araújo, do Itamaraty, estava no avião, além de uma equipe técnica dos dois ministérios. "O ministro Ernesto estava perto da gente", disse, embora tenha negado que a pressão para a saída de Pazuello tivesse vindo do ex-chanceler. "Pode ser ele desabafando sem ser fidedigno a quem falou, para mostrar que não é um ministro ruim, que na verdade foi tirado", sugeriu Miranda.

Segundo Miranda, o questionamento sobre o episódio deverá ser feito pelos senadores na CPI da Covid. "Se ele porventura mentir no depoimento, aí eu falo o nome para a própria CPI", afirmou. "Cabe a ele ser sincero com o público brasileiro e relatar se isso foi verdade ou não". Miranda disse não ver problema em fazer uma acareação com o ex-ministro.

Voto em Bolsonaro

Após a denúncia, Miranda diz que ele e o irmão foram atacados por membros do governo Bolsonaro. "Não votaria nele [nas eleições de 2022] por isso".

Segundo o parlamentar, a atitude do governo fez sua rotina mudar gravemente. "Meu irmão quer sair do país, foi ameaçado por alguns com envolvimento com milícia. Eu recebi várias ameaças, não sei se são fãs ou pessoas que querem te deixar com medo, ameaçam a mim e minha família. Acho que não tem volta. Tivemos a coragem lá atrás e quem quiser fazer maldade vai fazer de qualquer jeito".

O deputado também negou voto ao ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) nas eleições de 2022. "Não pode fugir da coerência, porque perde a essência que faz seus eleitores acreditarem em você".